A crise da Petrobras, a crise do setor elétrico e a queda do barril de petróleo no mercado internacional abrem uma grande oportunidade para o crescimento da participação do gás natural na matriz energética brasileira. Para sair da sua atual situação de desequilíbrio do caixa devido à elevada dívida contraída nos últimos quatro anos, a Petrobras terá que, obrigatoriamente, acelerar o seu plano de desinvestimentos e rever para baixo os investimentos para os próximos anos. Nem mesmo os atuais altos preços da gasolina e do diesel serão capazes de equilibrar as contas da estatal.
No tocante ao plano de desinvestimentos, a empresa deveria vender integralmente suas participações nas concessionarias estaduais de distribuição de gás natural. Não faz sentido algum uma empresa do porte da Petrobras atuar num segmento regulado e com margens baixas. Isso acaba gerando conflitos, principalmente regulatórios, através da atuação verticalizada da empresa no setor, sem falar que esse modelo não tem alcançado o objetivo de promover um crescimento na malha de distribuição nos estados.
[su_quote]A crise do setor elétrico poderá levar o governo a mudar a regulação, permitindo participação de térmicas a gás natural na base do sistema elétrico[/su_quote]
A Petrobras também deveria vender e/ou estabelecer parcerias na rede de gasodutos de escoamento da produção, transporte, unidades de processamento de gás natural e plantas de regaseificação. Sem falar de campos que hoje produzem petróleo e gás associado, que também poderão ser negociados pela estatal. Esses desinvestimentos trariam enormes vantagens. As principais seriam recursos financeiros, que neste momento a empresa precisa mais do que nunca, aumento da eficiência na operação desses ativos, incentivo à entrada de novos ofertantes e uma certa blindagem contra interferências políticas que tanto a maltrataram nesses últimos anos.
A crise do setor elétrico poderá levar o governo a mudar a regulação, permitindo participação de térmicas a gás natural na base do sistema elétrico. Isso aumentaria a oferta de energia elétrica e, ao mesmo tempo, levaria a uma menor dependência das hidrelétricas e, consequentemente da água. É bom não esquecer que, a partir do momento que o governo passou a autorizar somente hidrelétricas a fio de água, essas usinas perderam sua capacidade de regular o abastecimento por períodos mais longos, e só usinas térmicas podem voltar a fornecer essa garantia. Nesse caso, as usinas a gás seriam a melhor opção, principalmente pelo aspecto ambiental, em que superam as de óleo e carvão, e as nucleares, outra boa escolha, que, por enquanto, não fazem parte do planejamento de governo. Outra vantagem da mudança de regulação é que as empresas geradoras de eletricidade poderiam firmar contratos mais longos com os fornecedores de gás, o que o tornaria mais barato. Alem do incentivo à construção de novas térmicas, passa a existir uma oportunidade imperdível para aumentar o uso da cogeração a gás natural, através da geração distribuída, que é uma forma mais moderna e mais eficiente que as térmicas tradicionais.
Por fim, com a queda do preço do barril, o gás também terá seu preço reduzido. Esse gás mais barato no mercado internacional poderá viabilizar a sua importação e a construção de terminais de regaseificação para atender novas térmicas e ampliar a oferta para o mercado das distribuidoras de gás. A chance de modernizar o setor de energia, aumentando a participação do gás natural na matriz elétrica, residências, comércio, serviços, transporte e indústria está na mesa. Cabe ao governo saber aproveitar essa oportunidade proporcionada por mudanças no mercado interno e no internacional.
Fonte: O Globo, 27/1/2015
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