A criação de um “imposto emergencial e temporário” começou a ser estudada para arrecadar recursos para a concessão de uma nova rodada do auxílio emergencial com o agravamento da pandemia. A ideia está em análise pelo governo e vem sendo discutida com parlamentares da base para dar fôlego ao pagamento do auxílio.
A expectativa é ter um esboço do modelo de uma nova rodada do auxílio na primeira semana após o carnaval e a ideia do “imposto emergencial e temporário” foi incluída na discussão, segundo apurou o jornal O Estado de S. Paulo, entre as diversas propostas, apesar de o presidente Jair Bolsonaro já ter se colocado contra a criação de um novo tributo e haver resistência no Congresso.
O grupo técnico que estuda a retomada do auxílio trabalha até mesmo com algumas alíquotas para a reedição de um imposto nos moldes da CPMF, sobre transações financeiras. Elas seriam entre 0,05% e 0,10%, podendo chegar a 0,15%.
Em tese, o novo imposto ficaria em vigor o tempo necessário para dar fôlego ao pagamento de uma nova rodada do auxílio emergencial. Mas esse discurso não é novo. O “P” da sigla CPMF, o imposto do cheque, era de provisória, embora tenha vigorado por dez anos, entre 1997 e 2007.
A proposta está em discussão porque o governo precisa aumentar a arrecadação para retomar o auxílio emergencial. É que a Lei de Responsabilidade Fiscal exige a necessidade de cumprimento da meta de resultado primário, definida pela diferença entre o que o governo arrecada com impostos e tributos e o que banca de despesas, sem contar o gasto com os juros da dívida.
Mesmo que as despesas para o pagamento do auxílio fiquem fora do limite do teto de gasto, a regra que proíbe que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação, o governo teria de arrumar a compensação em aumento de arrecadação ou corte de despesas. Outra saída seria mudar a meta fiscal, que prevê um rombo de R$ 247,1 bilhões.
Guedes quer ajuste para ter R$ 20 bilhões
O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse às lideranças do Congresso que vai precisar de uma nova versão de uma “Proposta de Emenda Constitucional (PEC) de guerra” para conceder mais três parcelas de R$ 200 do auxílio emergencial aos informais, com custo total de cerca R$ 20 bilhões – valor semelhante ao previsto para compra das vacinas contra a covid-19.
Na avaliação de Guedes e sua equipe, esse novo texto da PEC precisa conter uma cláusula de calamidade pública, para dar segurança jurídica à concessão do auxílio emergencial com a edição de um crédito extraordinário, e estar associado às medidas fiscais contidas na PEC do pacto federativo.
Uma minuta do texto está sendo preparada pela equipe econômica para ser apresentada aos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-PB). O diagnóstico apresentado pela equipe econômica é de que o auxílio emergencial é para o enfrentamento da covid-19 e o agravamento da pandemia pede um protocolo de crise com a cláusula de calamidade.
Como mostrou o jornal O Estado de S. Paulo, Pacheco e Lira, pressionados pelas suas bases de apoio, querem uma via expressa para a concessão do auxílio, com o argumento de que a urgência da pandemia não permite esperar a aprovação de medidas de contenção de gastos. Mas o ministro, nas conversas dos últimos dias, vem argumentando que é preciso acionar a cláusula de calamidade e garantir contrapartidas em nome da responsabilidade fiscal e controle das contas públicas. Para a equipe econômica, essas medidas devem ser consideradas o novo marco fiscal para o País.
Conselho Fiscal
Sem a cláusula de calamidade, o risco apontado é de crime de responsabilidade fiscal. É ela que vai permitir que os gastos com o pagamento dos três meses do auxílio fiquem de fora do limite do teto de gastos (a regra que impede o crescimento das despesas acima da inflação), afastando também a necessidade de compensação para o cumprimento da meta fiscal.
Apesar da pressão dos presidentes do Senado e da Câmara, o sentimento na equipe econômica é de que as conversas estão avançando num tom muito positivo e que, após o acordo, a votação poderá ser rápida.
A ideia é que seja criado um Conselho Fiscal da República, com representantes dos três Poderes, incluindo do Tribunal de Contas da União. A cada três meses, o colegiado se reuniria num ritual parecido com o do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, responsável pela definição da taxa básica de juros.
Além de prever o acionamento dos chamados gatilhos (medidas corretivas para diminuir os gastos), a PEC prevê uma cláusula vinculante para que as mesmas práticas cobradas pelo TCU sejam praticadas pelos Tribunais de Contas estaduais e municipais.
“Se fizer mais um pacote fiscal sem nenhuma contraparte, a mensagem que será passada é que a trajetória da dívida vai continuar a subir e o prêmio de risco que os investidores vão pedir para manter a dívida brasileira pode ter um efeito, uma implicação de qual tipo de política que o Banco Central pode adotar”, avisou na terça-feira, 9, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, em videoconferência direcionada a investidores internacionais.
Antes da negociação da nova retomada do auxílio, a estratégia inicial do governo era conceder, após a pandemia, o Bolsa Família e também criar o chamado Bônus de Inclusão Produtiva (BIP), que nada mais é do que o nome fantasia dado pelo ministro Paulo Guedes para o chamado imposto de renda negativo, instrumento de transferência de renda para quem está trabalhando na informalidade e ganha menos do que um salário mínimo. O BIP seria destinado aos trabalhadores “invisíveis” e estaria associado à nova Carteira Verde Amarela, com menos encargos para a contratação.
Fonte: “Exame”, 10/02/2021
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil