O governo do presidente interino, Michel Temer, quer incentivar os estados a promoverem parcerias com o setor privado para ampliar as redes de tratamento e coleta de esgoto. O secretário executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) da Presidência, Moreira Franco, afirmou ontem que o setor de saneamento básico faz parte do programa de concessões e que o BNDES vai promover uma série de encontros com os governos estaduais para definir quais serão as melhores alternativas para a concessão do serviço ao setor privado.
Moreira informou que, amanhã, participará de reunião com a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques, o governador licenciado do Rio, Luiz Fernando Pezão, e o governador em exercício, Francisco Dornelles, para tratar da Cedae.
— O BNDES está se organizando para fazer road shows nos estados. (…) Há alguns anos se estimulou a criação de empresas estaduais, que praticamente assumiram a prestação dos serviços, que são de responsabilidade dos municípios. Isso significa que o caminho (para o saneamento) passa por uma conversa com estados para definir a modelagem (das parcerias com o setor privado) — disse ele, durante coletiva de imprensa no Rio Media Center para apresentar as propostas do governo Temer para atrair investidores para a área de infraestrutura.
Moreira reconheceu que o fornecimento de esgoto tratado é muito precário no país e afirmou que vários estados já manifestaram ao BNDES o interesse em promover concessões nesse setor.
“Setor público não dá conta”, diz especialista
Números do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento Básico (SNIS), do Ministério das Cidades, mostram que o fornecimento de água chegava a 83,03% do país em 2014, último dado disponível, enquanto a coleta de esgoto está em apenas metade (49,84%) dos municípios atendidos com água. A situação do tratamento de esgoto é ainda pior: em apenas 40,78% do país.
O estado do Rio de Janeiro detém taxas melhores que a média nacional, tanto no atendimento de água quanto na coleta de esgoto, mas fica atrás quando se considera o tratamento. O fornecimento de água está presente em 89,3% do estado, enquanto 64,21% têm coleta de esgoto. O índice de tratamento de esgoto, no entanto, é de apenas 34,66%.
Presidente-executivo do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos ressalta que os avanços nos serviços de saneamento básico nos últimos anos se concentraram no fornecimento de água, enquanto a coleta e o tratamento de água não foram tão beneficiados.
— As empresas não acompanharam os investimentos feitos no fornecimento de água na coleta e tratamento de esgoto. Menos da metade da população tem acesso à coleta de esgoto. E, do esgoto geral do país, só 40% são tratados. Muitas cidades ampliaram a coleta do esgoto, mas só afastam das casas e colocam no rio ou no mar — afirmou Carlos.
Ele cita números do Plano Nacional de Saneamento Básico, de 2013, que estimava que seriam necessários R$ 304 bilhões em recursos para universalizar o fornecimento de água e esgoto no país. Para universalizar água, esgoto, lixo e drenagem, o investimento necessário seria de R$ 508 bilhões:
— Governo federal, estados e municípios não têm esses recursos. O setor público sozinho não vai dar conta desses investimentos. Ou vai fazer isso só em 50 anos, em um prazo muito maior do que é necessário.
Diante desse cenário, Édison Carlos diz ver “com bons olhos” a intenção do governo em avançar no debate sobre a privatização dos serviços de saneamento básico. Na sua avaliação, o melhor caminho é o das parcerias entre as empresas públicas e privadas, unindo conhecimento do sistema de saneamento do setor público e tecnologia e boas práticas de gestão do setor privado.
— A questão não é se o serviço é público ou privado. Mas, em geral, o setor privado cumpre as metas mais rapidamente. Quando uma empresa privada assume, por exemplo, rapidamente ataca as perdas de água. No Brasil, há uma perda de 36,7% da água potável dos sistemas de distribuição — explicou o presidente executivo do Trata Brasil, destacando a importância da fiscalização das empresas.
Ontem, Moreira citou ainda a experiência de Niterói como exemplo de sucesso da atuação da iniciativa privada na prestação do serviço de saneamento. Desde 1999, o fornecimento de água e a coleta e o tratamento de esgoto são operados pela concessionária Águas de Niterói.
— Tem várias experiências, algumas extremamente bem-sucedidas, como o caso de Niterói, que tem hoje praticamente 100% de fornecimento de água e esgoto tratado.
Outro aspecto que vem sendo discutido no âmbito do saneamento básico é a exigência do acompanhamento da concessão por uma agência reguladora, o que, segundo Moreira, tem criado dificuldades:
— O Ministério das Cidades está estudando qual o melhor caminho para enfrentar a falta de clareza quanto à autoridade regulatória no setor.
Sem leilão de pré-sal no 1º semestre de 2017
Moreira adiantou, ainda, mudanças que serão adotadas nos próximos leilões de concessão em infraestrutura. Segundo o ministro, haverá um alongamento de prazos entre o anúncio e a realização dos certames. E, no caso do setor de petróleo e gás, esse período será de pelo menos um ano. Isso se explica, diz ele, pela complexidade da área, que exige estudos mais detalhados para a avaliação das empresas. Com isso, os leilões das áreas de petróleo no pré-sal, que eram esperados para o primeiro semestre de 2017, devem ficar para a segunda metade do próximo ano:
— Cronograma não dá (para ter). (…) A perspectiva, como eu disse, é de prazo para o setor de óleo e gás, pela complexidade, de pelo menos um ano para que se faça o leilão a partir do anúncio. Pode-se ter esse leilão em meados do ano que vem.
Nos demais setores, o prazo mínimo para a avaliação dos projetos pelas empresas será de 100 dias, segundo Moreira. Hoje, é de 45 dias. Além do prazo mais longo, outra mudança é a publicação dos editais também em inglês.
Um dia após o BNDES ter divulgado prejuízo de R$ 2,2 bilhões no primeiro semestre — o primeiro resultado negativo desde 2003 — Moreira Franco fez críticas aos critérios usados até então pelo banco para liberar recursos:
— Já tomamos as providências para que o sistema de financiamento dos projetos não se dê da mesma maneira, que não se substitua a aritmética pela ideologia. O que gerou toda essa dificuldade do BNDES foi a necessidade do banco de usar de maneira abundante o crédito subsidiado, esse subsídio, essa diferença era coberta pelo Tesouro, essas empresas entraram na operação Lava-Jato, e gerou toda essa dificuldade que o banco vive.
Fonte: “O Globo”.
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