Michel Temer não é o presidente ideal de ninguém -nem da oposição a Dilma nem dos 54 milhões de eleitores que efetivamente votaram nele para vice -, mas tem se saído melhor do que o esperado. Os primeiros dias da nova gestão mostram o que se pode esperar de um governo interino que assume o comando do Brasil na pior recessão de nossa história.
As críticas até agora, por outro lado, dão a medida do descolamento do petismo em relação ao mundo real. Ao invés de atentar para o evidente fisiologismo de muitas das escolhas, critica a falta de mulheres no ministério e a fusão da Cultura com o Ministério da Educação -perfumarias simbólicas que constituem o campo de luta preferencial do PT e de seus defensores: o investimento no símbolo, na aparência, como substituto da realidade.
Os 11 milhões de desempregados (homens e mulheres) importam menos que a composição sexual dos ministérios. O resultado disso é que, na nomeação de Maria Silvia Bastos Marques para a presidência do BNDES, ressalta-se mais o seu gênero do que seu currículo invejável na gestão privada e pública.
O grande mérito do governo Temer será no campo econômico, para o qual selecionou referências da área. Com Henrique Meirelles (ministro da Fazenda), Mansueto de Almeida (secretário de Acompanhamento Econômico) e Ilan Goldfajn (presidente do Banco Central), teremos uma equipe disposta e capaz de recolocar o Brasil nos trilhos da responsabilidade fiscal e monetária.
Até a própria Dilma reconheceu, a contragosto, que o Brasil precisa urgentemente de um ajuste para corrigir os erros dos anos anteriores. Um ajuste fiscal baseado em cortes de gastos e aumento da eficiência do Estado (embora dificilmente escapemos da CPMF), mais alguma privatização de relevo, são caminhos realistas.
Com a recuperação da confiança de investidores, o reequilíbrio macroeconômico e a diminuição de nossa dívida, poderemos finalmente retomar a trajetória de queda dos juros.
Os grandes gargalos do Brasil, no entanto, seguirão intocados: nossos impostos descomunais, tanto no peso quanto na complexidade; nossa lei trabalhista arcaica, que produz 10% de desemprego e, entre os empregados, 40% de informalidade; gastos estatais que, por lei, não param de crescer; a imensa dificuldade de se empreender no Brasil; os privilégios do funcionalismo público; o saneamento básico sofrível; e, é claro, a educação básica deplorável.
Esses são os desafios que o Brasil como nação precisa enfrentar. É difícil prever como um governo que já nasce desgastado com a opinião pública e refém de alianças partidárias do Congresso dará conta de missões desse porte. A “ponte para o futuro” nos reconecta aos avanços que foram abandonados pelo governo petista, mas não será capaz de nos levar para além deles.
Há também toda uma agenda de reforma política que se tornou urgente desde os protestos de junho de 2013. A população está alienada de seus representantes e assiste ao jogo político com um misto de indignação e incredulidade.
O PMDB de Temer é, contudo, constitutivamente incapaz de levar adiante qualquer abertura da política à população, justamente por ser o principal beneficiado e causador do fisiologismo estrutural.
Temer não é a primeira opção de ninguém, mas é o que tem para hoje. Dá motivos para um otimismo moderado. Se bem-sucedido, devolverá ao Brasil a capacidade de escolher seu caminho.
O gigante era gordo demais e, na hora de levantar, rompeu o ligamento do joelho. Temer o coloca na fisioterapia. Dar o primeiro passo à frente em muitos anos e escolher a rota da nova caminhada serão decisões para as urnas em 2018.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 20 de maio de 2016.
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