Nos bastidores do leilão por deputados em andamento na Câmara com a janela partidária, legendas estão oferecendo cota fixa para bancar eleições de parlamentares e criando regras tanto para atrair quanto para evitar a perda de filiados. Nas negociações, há cobrança para registro formal de promessas, “punição” a quem votou contra o novo fundo que vai irrigar as campanhas e diferenciação de valores para novos e antigos filiados. Tudo isso em meio a uma forte concorrência.
— Isso aqui virou um mercado. Se um (partido) fala que vai dar R$ 1,5 milhão, o sujeito vai lá, conta para o outro partido, que aí oferece R$ 1,6 milhão — conta um deputado que participa das negociações para receber novos quadros em seu partido.
REGISTRO DE VALOR EM ATA
No sobe e desce dessa bolsa, o PMDB está oferecendo R$ 1,5 milhão para os deputados que tentarão se reeleger. Prometido pelo presidente da legenda, senador Romero Jucá (RR), o valor levantou desconfianças, e houve pedido para que a oferta fosse registrada em ata, para cobranças futuras. A reunião do PMDB no dia 21 de fevereiro, quando foram prorrogados os comandos dos diretórios estaduais e municipais, fixou em um documento interno o montante a ser repassado para as campanhas federais. Mesmo assim, o partido do presidente Michel Temer tem sido um dos mais vulneráveis na janela partidária.
No DEM, partido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), o compromisso é repassar entre R$ 1 milhão e R$ 1,5 milhão para cada campanha à reeleição de deputado federal. Mas o valor vai variar de acordo com o comportamento dos deputados em votações, e privilegiará os novos quadros.
O critério que o partido definiu é o de que quem votou contra a criação do fundo eleitoral, em outubro do ano passado, receba o piso para a campanha, ou seja R$ 1 milhão. Quatro deputados se enquadram nessa situação: Alan Rick (AC), Marcos Rogério (RO), Norma Ayub (ES) e Onyx Lorenzoni (RS). Quem votou a favor receberá o valor máximo, de R$ 1,5 milhão. Os novos deputados que se filiarem à legenda também contarão com esse valor maior. O DEM tem tido um aumento robusto em sua bancada, que deve praticamente dobrar de tamanho. A sigla iniciou a legislatura, em 2015, com 21 deputados e já chega a 38. Há ainda outros quatro deputados negociando para se filiar.
Com a proibição do financiamento empresarial, as campanhas em 2018 serão majoritariamente pagas com dinheiro público, e os partidos terão que se virar com os recursos do fundo partidário e do fundo eleitoral, que juntos somam R$ 2,6 bilhões. As regras de distribuição são feitas internamente. Além dos recursos públicos, as campanhas também podem ser pagas com doações de pessoas físicas, o que, em tempos de impopularidade da classe política como um todo, não deve fazer muito sucesso.
Sem candidaturas presidenciais e com poucas pretensões de fazer governadores, PP e PR concentrarão os recursos a que tiverem acesso nas campanhas para deputado federal. Foram esses dois partidos que mais se articularam pela aprovação da reforma eleitoral que definiu o novo fundo e que agora devem alcançar ou chegar mais perto ao teto de financiamento para campanhas de deputados, de R$ 2,5 milhões.
No PR, segundo relatos, aos deputados com maior visibilidade foi prometido o valor máximo previsto na nova legislação eleitoral. Já o PP vem falando nos bastidores em algo em torno de R$ 2 milhões. Pré-candidato ao governo de Santa Catarina, o deputado Espiridião Amin (PP) diz que seu partido quer se tornar uma das duas maiores bancadas da Câmara. Atualmente, a legenda é a quarta, com 45 deputados.
Com a reforma eleitoral aprovada no ano passado, o tamanho das bancadas federais passou a ser crucial, pois o valor dos fundos públicos de financiamento, bem como o tempo de TV de cada legenda, é proporcional ao número de deputados na Câmara.
— A lógica das campanhas se inverteu. Antes, girava em torno das candidaturas presidenciais. Agora, com o fundo eleitoral, eleger o maior número de deputados virou o novo ouro em pó — pontua um dirigente partidário.
O PSDB não vai conseguir repassar valores muito competitivos aos seus candidatos a deputado. A sigla tem que dividir o bolo com a candidatura presidencial de Geraldo Alckmin. Com isso, deputados tucanos têm dito que contarão com R$ 1,3 milhão para tentarem se reeleger. Dono da terceira maior bancada da Câmara, com 46 deputados, o PSDB deve perder quadros. Há pelo menos seis deputados se articulando para deixar a sigla.
Para o deputado Daniel Coelho (PSDB-PE), a nova regra de financiamento eleitoral favorece os partidos que não têm candidaturas majoritárias.
— Os que não têm eleição majoritária em canto nenhum conseguem despejar tudo nas campanhas para deputados. Aí vira uma corrida maluca em busca do dinheiro — diz Coelho, que está desgastado no PSDB e cogita ir para o PPS, mesmo sabendo que pode ter menos dinheiro para sua campanha na nova legenda.
Alguns partidos ainda não definiram quanto destinarão às campanhas, e aguardam o fim da janela partidária para saber o tamanho final da bancada. No PT, por exemplo, o debate é complexo. Há quem defenda que os atuais deputados contem com uma fatia maior de financiamento. Há quem rejeite essa tese. E há ainda os que sugerem que seja feita uma lista dos que têm mais chance de se eleger para que recebam mais dinheiro. Os petistas têm a maior bancada federal atualmente, com 58 cadeiras na Câmara.
SEM INFIDELIDADE PARTIDÁRIA
O PSD também aguarda o fim da janela. E o Podemos, antigo PTN, com 15 deputados, espera crescer de tamanho. Para isso, oferece R$ 1,4 milhão para os atuais deputados se reelegerem e R$ 1 milhão para quem se filiar à legenda.
Antes das mudanças sobre o financiamento, gastava-se algo em torno de R$ 4 milhões a R$ 5 milhões por campanha a deputado federal. Além do valor, irrigado basicamente com doações de empresários, a duração da campanha era maior: 90 dias. A partir deste ano, os candidatos terão 45 dias de campanha oficial. Nesse período de troca de legendas, ninguém será punidos por infidelidade partidária. Nos seis dias desde que a janela se abriu, o sistema da Câmara já registrou dez mudanças partidárias. O número real é ainda maior, já que as mudanças são informadas primeiro à Justiça Eleitoral, e só depois à Casa.
Fonte: “O Globo”