Dilma não completou um ano de governo, mas o clima é de fim de festa. Escrevo este artigo antes das manifestações marcadas para este domingo, dia 16 de agosto. Espero que tenham sido pacíficas, e não contaminadas por grupos ideológicos interessados em aprisionar os sentimentos da sociedade e inibir protestos democráticos legítimos. O que quer que tenha acontecido, caro leitor, ninguém conseguirá silenciar o grito de indignação do brasileiro honrado e trabalhador, mas profundamente revoltado com a gangue mafiosa que tomou conta do Estado brasileiro. Dilma Rousseff está agonizando, isolada no seu desligamento da realidade, na sua penosa arrogância, no desgoverno provocado por sua incompetência. Acuada pelos resultados evidentes do maior estelionato eleitoral da nossa história, desmentida pela força dos fatos e dos números, a presidente da República só tem uma saída digna: a renúncia.
Dilma Rousseff, não nos iludamos, é uma peça pequena, quase inexpressiva, de uma engrenagem perversa de perpetuação do poder montada pelo ex-presidente Lula e pelo PT. A máquina lulopetista começa a ranger graças ao excelente trabalho técnico de um jovem magistrado, ao respaldo investigativo da imprensa e ao maciço apoio da sociedade brasileira. Dilma desceu ao fundo do poço. E Lula, o criador, escorrega com ela. O ex-presidente, astuto e rápido no jogo, tenta uma nova metamorfose. Armado de um cinismo que se aproxima do ridículo, Lula ensaia críticas ao seu partido e tenta assumir a posição de uma vestal. Não cola. Todos, até mesmo os mais ingênuos, sabem que Lula está no topo da pirâmide. É o chefe.
O ex-presidente está tenso. Assombra-o, sobretudo, o avanço das delações premiadas. Só isso explica sua patética participação no último programa político do PT levado ao ar em cadeia nacional de televisão. Lula está desestabilizado por uma razão muito simples: a mentira se escancarou, a punição se aproxima, a estrela petista se apagou.
Vivemos um momento difícil e perigoso. Os assaltantes do dinheiro público e os estrategistas do projeto de perpetuação no poder, fortemente atingidos pela solidez das nossas instituições democráticas, não soltarão o osso com facilidade. Farão qualquer coisa para não perder a boquinha. O clima não está legal. O país está radicalizado graças à luta de classes tupiniquim do “nós contra eles”. Há riscos no horizonte. Mas precisamos acreditar no Brasil e na capacidade de recuperação da nossa democracia. A sociedade amadureceu. O exercício da cidadania rompeu as amarras dos marqueteiros da mentira. E a imprensa, o velho e bom jornalismo, está mostrando sua relevância para a sobrevivência da democracia e das liberdades.
[su_quote]Chegou a hora da verdade para governantes e políticos. Os culpados pela esbórnia com o dinheiro público devem ser exemplarmente punidos[/su_quote]
A relação de Lula e do PT com a democracia é muito estranha. Nada como o recurso a um banco de dados para revisitar pensamentos reveladores. Em entrevista à “Folha de S.Paulo” em 2009, o ex-presidente afirmou que o papel da imprensa não é o de fiscalizar, e, sim, o de informar. “Não acho que o papel da imprensa é fiscalizar. É informar. Para ser fiscal tem o Tribunal de Contas da União, a Corregedoria-Geral da República, tem um monte de coisas. A imprensa tem de ser o grande órgão informador da opinião pública.” Lula questionava um dos pilares da democracia: o papel fiscalizador da imprensa. Tinha seus motivos, sem dúvida. Suas declarações encerravam uma contradição com seu suposto e alardeado respeito à liberdade de imprensa. Fiscalizar faz parte integrante do processo informativo. E como Lula não é tonto, o falso disjuntivo (informação versus fiscalização) tinha uma finalidade precisa: limitar o papel fiscalizador dos jornais e desacreditá-lo. Não conseguiu. Felizmente.
Os bons ventos da economia mundial nos mandatos de Lula e seu carisma e talento de encantador de serpentes garantiram-lhe um céu de brigadeiro. Mas seu desejo de perpetuação no poder, direto ou por delegação temporária, não combinava com escrúpulos éticos. Os bons indicadores da economia, então, não impediram o Brasil de trombar com as consequências funestas de um populismo personalista.
Afinal, qual é a perversidade que deve ser creditada na conta desta imprensa tão questionada por Lula? A denúncia de recorrentes atos de corrupção que nasceram como cogumelos à sombra da cumplicidade do ex-presidente? Ou será que a irritação de Lula é provocada pelo desnudamento de seu papel na crise que assola o Brasil? A sustentação do governo de coalizão, aético e sem limites, deu no que deu.
Chegou a hora da verdade para governantes e políticos. A sociedade está cansada da empulhação. Os culpados pela esbórnia com o dinheiro público, independentemente da posição que ocupem na cadeia corruptora, devem ser exemplarmente punidos. E isso não significa, nem de longe, ruptura do processo democrático, golpismo ou incitamento à radicalização.
Lula e Dilma são responsáveis pelo descalabro da Petrobras. Diante das surpreendentes proporções do esquema de corrupção armado dentro da maior estatal brasileira com o objetivo de carrear recursos para o PT e seus aliados, não surpreende que os dois presidentes da República no poder durante o período em que toda essa lambança foi praticada soubessem perfeitamente do que estava acontecendo.
Dilma Rousseff foi reeleita legitimamente presidente da República. Isso não significa, por óbvio, admitir barreiras protetoras absurdas ou chancelas de impunidade. Todos, incluídos a atual presidente e seu antecessor, podem e devem ser responsabilizados e punidos por seus atos.
Assistimos ao ocaso de um modelo político corrupto, autoritário e hegemônico e ao novo momento, menos ingênuo e mais amadurecido, da nossa jovem democracia. Chegou a hora do Brasil.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 17/8/2015
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