Já se passaram praticamente dois anos desde que o governo Dilma começou, com mais intensidade, seus experimentos de intervenção direta em diversos setores. E já se forma um consenso de que essas intervenções não somente falharam no seu objetivo inicial, como também contribuíram para uma piora no ambiente de negócios do Brasil.
Vejamos os casos mais marcantes. Em março de 2012, a contragosto dos técnicos da Petrobrás, incluindo a sua recém-apontada presidente Graça Foster, o governo ordenou a manutenção dos preços da gasolina, que estavam desde 2009 defasados. Havia o temor de uma pressão inflacionária num momento em que o Banco Central forçava uma redução de juros. Em abril do mesmo ano, a Caixa e o Banco do Brasil também receberam ordens de reduzir juros aos seus clientes. Cinco meses depois, a própria presidente Dilma anunciaria em cadeia nacional uma redução forçada do preço da energia elétrica, atrelada à renovação antecipada de contratos de concessão.
O resultado? No caso da Petrobrás, impacto negativo direto no seu caixa e redução da sua capacidade de investir. Do começo de 2012 até o dia 18 de fevereiro deste ano, as ações da Petrobrás tiveram perda de 43%. No mesmo período, as ações da Statoil, petrolífera estatal norueguesa, com gestão muito mais blindada, evoluíram 2,5%. Apesar do controle de preços, a inflação continuou firme e exigiu do Banco Central um novo ciclo de elevação de juros. Como se não bastasse, a incerteza no preço da gasolina praticamente congelou novos investimentos num setor adjacente, o de etanol.
No setor elétrico, a renovação de muitas concessões recaiu na conta das próprias estatais. As elétricas federais hoje valem, na Bolsa, pouco mais de 1/4 do que valiam no início de 2012. Com o recente déficit de energia, as usinas térmicas, de alto custo, tiveram de ser acionadas. Os preços da energia no mercado livre dispararam. E o governo já admite repassar ao consumidor os custos extras para manter o sistema.
A intervenção nos bancos, por sua vez, foi inicialmente tida como um caso de sucesso: os bancos públicos expandiram suas receitas e passaram a abarcar a metade do mercado de crédito. Mas, enquanto isso, muitos bancos privados passaram a ser mais seletivos, direcionando empréstimos para clientes com menor risco. Do começo de 2012 para cá, as ações do Banco do Brasil caíram 18%, enquanto as do Itaú-Unibanco e do Bradesco aumentaram 13% e 22%, respectivamente. Os juros novamente subiram. A Caixa e o Banco do Brasil reportaram, no final do ano passado, aumento de inadimplência e muitos analistas já aguardam piores notícias para os próximos meses.
O que poderia, então, ter sido feito? Já sabemos que o uso de estatais para controlar preços não funciona. Na década de 1980, a prática foi adotada copiosamente e o resultado foi desastroso: quase metade das estatais passou a ter prejuízo e a inflação só foi ceder com o Plano Real, em 1994. A chave, ao contrário do que fez o governo, é desenhar regras do jogo claras (no jargão econômico, “instituições”) que deem aos agentes econômicos os incentivos corretos.
Por exemplo, em 2003, ainda no primeiro mandato do governo Lula, foi promulgada a lei do crédito consignado. Bancos poderiam emprestar com pagamentos debitados da folha de pagamentos do tomador. Com maior garantia de pagamento, de imediato os bancos perceberam menor risco do crédito. Christiano Coelho, Bruno Funchal e João Manoel Pinho de Mello (*) estimaram que, com a medida, o volume de crédito aumentou 1,5 vez e os juros dos empréstimos caíram 7,7 pontos porcentuais.
É uma pena que muitos governos se recusem a aprender com essas inovações e continuem insistindo no velho erro de querer direcionar a economia por meio de mandos e desmandos.
(*) The Brazilian payroll lending experiment, The Review of Economics and Statistics, 2012.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 05/03/2014
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