“O Brasil é um país que gasta muito e mal”. Esse foi o retrato feito pelo relatório “Um ajuste justo – Análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”, encomendado pelo governo federal ao Banco Mundial. O documento traz uma série de propostas para melhorar a situação fiscal do país, com sugestões que vão desde a reforma da Previdência e a revisão dos salários dos servidores até o fim do ensino superior gratuito. Para o professor de economia e especialista do Instituto Millenium, Vítor Wilher, muitas das questões apresentadas já são defendidas por economistas e serão cruciais para nortear o debate no próximo ano. Ouça!
No relatório, estão propostas para o setor privado, como a Reforma do Simples e a eliminação da desoneração da folha; para a educação, como o fim da ineficiência do ensino; para o mercado de trabalho, como uma reformulação do Abono Salarial e do Salário Família; e para a saúde, como mais capacitação dos profissionais e remoção dos subsídios tributários federais para seguros privados de saúde. Confira abaixo outros pontos destacados pelo levantamento:
Alto volume de gasto público, mas dificuldade em diminuir a desigualdade social
Wilher explica que o Estado brasileiro tem uma carga tributária entre 33% e 36% do PIB, a mais alta dos países emergentes. No entanto, apesar da grande arrecadação, esse valor é pouco distribuído entre bens e serviços públicos, como saúde e educação básica, que poderiam afetar a desigualdade de oportunidades.
“O Estado brasileiro foi capturado por algumas elites, que acessam o ensino superior gratuito, grandes empresários que são beneficiados com crédito subsidiado, via bancos públicos, e pelos próprios servidores, que possuem um prêmio salarial muito maior que o privado. Esse Brasil capturado por grupos de interesse não dá conta de reduzir a desigualdade, o que ele faz é perpetuar a discrepância entre quem nasce rico e quem nasce pobre”, comenta.
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Reforma da previdência e revisão da massa salarial dos servidores públicos
Para Wilher, a reforma da Previdência não é mais uma escolha, mas uma necessidade. Segundo o especialista, atualmente, o Brasil gasta em torno de 56% do orçamento com questões previdenciárias, sendo que esse valor cresce em torno de 6% ao ano acima da inflação. As projeções são que, daqui a dez anos, o país gastará mais de 80% com o sistema previdenciário. Isso resultaria em falta de verba para outras questões, como investimentos e políticas públicas.
“Hoje, precisamos aprovar uma reforma da Previdência que consiga, pelo menos, igualar o que é pago aos trabalhadores da iniciativa privada e servidores públicos. A diferença salarial entre essas duas classes também é um ponto importante. Além de gerar desigualdade de renda, ela também torna a economia menos produtiva, já que esse bônus atrai muitos talentos que poderiam estar em empresas que geram inovação, mas que fazem parte da burocracia estatal”, acrescenta.
Alterações no sistema tributário
Segundo o professor de economia, o sistema tributário deve ser revisto, mas sem considerar o aumento de impostos. “O relatório diz em transferir o tributo do consumo, que afeta diretamente os mais pobres, e passar a tributar mais a renda e o lucro, tornando-o mais eficiente”.
Fusão de programas sociais
Outra questão apresentada pelo relatório do Banco Mundial é a fusão de programas sociais. Na opinião de Wilher, “projetos muito descentralizados ficam sujeito a falhas. Dessa forma, com a unificação, é possível ter maior cuidado de gestão sobre eles. Isso já foi feito no passado, com a criação do Bolsa Família”.
Além de reformas no FGTS e no Seguro-Desemprego, o levantamento também propõe a união da aposentadoria rural, do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e do Salário-Família com o Bolsa Família.
É possível melhorar a situação fiscal com a rigidez do orçamento?
Segundo o professor de economia, “hoje, mais de 90% do orçamento brasileiro é engessado. Na próxima gestão, temos que focar nessa flexibilização. Do jeito que está, o governo não vai conseguir fazer política pública fiscal, porque já está tudo carimbado pela constituição e isso depende de mudanças via PEC”.
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