O CEO do Brazil Summit, Michael Reid, acredita que houve uma negação da gravidade da crise brasileira. Atualmente, diz ele, embora as crises política e econômica sejam graves, o mundo confia que o País pode dar um passo adiante. “Acho que os estrangeiros que conhecem e olham o Brasil estão cientes de que as instituições democráticas estão funcionando e têm a esperança de que o País possa sair mais forte dessas dificuldades lá na frente”, afirma Reid, também editor sênior da “The Economist” para a América Latina.
O Brazil Summit é realizado pela “The Economist” e tem o Estado como parceiro. O evento ocorre na terça-feira no Grand Hyatt, em São Paulo. A seguir, trechos da entrevista.
O Brasil enfrenta uma combinação de crise econômica e política. Qual é a imagem internacional do País nesse momento?
A imagem internacional é a de um país que tem problemas. E são problemas complexos pela coincidência de tempo do ajuste econômico e da recessão. Há um processo político caracterizado por um governo extremamente fraco e impopular, além da questão da Operação Lava Jato e todas as suas consequências no sistema político. Dito tudo isso, acho que os estrangeiros que conhecem e olham o Brasil estão cientes de que as instituições democráticas estão funcionando e têm a esperança de que o País possa sair mais forte dessas dificuldades lá na frente.
O sr. falou sobre um governo fraco e impopular. O sr. acredita que ele consegue se manter?
A situação é tão complexa que ninguém sabe. Eu diria duas coisas. A primeira é que é crucial para o Brasil que qualquer tentativa de impedimento da presidente seja dentro do caminho jurídico. Se isso não ocorrer, vai provocar um dano no tecido político do País e criar muito conflito. O segundo ponto é a necessidade de o governo fazer um ajuste fiscal crível. Se isso não ocorrer, a recessão, a queda do emprego e a inflação vão ser mais fortes. E o Brasil vai pagar um custo socioeconômico forte.
Por quê?
Se o setor público não faz o ajuste, o setor privado vai ter de ajustar mais. Se o governo não tem a força política para fazer o ajuste, a recessão se prolonga e a perda do emprego aumenta. As condições básicas de governabilidade nos próximos anos não vão ser automaticamente dadas.
E o que o governo poderia fazer para que essas condições de governabilidade ocorram?
Os brasileiros votaram neste governo para que ele governe. Se não demonstrar condições de governar e tomar as decisões econômicas básicas para o problema fiscal, pode haver pressões muito grandes dentro do sistema democrático do Brasil para resolver essas situações. Agora, acho que, se a presidente consegue fortalecer um pouco a sua base política e tem coragem para tomar decisões impopulares na política econômica, ela pode aguentar.
Com relação ao problema econômico, o sr. enxerga uma melhora com a questão fiscal sendo resolvida?
Eu acho que no começo deste ano houve muita negação tanto no Brasil como nos mercados internacionais sobre a gravidade da crise brasileira. Acho que sem a confiança é muito difícil ver uma recuperação no curto prazo. O que é preciso para retomar a confiança? Uma política fiscal coerente que permita ao Banco Central começar a reduzir a taxa Selic. E aí o real vai se estabilizar e pode-se vislumbrar uma recuperação do crescimento econômico via exportação e infraestrutura.
A política fiscal do governo está distante do ideal?
É evidente que é um esforço insuficiente nesse momento. O problema não é a vontade do ministro. O problema é a vontade do governo como um todo e da presidente. Dada a rigidez do sistema fiscal brasileiro, é essencial que nesse momento se mexa no tema do INSS e do vínculo entre o salário mínimo e os benefícios sociais. Tudo isso é impagável nesse momento. O problema de fundo para mim é que os governos do PT estranhamente não reformaram o Estado para criar um Estado democrático moderno, que investe mais nos serviços públicos para os cidadãos e menos nas mordomias de grupos privilegiados.
O que levou os governos do PT a adotar essa política?
Acho que foi pelo fato de a base do partido estar em sindicatos do setor público e em parte pelo desejo do Lula de criar uma coalizão mais ampla possível para isolar o PSDB.
Em 2009, houve uma simbólica capa da ‘The Economist’ com o Cristo Redentor decolando. Por que houve essa piora nas expectativas num período tão curto?
Acho que foi legítimo uma resposta contracíclica de curto prazo na crise de 2009. O problema foi que a política contracíclica se manteve além do ciclo. Houve uma política de estímulos permanentes no primeiro governo da presidente Dilma. E por causa das ineficiências do lado da oferta o País não teve crescimento e houve inflação significativa. É verdade que a presidente tem razão quando fala que a situação internacional tem piorado. Mas os problemas internos ficam evidentes: é a diferença entre o Brasil, que vai ter uma queda de 3% do PIB, e os países do Pacífico, que vão crescer 2%.
É possível então que o Brasil estivesse crescendo mesmo com a desaceleração da China?
Se as reformas estruturais tivessem sido realizadas, e não tivesse havido a expansão enorme do crédito público e a irresponsabilidade fiscal e monetária, o Brasil poderia enfrentar essa conjuntura problemática com mais instrumentos.
Qual deve ser o resultado desse momento vivido pelo País?
Todos estão olhando como o sistema democrático brasileiro está lidando com a Lava Jato, que tem políticos importantes acusados e empresários na cadeia. No contexto latino-americano, é positivo e importante esse movimento. Se se faz o contraste com o México, onde o governo nega o problema da corrupção, o Brasil pode sair mais forte de tudo isso.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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