O crescimento da produção industrial neste ano deve ser mais equilibrado entre os segmentos que compõem o setor, influenciado pelo consumo interno. Em 2017, os veículos responderam por metade do aumento da indústria, movimento puxado principalmente pela exportação. Agora, espera-se desempenho melhor de itens que tradicionalmente respondem à renda, como vestuário, calçados, alimentos, perfumaria etc. Nesse cenários, os “poréns” são a composição dos novos empregos a serem gerados – formais ou informais – e as incertezas políticas.
Um dado que sinaliza o equilíbrio previsto é a confiança dos segmentos industriais, medida pela Fundação Getulio Vargas (FGV). De acordo com a sondagem mensal feita pela instituição, 10 de 19 segmentos mostravam índice de confiança acima de 100 em fevereiro, dado mais recente. Em dezembro de 2017 eram seis. Entre aqueles que estavam abaixo da linha neutra, cinco melhoraram os níveis de confiança no período. Na metodologia do índice, leituras acima de 100 indicam otimismo e, abaixo, pessimismo.
As expectativas para os próximos meses, um dos itens que compõem o indicador de confiança, também superaram a marca neutra em 10 de 19 segmentos. O aumento da confiança da indústria em geral puxou o Indicador Antecedente Composto da Economia (Iace) do mês passado, que subiu 0,8% para 117 pontos, segundo a FGV e o The Conference Board, que elaboram o dado.
Para Julio Mereb, consultor do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV, o consumo terá uma melhora adicional este ano por causa do aumento do emprego e do crédito, o que deve influenciar um bom desempenho na indústria. A FGV estima aumento de 5,6% na produção do setor, taxa acima da mediana do mercado, de 3,97%, segundo o boletim Focus, do Banco Central.
Por causa do efeito de encadeamento, a produção de veículos deve continuar ajudando a indústria em 2018, mas outros segmentos devem ganhar força por causa da recuperação em curso do mercado doméstico, afirma Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).
“Aqueles mais influenciados pela renda corrente, como alimentos, calçados, semi e não duráveis em geral, devem vir melhor neste ano”, afirma. Segundo Cagnin, a fabricação de veículos foi responsável por 1,22 ponto da alta de 2,5% da indústria no ano passado.
Nos dados de confiança da FGV, segmentos como produtos farmacêuticos, perfumaria, têxteis, combustíveis estão entre aqueles com expectativas acima de cem em fevereiro, indicando o otimismo com os próximos meses. O Iedi não faz projeções, mas espera crescimento mais forte na produção industrial em 2018. “Tudo indica que o ano vai ter desempenho superior a 2017, com uma ressalva sobre as incertezas do processo eleitoral, que podem prejudicar uma retomada”, afirma Cagnin.
No lado do consumidor, as expectativas mais positivas ainda têm que se consolidar. O índice de confiança no mês passado caiu, após cinco altas seguidas, para 87,4 pontos, na área do pessimismo. O movimento foi atribuído à menor satisfação com a situação econômica e perspectivas menos otimistas para os próximos meses, devido ao nível de desemprego.
Nesse sentido, enquanto para Mereb a demanda por bens duráveis tem perspectivas mais positivas neste ano, para Cagnin itens que dependem mais do crédito, como eletroeletrônicos e eletrodomésticos, e mesmo veículos, correm risco de ter um consumo mais morno, caso a recuperação do emprego continue puxada por posições precárias.
Sem carteira assinada, situação em que os trabalhadores não têm estabilidade e geralmente têm renda mais baixa, o crédito costuma ser mais caro, com prazos menores. “Isso pode tirar parte do potencial de crescimento de segmentos mais ligados ao crédito”, diz Cagnin.
Para Mereb, da FGV, o crédito, que deve ficar mais barato de uma forma geral, pode fazer diferença. “A demanda de crédito para consumo tem tido melhora bastante sensível. É natural que o segmento de bens duráveis continue em recuperação”, diz. Dado da Serasa Experian divulgado ontem mostrou que a demanda do consumidor por financiamentos cresceu 16,5% no primeiro bimestre deste ano sobre o mesmo período do ano passado, acompanhando a queda dos juros. O aumento ocorreu em todas as faixas de renda.
Fora do mercado de consumo das famílias, segmentos relacionados a bens intermediários e de capital devem ir bem. “Devemos ter uma recuperação robusta em bens de capital, porque a base de comparação é muito baixa, depois de queda de 30% nos investimentos durante a recessão. Há um bom potencial para e devolver parte dessa queda”, afirma Mereb.
No segmento de máquinas e equipamentos, o indicador de confiança superou 100 já em janeiro (102,1 pontos), contra 95,4 em dezembro, e ampliou a alta em fevereiro, para 103,7 pontos. As expectativas cresceram de 103,8 para 106,9 pontos no período. Mereb destaca a produção de bens intermediários, que são os insumos usados pelo setor e representam 60% da indústria. “Esse é o coração da indústria e deve continuar o processo de retomada iniciado já em 2017, dando uma contribuição importante e mais homogênea ao setor neste ano”, diz.
Fonte: “Valor Econômico”