Não são apenas os representantes dos poderes públicos que devem participar do debate sobre a divulgação dos salários dos servidores públicos. No site de petições públicas da Avaaz já podemos acompanhar um manifesto sobre o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) 582, de 2012, que susta a divulgação nominal da remuneração dos servidores públicos. Desde o início da validade da Lei de Acesso a Informações Públicas, agora em maio, os três poderes autônomos dão diferentes interpretações à obrigatoriedade de divulgação deste tipo específico de informação pública. O Executivo defende a divulgação nominal, e o Judiciário, apenas a individualizada. Cabe agora ao Legislativo a definição deste pormenor que pode fazer toda a diferença para a garantia dos direitos fundamentais do cidadão.
O Poder Judiciário divulgou em sua lista os departamentos os cargos, os vencimentos e os adicionais de cada servidor, sem citá-los nominalmente, embora o CNJ insista em que os nomes também devam ser divulgados. Já o Poder Executivo, através do Portal da Transparência, passou a divulgar também o nome de cada servidor, junto com o valor recebido. O que dá margem ao debate: é de interesse efetivo do cidadão conhecer nominalmente a surrealista lista dos 10 maiores salários do Executivo, onde figuram 5 professores da Universidade Federal do Ceará?
No Poder Legislativo, diversas entidades estão contra a divulgação nominal dos salários e apoiam a iniciativa do PDL, evitando que o direito à privacidade dos servidores seja anulado em nome da transparência pública. O próprio Fonacate, fórum das entidades e associações de carreiras de Estado, se declara preocupado com a divulgação de nomes. Para Roberto Kupski, presidente da entidade, “a própria lei prevê a divulgação individualizada da remuneração, o que não significa que deva ser nominal”.
Daí a necessidade de um amplo debate sobre os princípios e valores constitucionais que estão por trás da divulgação nominal, como a garantia da privacidade de todo cidadão, a obrigação da impessoalidade no trato dos gestores com a coisa pública e a transparência que deve reger a relação entre ambos. O que nos obriga a refletir sobre a diferença entre a transparência pública e o artifício da politicagem pela fulanização da informação pública.
Não podemos nos esquecer que uma plena democracia precisa ter instrumentos eficazes que garantam não só os direitos coletivos, mas principalmente os direitos individuais de seus cidadãos, sem exceções. Até porque direitos coletivos não podem suprimir direitos individuais, sob o risco de se transformarem em totalitarismo coletivista. Uma vez que mesmo os servidores públicos, antes de serem servidores, são também cidadãos de iguais direitos perante a lei.
Fonte: O Globo, 24/07/2012
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