Nas palestras que profiro sobre os problemas políticos e econômicos do Brasil, duas reações, em forma de indagações, são bastante comuns: o que está por trás das crises? e por que a maioria dos “especialistas famosos” não as consegue explicar de forma clara e objetiva?
Essa ausência de explicação adequada ficou novamente evidente diante das notícias da semana passada sobre o estado da nação: redução de 3,6% do PIB em 2016, uma queda acumulada de 9% desde o início da diminuição em 2014, 11 trimestres seguidos de recuo disperso por todas as atividades econômicas, queda do PIB por nove meses consecutivos e dois meses de estagnação. A pior retração do mundo é nossa; com governo brasileiro não há quem possa.
Uma das exceções à mencionada regra é o economista Alexandre Schwartsman, dos poucos que ainda dá para ler na imprensa e com quem aprender. Em artigo recente, Schwartsman resumiu bem a coisa: “a recessão histórica é resultado direto das políticas desastradas adotadas pela administração anterior, em particular no plano fiscal, mas muito agravada pelo intervencionismo excessivo em diversas frentes”.
Eis o ponto que está na origem das nossas crises econômicas: o tipo e a qualidade da intervenção estatal no Brasil. Mas o que é, afinal, intervencionismo? O economista Ludwig von Mises definiu intervenção como “uma norma restritiva imposta por um órgão governamental, que força os donos dos meios de produção e empresários a empregarem estes meios de uma forma diferente da que empregariam se não houvesse restrição” (“Uma crítica ao intervencionismo”).
Um segundo conceito, mais amplo, nos oferece o professor de economia Peter Boettke ao definir a intervenção estatal como “o conjunto de atos arbitrários do governo que interferem na economia de mercado” e que “violam as regras gerais de funcionamento da interação social” (“A intervenção estatal na economia é inevitável?”).
Entenderam? A recessão econômica atual é mais uma das consequências do intervencionismo estatal no Brasil, que é institucionalizado. É, portanto, uma obra em progresso de sucessivos governos. Os diversos obstáculos e incentivos contrários à prosperidade econômica são a exteriorização dessa intervenção composta por um conjunto excessivo de normas de baixa qualidade (ou mesmo esdrúxulas).
O mais dramático dessa história é que, como esclarece o professor Fabio Barbieri, “na presença da ideologia estatista, cada fracasso de uma intervenção gera demandas por novas intervenções: a culpa dos problemas nunca é a intervenção em si, mas a falha em aplicar a lei e o egoísmo dos agentes econômicos”. Por isso, os políticos e parte da sociedade reagem sistematicamente com mais do mesmo ao exigirem “novas e mais rigorosas leis” (“A economia do intervencionismo”).
Esse ambiente hostil no país não atrapalha só os negócios, mas também dificulta o florescimento de uma cultura que lida de forma mais apropriada com os erros e acertos da economia de mercado. Se a mentalidade intervencionista não for modificada, será difícil empreender reformas duradouras e consistentes capazes de derrubar os obstáculos que mantêm a sociedade brasileira refém das elites políticas.
Do passado é possível extrair lições. O enriquecimento na Europa a partir do século 17, por exemplo, só foi possível graças a “uma mudança radical na mentalidade” e “na atitude das pessoas em relação ao empreendedorismo, ao sucesso empresarial e à riqueza em geral”, como conta a professora Deirdre McCloskey (“A fórmula para um mundo mais rico? Liberdade, justiça e virtudes burguesas”).
Se essa transição não tivesse acontecido, países europeus não ocupariam, hoje, posições favoráveis nos índices sociais e econômicos — o inverso da realidade brasileira, prejudicada pela combinação entre mentalidade intervencionista e ambiente contrário à prosperidade. A mudança começa por uma pergunta implacável: qual país queremos ser?
Fonte: “Gazeta do povo”, 13 de março de 2017.
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