O governo já reconhece internamente que não será possível cumprir a meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) de R$ 66,3 bilhões, ou 1,13% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país), fixada para o setor público em 2015. Diante do fraco desempenho da arrecadação e das dificuldades para aprovar no Congresso medidas capazes de reforçar os cofres públicos, a discussão agora é sobre qual o melhor momento para anunciar a redução do esforço fiscal, que, segundo técnicos, não chegará sequer a 0,9% do PIB.
— Pelos números que temos até agora, tudo indica que a meta ficará bem abaixo do percentual fixado hoje. Há uma dificuldade grande em obter receitas extraordinárias — diz fonte da equipe econômica.
Medo do custo político no Congresso
Segundo interlocutores, o secretário do Tesouro Nacional, Marcelo Barbosa Saintive, já teria manifestado a preocupação aos auxiliares e à cúpula da Fazenda e do Planejamento. Alguns integrantes do governo avaliam que a revisão da meta deveria ser feita já no próximo relatório bimestral de receitas e despesas, em nome da transparência nas contas públicas que o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tem defendido desde que assumiu a pasta. Como o resultado fiscal está muito baixo — em 12 meses encerrados em abril, o setor público consolidado apresentou um déficit de primário de R$ 42,6 bilhões, ou 0,76% do PIB —, manter a meta em 1,13% do PIB por muito mais tempo seria irrealista, avaliam os técnicos.
No entanto, há também um temor de que isso afete a imagem do governo com danos políticos que prejudiquem ainda mais a tramitação das medidas do ajuste fiscal no Congresso. Segundo integrantes da equipe econômica, há o risco de, ao reduzir o esforço fiscal, o governo passar a impressão aos parlamentares de que medidas como o fim das desoneração da folha de pagamento das empresas, por exemplo, não são tão essenciais. Por isso, dificilmente o governo vai admitir que já trabalha com uma meta menor do que 1,13% do PIB, enquanto não for concluída a votação do ajuste fiscal no Congresso.
Reservadamente, os técnicos avaliam que Levy não tinha a dimensão total dos problemas fiscais criados por seu antecessor, Guido Mantega, e pelo ex-secretário do Tesouro Arno Augustin, quando fixou a meta em R$ 66,3 bilhões ( 1,13 % do PIB), em dezembro do ano passado.
— Quando estipulou a meta, ele subestimou a realidade das contas públicas. Ele não sabia do tamanho do estrago — afirma um técnico.
A cada mês, os números deixam mais claro que o resultado está muito distante. A redução do esforço fiscal chegou a ser debatida na última reunião da junta orçamentária com a presidente Dilma Rousseff para se discutir o contingenciamento do Orçamento, mas o martelo não foi batido porque os ministros avaliaram que seria melhor aguardar o resultado da receita de maio. E dados preliminares da arrecadação do mês passado mostram que as receitas não reagiram.
Um levantamento feito pelo especialista em contas públicas Mansueto Almeida no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) mostram que a arrecadação bruta do governo central recuou levemente (- 0,38%) em maio. No entanto, essa queda esconde uma realidade ainda mais negativa.
Mansueto destacou que o governo teve, no mês passado, uma arrecadação adicional de R$ 2 bilhões com outorgas de concessões de telecomunicações e aeroportos, as chamadas receitas extraordinárias, ou seja, que não vão se repetir. Além disso, quando se observa o desempenho das receitas com contribuições, que são essenciais para o fechamento das contas, o recuo foi de 4,5%:
— O comportamento das receitas recorrentes está muito ruim. As contribuições são essenciais para o governo, pois representam 55% das receitas e não são partilhadas com estados e municípios. A meta está muito distante.
Sem contar com concessões
Os técnicos da área econômica lembram que o governo não poderá contar com receitas das concessões em 2015, diante do atraso no cronograma. Alguns leilões que vão render outorga (quatro aeroportos e trechos da ferrovia Norte-Sul), somente deverão ocorrer no próximo ano. Há alguma expectativa envolvendo a licitação de arrendamento de terminais portuários, mas sem projeção de arrecadação.
Enquanto isso, o governo corre para fechar o operação de abertura de capital da Caixa Seguros ainda este ano, o que pode gerar entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões em tributos e dividendos. Mas o processo está em fase inicial e depende do aval de vários órgãos, como Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e Susep. Também entram na projeção de receitas o leilão da 13ª rodada dos blocos de exploração de petróleo no segundo semestre, que pode render ao menos R$ 1,5 bilhão, e a privatização de um grupo de distribuidoras de energia elétrica, além do leilão da folha do funcionalismo.
Fonte: O Globo
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