Para muitos players do mercado financeiro, o cenário econômico é binário, a depender do resultado das eleições. Julgam Jair Bolsonaro equipado para fazer reformas, enquanto Fernando Haddad representaria um risco de retrocesso.
No entanto, ambos enfrentarão grandes dificuldades para governar e aprovar reformas estruturais, pois carecem de experiência política e administrativa, e não têm projeto para o País ou agenda econômica bem definida.
A situação é grave e demandaria um presidente com maior envergadura política. O Brasil vive a mais grave crise fiscal da história, o que implica risco de shutdown de serviços públicos e de o presidente incorrer em crime fiscal nos próximos anos. Isso vale também para os governadores. A recuperação cíclica da economia poderá frustrar, tendo em vista a provável alta da inflação e dos juros pelo Banco Central. Tudo isso em meio a uma sociedade indignada e instituições fragilizadas.
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Os desafios de cada candidato são diferentes, já de largada. Para Haddad, será renegar a equivocada agenda econômica petista e montar uma equipe econômica competente e com credibilidade. Será necessária grande dose de coragem e humildade. Atributos raros.
Bolsonaro precisará enfrentar o desafio da política para construir uma base de apoio sólida e com partidos que exerçam liderança no Congresso, cedendo espaço no governo. O deputado é pouco hábil politicamente, a julgar pelas frequentes mudanças de partido e pela pobre performance na Câmara, onde é associado ao “baixo clero”, apesar de estar em seu sétimo mandato parlamentar.
Pelas projeções dos analistas do mercado financeiro, o próximo governo será um sucesso, apesar de não sabermos qual a probabilidade atribuída ao cenário traçado. De acordo com o boletim Focus, a taxa Selic subirá para apenas 8% aa em 2019 (atualmente está em 6,5%), a inflação ficará em 4,2%, a cotação do dólar em R$3,83/US$ no final do ano e o crescimento do PIB de 2,5%. Essas previsões, com pequenos ajustes, seguem para os anos seguintes.
Traduzindo, os analistas apostam na continuidade de reformas fiscais, tal que a inflação fique em torno da meta, sem exigir um aperto monetário pelo BC, bem como o avanço de reformas estruturais que elevem o potencial de crescimento do País.
Este cenário não é impossível, mas sua probabilidade, por ora, é baixa. O ambiente se manterá incerto mesmo após o resultado das eleições, e incerteza é veneno para investidores, produtores e consumidores. Teremos, ao menos, de aguardar a descida do palanque: o aceno de Haddad ao setor privado, após seus discursos antiajuste fiscal, e o aceno de Bolsonaro à política, após o discurso antipolítica.
A ironia é que apesar dos discursos cheios de personalidade de ambos os lados e com críticas ao governo Temer, o próximo governo terá de ser de continuidade do atual para o País voltar a crescer.
É recomendável preservar ao máximo os times na Fazenda, no Planejamento e no Banco Central. Para tanto é necessário o presidente ter compromisso com uma agenda responsável e modernizante. Com a urgência de reformas, o País não pode perder tempo aguardando o aprendizado de um novo time. Já basta a inexperiência do próximo presidente.
É importante avançar com as várias propostas de reforma, que são importante contribuição do atual governo e também do Congresso. A lista é extensa: reforma da Previdência, tributária, agenda BC+, marcos regulatórios dos setores de energia, privatização da Eletrobrás, para citar as de maior visibilidade.
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A mais urgente é a reforma da Previdência. Este sim é o divisor de águas do cenário binário. Não que sendo aprovada tudo se resolve, mas ela é central para o País afastar um cenário caótico. E tanto para Haddad como para Bolsonaro, será desafiador aprovar tempestivamente uma boa reforma.
Que venha a continuidade da agenda econômica. Quanto menos inventar, melhor.
Fonte: “Estadão”, 04/10/2018