As últimas rodadas de pesquisas trouxeram uma mudança importante no cenário eleitoral. Até a semana passada, Jair Bolsonaro era o favorito. Agora, é Fernando Haddad.
O Ibope divulgado ontem confirma o acerto da estratégia do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva: adiar até o limite o lançamento da candidatura Haddad, para forçar, no segundo turno, um confronto com Jair Bolsonaro, o candidato mais fácil de derrotar (expliquei isso neste post).
Ainda resta pouco menos de duas semanas para o voto útil daqueles que rejeitam tanto Bolsonaro quanto Haddad se concentrar num terceiro nome. Mas a fragmentação desse campo sugere que o tempo será curto demais, como desenhado na estratégia de Lula.
No segundo turno mais provável, Bolsonaro enfrentará Haddad, rompendo a polarização entre PT e PSDB das últimas sete eleições presidenciais. Embora a segunda rodada seja uma outra eleição, em que os dois terão tempo igual de rádio e TV, Haddad larga na frente – de novo, como desenhado na estratégia de Lula.
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Os números do Ibope permitem entender que o sucesso dessa estratégia está relacionado aos eleitorados cativos do PT. Haddad subiu em todos eles: no Nordeste, entre os mais pobres, entre os que tem menor grau de instrução. Também registrou alta entre as mulheres. Em paralelo, a rejeição a Bolsonaro cresceu em todas essas camadas.
No Nordeste, Haddad tinha 13% no dia do registro oficial de sua candidatura, 11 de setembro. Na rodada divulgada ontem, subiu de 31% a 34%. Com 17%, Bolsonaro está em terceiro, atrás de Ciro Gomes.
Entre os eleitores que ganham até 1 salário mínimo, ele tinha 10% em 11 de setembro – e estava em quinto lugar. Na rodada de ontem, registrou uma alta de 27% para 30% e lidera com folga, apesar da subida de Bolsonaro, de 12% para 16%. Na faixa de 1 a 2 salários mínimos, também estava em quinto, com 8%. Foi ontem de 17% a 21%, enquanto Bolsonaro se manteve estacionado em 26%. Mesmo nas faixas de renda mais alta, Haddad subiu, enquanto Bolsonaro se manteve estagnado.
O roteiro se repete quando os números são analisados por grau de instrução. Entre os eleitores que têm até a 4ª série do ensino fundamental, Haddad estava em quinto, com 6%, no dia 11. Subiu quatro pontos, de 24% para 28%. Bolsonaro parou em 19%. Naqueles que estudaram até a 8ª série, foi de 23% para 26%. Bolsonaro parou em 20%.
Bolsonaro ainda lidera as faixas de nível médio e superior, mas caiu três pontos nesta última (de 36% para 33%), enquanto Haddad subiu três (de 13% para 16%), e se consolidou em segundo lugar. Entre as mulheres, Haddad está empatado com Bolsonaro, com 21%.
O maior desafio para Bolsonaro no segundo turno será enfrentar a alta na rejeição. Desde o registro da candidatura Haddad, ela foi 41% para 46%. Cresceu de 41% para 47% na camada que tem até ensino médio, simpática ao capitão da reserva. Na que ganha até um salário mínimo, saltou de 46% para 57%. No Nordeste, de 54% para 60%.
A rejeição a Bolsonaro atinge 48% entre eleitores que estudaram da 4ª à 8ª série do fundamental. Só na última rodada do Ibope, foi de 36% para 47% no eleitorado de nível superior, em que ele reúne o maior apoio.
O crescimento da rejeição a Bolsonaro dá uma vantagem gigantesca a Haddad. Segundo o Ibope, ele derrotaria Bolsonaro por uma vantagem de 6 pontos percentuais no segundo turno (ou 7,5 pontos, contando apenas os votos válidos).
O favoritismo de Haddad pode ser ameaçado por dois movimentos. O primeiro seria uma súbita alta num terceiro nome, que tivesse mais chance de derrotar o PT. Diante da ascensão de Haddad, parte do eleitorado antipetista que se concentra hoje em torno de Bolsonaro poderia optar por Geraldo Alckmin ou Ciro Gomes.
A esta altura, porém, é pouco provável que isso ocorra na proporção necessária para tirar Bolsonaro do segundo turno – embora ainda seja possível que sirva para deixá-lo em segundo lugar no primeiro.
O segundo movimento seria uma inversão nos patamares de rejeição a Bolsonaro, sobretudo nos eleitorados cativos do PT: Nordeste, mais pobres e menos instruídos. Para isso, ele terá mais tempo de campanha. Uma vez confirmado no segundo turno, terá o horário eleitoral gratuito para explorar o antipetismo. Se conseguir, poderá vencer. Hoje, porém, os ventos sopram a favor de Haddad.
Fonte: “G1”, 25/09/2018