O economista Julio Hegedus Netto avalia as consequências do déficit das contas externas brasileiras, um dos principais indicadores da saúde financeira de um país. Para ele, o déficit é mais um problema ocasionado por uma série de decisões erradas na condução da política econômica adotada pelo governo federal, a começar pelo abandono do chamado tripé macroeconômico — câmbio flutuante, metas de superávit primário e de inflação. “Tentou-se mostrar uma política alternativa, inventar a roda e deu no que deu”. Leia a entrevista.
Instituto Millenium: As contas externas brasileiras apresentaram um déficit de US$ 33,476 bilhões no período de janeiro a abril deste ano, segundo o Banco Central. Esse déficit está acima do valor esperado pelo mercado?
Julio Hegedus Netto: O déficit em conta corrente veio em US$ 8,3 bilhões em abril, em 12 meses a US$ 81,6 bilhões (2,6% do PIB), mostrando deterioração nas despesas com renda e serviços, aumentando as despesas líquidas com viagens internacionais em 19% contra o mesmo período do ano passado. As remessas de lucros também mostram deterioração, aumentando 27% em relação a abril de 2013. Um fator favorável foi a manutenção do ingresso líquido dos investimentos externos diretos em US$ 64 bilhões (12 meses), sinal das boas potencialidades do nosso mercado, apesar dos desvios da política econômica.
Imil: Qual é sua avaliação sobre a condução da política econômica?
Hegedus: Considero-a um fracasso, fruto dos desvios em torno do chamado tripé de política econômica, não mais sustentado pelo câmbio flutuante e monitorado, pelo gerenciamento fiscal restrito e pela manutenção do sistema de metas. O governo Dilma desrespeitou todas estas âncoras nominais e agora colhe os frutos das suas decisões erradas. O juro foi reduzido voluntariamente a 7,25%, a inflação flutua em torno do limite superior, o câmbio foi a R$ 2,45 (agora recuou a R$ 2,22, pela arbitragem de juro) e o saldo primário recuou a menos de 2% do PIB. Tentou-se mostrar uma política alternativa, inventar a roda e deu no que deu.
Imil: Quais são as consequências que esse déficit traz para a economia? O que deve ser feito para estancar o problema?
Hegedus: Este déficit externo reflete o excesso de consumo doméstico, a baixa poupança interna e a necessidade da externa para compensar esta deficiência. Como reflexo, temos a invasão de importados, nem sempre direcionados para investimentos e modernização da planta, o que é ruim para a economia. Como resultado, acaba ocorrendo um desbalanceamento entre oferta e demanda, e a ameaça inflacionária. Somado a isto, temos a desindustrialização e a perda de emprego. A solução seria a busca pela reconquista da credibilidade externa, através de políticas críveis como políticas monetárias e fiscais austeras e o respeito aos contratos, medidas que atrairiam os investidores etc.
Imil: O governo anunciou que para equilibrar as contas vai buscar receitas extraordinárias. A maior parte dessas receitas virá do novo Programa de Recuperação Fiscal (Refis). O que o senhor acha dessa medida?
Hegedus: São medidas oportunistas e temporárias. O governo precisa anunciar um ajuste fiscal permanente e de longo prazo, focado no corte de despesas de custeio, redução da máquina pública, melhoria da carga fiscal e, principalmente, na oferta de bens públicos.
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