Um início de ano diferente dos anteriores. Antes, as instituições de mercado elaboravam suas projeções na virada de ano, com uma perspectiva mais otimista, “para cima” e esperançosa sobre os rumos da economia no transcurso do ano. Agora tudo mudou. A cautela predomina, com as estimativas agora revisadas “para baixo”.
Isto pode ser visto pelas pesquisas Focus, sempre iniciando os anos no topo das projeções, com ajustes graduais para menos ao longo do ano. Em 2011, por exemplo, a Focus projetava um crescimento da economia em 4,5% em janeiro, mas acabou em 2,7%; no ano seguinte, era de 3,3% e acabou em 1% e no ano passado começou com 3,2% para terminar, pelas nossas projeções, em torno de 2,3%. Neste ano de 2014 estamos projetando um crescimento até menor do que em 2013 (próximo a 2,0%), uma inflação mais pressionada, taxa de câmbio mais depreciada e juro “esticado”. Não será um ano fácil. Teremos eleições majoritárias, Copa do Mundo aquecendo o comércio e os serviços, mas encarecendo-os também, além de menor número de dias úteis, impactando na produção. Teremos mais tensão política, pelas eleições e a ameaça de novas manifestações, e redução de compra de títulos pelo Fed, diminuindo a liquidez mundial e levando o dólar para cima.
Quando não faltava mais nada, na semana passada este cenário mais pessimista ganhou mais adesão, depois que as agências de rating e os bancos passaram a recomendar a redução de posição dos fundos e dos diversos investidores nos mercados emergentes, com destaque para o Brasil. Em grande parte, porque cresceu a descrença sobre a gestão fiscal do governo Dilma, teimando em adotar maquiagens contábeis, no intuito de “mascarar” uma política fiscal errática, ativa e inflacionária.
A última novidade foi o governo federal anunciar que conseguirá um resultado primário de R$ 75 bilhões em 2013, ou 1,5% do PIB, dados os ganhos extras de receita com o leilão de Libra (R$ 15 bilhões) e o parcelamento das dívidas tributárias (R$ 20 bilhões).
No entanto, este resultado será obtido apenas pela União, sendo que as outras esferas do governo, como os governos regionais, dificilmente conseguirão chegar à meta firmada para o total, R$ 111 bilhões (2,3% do PIB), já descontando os investimentos do PAC. Até novembro, conseguiram R$ 20,3 bilhões, longe, portanto, dos R$ 47,8 bilhões prometidos em meta para os governos estaduais e municipais.
Com isto, ao final de 2013 o saldo consolidado deve ter fechado em torno de R$ 100 bilhões, entre 1,9% e 2,0% do PIB, um pouco abaixo do patamar registrado em novembro (2,17% do PIB).
O problema é que boa parte deste resultado só foi possível pelas receitas extras citadas, mas também, porque o governo acabou jogando parte das despesas de 2013 para o ano seguinte, a exemplo do artifício contábil usado em 2012/13 com a balança comercial e as importações de petróleo (na ocasião chegaram a R$ 5 bilhões).
Agora, o chamado “Restos a Pagar” foi elevado a R$ 33,5 bilhões, despesas executadas, na sua maioria, mas ainda não pagas, só devendo acontecer nos primeiros meses de 2014, contabilizadas no Orçamento da União, a ser anunciado no final de janeiro, início de fevereiro.
Este “adiamento” de despesas para o ano fiscal seguinte representou uma alta considerável do que foi realizado em passado recente, algo normal, mas não no patamar de agora. Apenas para ilustração, em 2009 o “Restos a Pagar” foi a R$ 27,1 bilhões, em 2010 a R$ 22,9 bilhões, no ano seguinte a R$ 25,4 bilhões, em 2012 a R$ 24,1 bilhões e na passagem de 2012 a 2013 a R$ 26,3 bilhões, elevada em 27,4% agora em 2014.
O problema é que as agências de rating já observam preocupadas estas manipulações contábeis e, para alguns, já colocam o Brasil como “bola da vez” para uma possível perda da classificação atual. Somos investment grade, podemos perder um degrau, ainda mantidos neste patamar, mas perdendo fortemente a confiança dos players internacionais.
Da tríade das principais agências do mundo, Fitch, Moody´s e S&P, todas reclamam da má gestão fiscal, da “limitada flexibilidade fiscal”, do “fardo relativamente pesado dos juros”, da perspectiva de dívida bruta fechando 2014 a 61,9% do PIB, podendo chegar a 65%, tornando inevitável este rebaixamento, do crescimento pífio, dos desencontros do governo, etc. Em verdade, o que mais preocupa estas agências é o ”grau de solvência” do setor público. Se este piora, como vem piorando, a poupança da economia acaba minguando, impactando nos investimentos e na capacidade de crescimento e pagamento do país.
Enfim, poderíamos também ressaltar, dentre os fatos deste início de ano, a perda de força da produção industrial em novembro, recuando 0,2% contra outubro, o saldo comercial de US$ 2,5 bilhões obtido com as “exportações de papel” das plataformas da Petrobras, mas duramente impactadas pelas importações de petróleo no ano, o saldo cambial no ano negativo em US$ 12,7 bilhões, maior saída desde 2002 (ano de eleições presidenciais FHC X Lula e do receio do que o PT faria no poder), o IPCA fechando a 5,9%, dentre tantos outros dados inquietantes. Fiquemos, no entanto, com a piora fiscal e os alertas das várias agências de rating. O problema é que com esta se confirmando, nos aproximamos perigosamente da tese da “tempestade perfeita”, algo temido por todos neste difícil ano que se inicia.
Oxalá o governo consiga reverter esta onda de pessimismo reinante. Consiga, como dizem, “ancorar as expectativas” e melhorar o ânimo de todos, principalmente no nosso maltratado mercado de capitais. Não será uma tarefa fácil, dados os movimentos recentes, mas toda esperança é necessária neste momento…
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