Dilma convocou ministros para discutir efeitos desse movimento sobre a economia, mas nenhuma medida foi apresentada
Um dia após o Brasil perder o grau de investimento — selo de bom pagador — dado pela agência da classificação de risco Standard & Poor’s (S&P), a presidente Dilma Rousseff convocou seus principais ministros para discutir os efeitos desse movimento sobre a economia. Porém, nenhuma medida concreta foi apresentada. O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, escolhido porta-voz pelo Palácio do Planalto, só conseguiu dizer que a equipe econômica apresentará, até o fim deste mês, as medidas de cortes de gastos e aumentos de impostos que serão adotadas para reequilibrar as contas e atingir a meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) em 2016. Já o líder do governo no Senado, Delcídio Amaral (PT-MS), após se reunir com Levy, disse que o governo anuncia nesta sexta-feira medidas de caráter administrativo, como cortes em contratos de serviços de terceiros, passagens aéreas e diárias.
Segundo Levy, a decisão da S&P de rebaixar o Brasil — resultado de uma combinação entre baixo crescimento, deterioração fiscal e crise política — pode ter sido precipitada, pois o governo está trabalhando para corrigir esses problemas.
— Uma das agências pode ter se precipitado. Quando a gente mostrar que o processo que já estava em andamento vai ter conclusão em algumas semanas, acho que talvez o afã de revisar a nota do Brasil arrefeça entre as outras agências e a própria avaliação do mercado irá se tranquilizar — disse: — A gente sabe que o mercado não se tranquiliza com palavras, apenas com ações. Evidentemente, a gente deve soltar mais ações de cortes de gastos, de aumento da eficiência do setor público e também um fechamento da equação fiscal que garanta a realização da meta de 0,7% do PIB em 2016.
Na reunião, Dilma orientou os ministros a acelerarem propostas de cortes de gastos para que, depois, o governo possa negociar com o Congresso o envio de novas fontes de receita. Além de cortes de funcionários e ministérios, o governo fará um pente-fino em todos os programas sociais e benefícios concedidos para eliminar fraudes e desperdícios. Já os aumentos de impostos devem ser temporários.
Corte de ministérios
Também pode ser anunciado nos próximos dias o início dos cortes nos ministérios. Dilma já decidiu que irá manter o status de ministério da Advocacia Geral da União (AGU), da Controladoria Geral da União (CGU) e do Banco Central. Ela foi aconselhada sobre a necessidade de blindar os chefes dessas áreas de processos e sinalizar que não serão enfraquecidas. Por outro lado, está avançado, apesar das críticas de setores do PT, a proposta de extinção das Secretarias de Direitos Humanos; de Políticas para as Mulheres e da Igualdade Racial. Elas seriam todas fundidas num único ministério, o Ministério dos Direitos Humanos e Ações Afirmativas.
A proposta prevê ainda o fim da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) e da Secretaria da Micro e Pequena Empresa. Nessa configuração, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) — hoje abrigado na SAE — iria para o Ministério do Planejamento, e a Micro e Pequena Empresa para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Algumas alternativas em estudo envolvem ainda o Ministério do Turismo, que pode ser extinto, restando apenas a Embratur com as incumbências da pasta, ou ser fundido com o Ministério dos Esportes, como já foi no passado. Outra área que pode ser fundida é a Cultura com o Ministério da Educação.
Dilma pediu que a equipe não trate a perda do grau de investimento como o fato mais importante da semana, mas que também não minimize a decisão, porque ela tem fortes impactos no mercado financeiro. O objetivo da reunião, contou um ministro da coordenação política, foi unificar o discurso em torno do tema e ratificar o rumo das políticas em discussão.
Dilma lembrou aos ministros que a S&P chegou a revisar para baixo a classificação dos Estados Unidos em 2011, quando o governo americano enfrentava um embate com o Congresso, que se recusava a elevar o teto da dívida pública. Dilma disse que o presidente Barack Obama reagiu à decisão da agência com naturalidade. Na reunião de ontem, os presentes receberam uma cópia em inglês de um discurso feito por Obama comentando o rebaixamento na ocasião.
Levy também fez questão de falar publicamente sobre o ocorrido nos Estados Unidos e fez um paralelo com o Brasil. Frisou que o movimento da agência ajudou a solucionar o impasse nos Estados Unidos. Assim, o downgrade do Brasil agora pode ter como aspecto positivo a solução para o problema das contas públicas:
— Cada país é um país, mas não é impossível deixar de lembrar o movimento dessa empresa em 2011, nos Estados Unidos. Havia uma falta de disposição do Congresso em aumentar o teto da dívida, o que dificultava o aumento de despesas. Pela falta de clareza, a agência fez uma avaliação política lá, assim como fez no Brasil. Na ocasião, esse movimento catalisou uma dinâmica positiva na economia americana.
O Palácio do Planalto distribuiu um gráfico aos ministros para mostrar que o grau de classificação do Brasil junto à agência era pior na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. E, mesmo assim, naquele período não deixaram de chegar investimentos do exterior:
— O investidor vai continuar vindo, até porque os ativos no país estão mais baratos com a valorização do dólar. O realinhamento do câmbio também melhora o perfil das contas externas — disse a “O Globo” um ministro.
O governo busca reduzir em 0,5 do PIB o gasto com despesas discricionárias. Isso faria com que esses gastos passassem de 4% do PIB este ano para 3,5%. Outro gráfico debatido na reunião mostrava que esse indicador já foi de 3% do PIB em 2003 e que, na maioria dos anos, esteve abaixo de 4%.
— Ou seja, 3,5% do PIB não é nada absurdo no cenário atual — acrescentou o ministro.
Minha Casa, Minha vida
Adiada pelo governo devido às dificuldades, a terceira fase do Minha Casa Minha Vida sofrerá reajustes nas taxas de juros e irá contar com uma nova faixa de renda intermediária para financiamentos. Os juros vão variar entre 6% e 8% ao ano. Atualmente, as taxas estão entre 5% e 7,16% ao ano. Já a chamada faixa 1,5 oferecerá subsídios para famílias com renda de até R$ 2.350.
As proposta foram apresentadas ontem pelo ministro da Cidades, Gilberto Kassab, durante reunião com representantes dos movimentos sociais e da construção civil. Outra mudança está no limite da renda da faixa 1, que vai aumentar, dos atuais R$ 1.600 para R$ 1.800 por família, sem cobranças de juros e parcelamento de até 10 anos. Na nova faixa criada, os juros serão de 1,5%.
Fonte: O Globo
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