BRASÍLIA – Pressionado pelo governo, o Tribunal de Contas da União (TCU) deve voltar a julgar nesta terça-feira, 15, o processo que analisa a primeira parte da privatização da Eletrobras, travada na Corte de Contas desde dezembro de 2021. Uma decisão sobre o tema é crucial para dar andamento ao processo e realizar a emissão de novas ações até maio. O entendimento é que o aval do órgão fiscalizador dará mais segurança jurídica para a diluição do controle acionário.
Em sessão extraordinária que será realizada às 16h, o ministro Vital do Rêgo devolverá seu voto-vista. Em dezembro, o ministro Aroldo Cedraz, relator do processo, apontou uma série de inconsistências no processo de privatização da estatal com enfoque na geração e distribuição de energia.
Conforme antecipado pelo Estadão/Broadcast há duas semanas, Rêgo tende a dar um voto mais duro e questionar os valores da outorga pela mudança nos contratos das usinas hidrelétricas da estatal. Durante a privatização, a empresa poderá alterar o regime de exploração da energia de suas usinas, de um modelo que só considera custos de operação e manutenção para um de preços livres.
A questão gira em torno de um tema que foi tratado na análise da unidade técnica, mas que estava fora do radar dos planos do governo: a inclusão dos valores referentes à “potência” de energia.
O ministro defende que os valores contabilizados pelo governo incorporem a capacidade de contratação de energia de usinas em momentos de maior demanda por energia, que servem para manter a segurança do fornecimento.
Isso poderia elevar o valor da taxa que precisa ser paga à União (chamada de outorga) e atrasar ainda mais o processo de venda da estatal. O governo rebate os questionamentos sobre a remuneração a prestação de serviço de potência, pois não há respaldo na lei para isso.
O ministro tinha até o dia 23 de março para levar seu voto ao julgamento, mas a ala mais alinhada ao Executivo no TCU solicitou que ele acelerasse a análise. No pior dos cenários, ministros sinalizaram reservadamente ao Broadcast que os questionamentos do voto-vista podem levar a um novo adiamento do julgamento, o que colocaria em xeque os planos de privatizar a empresa neste ano.
A segunda parte da desestatização da Eletrobras, sobre modelagem, deve ser concluída pela área técnica entre o fim deste mês e o início de março. O relator desta etapa também é o ministro Aroldo Cedraz.
Dezembro
No julgamento ocorrido em dezembro, Cedraz determinou que o Ministério de Minas e Energia (MME) realizasse novos estudos para corrigir alguns pontos apresentados ao Tribunal. A área técnica da corte de contas identificou falhas que totalizam R$ 16,2 bilhões nos contratos relativos às usinas hidrelétricas que serão alvo da privatização. Isso porque, durante o processo de desestatização, a empresa poderá alterar o regime de exploração da energia de suas usinas, de um modelo que só considera custos de operação e manutenção para um de preços livres. Desse valor, R$ 5,6 bilhões foram reconhecidos pelo MME.
Outro ponto questionado pelo ministro foi o efeito da privatização nas tarifas dos consumidores. Cedraz afirmou que a “neutralidade” de preço esperada pelo governo, devido à previsão de repasses de recursos da operação da Eletrobras para abater tarifas, parece estar restrita àqueles atendidos pelas distribuidoras, não se aplicando aos consumidores livres – que negociam diretamente com as geradoras.
Nesta linha, seu voto previu determinação ao MME para “elaboração de estudos quanto aos impactos econômicos e financeiros de médio e de longo prazo que serão causados aos consumidores de energia elétrica dos mercados cativo e livre em decorrência do bônus de outorga” que se refere à lei que permitiu a privatização. Ele apontou, no entanto, que não há qualquer pretensão de usar as informações como obstáculo para a operação.
Fonte: “Estadão”, 15/02/2022
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