Depois de 2 anos cozinhando-a internamente, o governo mandou para o Congresso a sua proposta para o marco regulatório da exploração do petróleo na camada pré-sal. Em democracias sérias, agora é que o debate teria início, com os representantes do povo analisando o que deveria ser não mais do que uma sugestão. Mas aqui em Bruzundangas, o Congresso tem o papel apenas de referendar o que o caudilho Lula mandou. A ordem do Executivo é urgência e votar em 45 dias.
É no mínimo um acinte passar dois anos em debates fechados e querer que o Congresso vote um tema sobre o futuro do país sem tempo para refletir e ponderar alternativas. O PT gostava de fazer audiência pública para construir um calçamento de rua através de plenária do Orçamento Participativo nas prefeituras. Já bilhões, deixa que o Executivo em Brasília gaste da forma que lhe aprouver.
O pré-sal sempre foi tratado com nacionalismo retrógrado e grandiloqüência idílica. Do anúncio à ridícula idéia do país integrar a OPEP, o assunto foi marcado mais por devaneios do que seriedade – pelo menos dentro do governo e da aparelhada ANP. O Brasil do pré-sal é Pasárgada. Mas cuidado, Bandeira: lá, Lula é que é o rei.
Eu mesmo entrevistei algumas vezes tanto a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, quanto o ministro das Minas e Energias, Edison Lobão (sarneyzista de carteirinha), sobre o tal estudo do marco regulatório. Nessas ocasiões — na assinatura de algum protocolo, um palanque para discurso, quando os jornalistas abordam as autoridades para perguntar sobre diversos temas —foi possível registrar algum depoimento sobre o processo dos debates internos. De resto, foi tudo totalmente sem transparência. Por várias vezes, Lobão disse que o programa estava praticamente pronto, que ia ser levado para o presidente dar a palavra final. Não mais do que pitadas de idéias eram jogadas nesse tempo — mas já suficiente para levar críticas, por sinal. Em setembro de 2008, no auge da crise econômica, a tal comissão de sábios do governo teve que voltar atrás e perceber que o preço do petróleo também podia cair. Os ânimos refrearam um pouco e o projeto deixou de ser enviado logo. Depois, voltaram a discutir e apresentaram agora a proposta. Que, vale ressaltar outra vez, em País decente seria apenas uma proposta, um início de conversa, um ponto de partida para muitos debates em audiências públicas, imprensa, Congresso e inclusive tema de debate para a eleição presidencial do próximo ano.
O que seria mais urgente para o Pais, votar sem ler um marco regulatório do pré-sal ou concluir uma reforma tributária, sobre há qual se fala há mais de uma década? Criar a Petrosal ou construir os presídios federais e de fato combater a altíssima criminalidade nas cidades brasileiras? Por sinal, onde estão as prometidas PPPs, de que Guido Mantega falava desde quando foi comandar o BNDES em 2004?
O pré-sal é uma “benção” da abertura do setor de petróleo de 1997, da sacudida de que a Petrossauro necessitou para começar a competir. Antes disso, nossas reservas de petróleo estavam deitadas em berço esplêndido. Agora, querem oficializar a Petrossauro com uma pequena variante: Petrosal. Seria para rir, não fosse eu me lembrar que estou falando do meu país. Pois tenho algumas rápidas sugestões para debater o assunto. Devemos criar uma estatal para isso, tendo já uma empresa de produção (Petrobras) e um órgão regulador (ANP)? Os recursos advindos da extração não poderiam ser usados para capitalizar nosso passivo de previdência pública e migrar paulatinamente os segurados de hoje de repartição para capitalização? Adianta colocar em educação com a atual ineficiência da escola pública? A acreditar em um décimo do potencial do pré-sal que o governo diz que tem, é assunto sério que não é para ser tratado no tempo em que se cria um galeto.
Nessa discussão, há muito sal e pouca proteína. Do jeito que o governo quer, estamos condenados a um debate intelectualmente subnutrido e uma atrofia estatal. Que não nos atropele o direito de decidir o futuro.
(Publicado em OrdemLivre.org)
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