É inequívoca a tendência de queda dos juros quando se olha para prazos mais longos. Tomando apenas o mandato do presidente Lula, que honrou a independência do Banco Central (BC), a taxa básica de juros caiu de um pico de 26,5%, no início de 2003, para os atuais 8,75%.
O BC de Henrique Meirelles começou com um movimento de alta dos juros. Levou-os a 26,5% em fevereiro de 2003 e lá os deixou por quatro meses.
Começou, então, o primeiro ciclo de baixa, que em abril de 2004 chegou à taxa de 16%. Ali ficou por quase cinco meses. Voltou a subir, sempre numa escadinha, até alcançar o pico de 19,75% em maio de 2005, e ficou nesse ponto por quatro meses. Reparem: quase 7 pontos abaixo do pico anterior.
No segundo movimento de queda, a taxa parou em 11,25% – isso em outubro de 2007. Permaneceu um bom tempo nesse nível, cerca de seis meses, até abril de 2008.
Aí, com a economia dando sinais de forte aquecimento, o Comitê de Política Monetária (Copom) voltou ao ciclo de alta. Em dezembro de 2008, os juros básicos chegaram a 13,75%, e aí estavam quando sobreveio a grande crise financeira de setembro/outubro de 2008. Reparem, de novo: esse terceiro pico era 6 pontos abaixo do segundo e 12 pontos abaixo do primeiro.
Em janeiro de 2009, o BC iniciou a derrubada da taxa, respondendo à crise. Aí, puxou a queda mais rapidamente, para chegar aos atuais 8,75%, em setembro de 2009. Trata-se de um recorde de baixa na era do real, levando a taxa real de juros (descontada a inflação) para a casa dos 5% ao ano – também inédita para padrões brasileiros recentes.
A previsão unânime dos analistas diz que o Copom voltará a subir os juros em algum momento neste ano, mais provavelmente em junho. O entendimento médio acredita que o novo pico chegará a algo em torno dos 11%, de novo abaixo da alta anterior.
Mantendo-se a estabilidade das contas públicas – com mais austeridade, de preferência, e uma redução mais forte da dívida pública – e preservando-se a política monetária, com BC independente e regime de metas de inflação, podem apostar que o próximo presidente da República entregará uma taxa de juros ainda menor que a recebida de Lula.
Lula e o mundo – O presidente Lula tomou ao pé da letra o Prêmio Estadista Global, que lhe foi concedido pelo Fórum Econômico Mundial. No discurso de agradecimento, deu lições ao mundo e mostrou o Brasil, sob sua liderança, como exemplo de sucesso. Disse que, de 2003 para cá, “o Brasil, mesmo com todas as dificuldades, fez a sua parte”. E questionou: “Podemos dizer que o mundo também melhorou?”
Podemos. De 2003 até a crise financeira de 2008, o produto mundial cresceu na média de 4,5% ao ano, o que foi extraordinário. O comércio mundial expandiu-se mais de 10% ao ano, ritmo inédito. E a circulação global de capitais também bateu todos os recordes.
O Brasil pegou a onda. As exportações, que mal passavam de US$ 60 bilhões/ano, chegaram a quase US$ 200 bilhões em 2008. De investimentos externos diretos o Brasil recebeu US$ 142 bilhões entre 2003 e 2008. Além disso, em 2007, no auge do processo, as companhias privadas locais obtiveram nada menos que R$ 167 bilhões com a emissão de ações, debêntures e outros tipos de papéis. A maior parte desse dinheiro veio do exterior.
O mundo ofereceu oportunidades e o Brasil estava preparado para aproveitá-las. O mundo precisou de comida e o agronegócio brasileiro, construído ao longo de décadas, atendeu a essa demanda.
A prova de que o mundo foi o fator crucial está na crise. O Brasil, que vinha crescendo mais de 6% ao ano, caiu para menos de zero. As exportações perderam nada menos que US$ 50 bilhões.
Mas o mais importante e que tornou o Brasil uma estrela global, mesmo depois da crise, foi a estabilidade macroeconômica. O maior mérito de Lula foi ter mantido as bases dessa estabilidade – superávit primário das contas públicas, câmbio flutuante e regime de metas de inflação com BC independente – herdadas do governo FHC. Estável, o Brasil é uma grande economia, com sólida democracia.
A bonança econômica é a base da popularidade de Lula, assim como a de muitos outros governantes. Mas Lula é mais do que popular, é um fenômeno. Isso vem da propaganda maciça (fala todos os dias para as mais diversas plateias, sempre se elogiando); da presença constante aqui e mundo afora (só no ano passado, 83 dias de viagens pelo Brasil e 91 dias por 31 países); e, especialmente, do Bolsa-Família ampliado e dos reajustes elevados do salário mínimo. Os dois programas combinados beneficiam diretamente algo como metade da população. Pode-se incluir aí a contratação de funcionários e o reajuste dos seus salários, que garantem o apoio de um setor formador de opinião.
Além disso, Lula distribuiu recursos públicos a um amplo elenco de empresas, atraindo boa parte do empresariado, e a todo o movimento sindical. E fez isso com base nos inéditos ganhos de arrecadação, frutos da atividade econômica.
A presidente do Chile, Michele Bachelet, fez algo parecido – solidez econômica e programas sociais – e obteve popularidade até maior que a de Lula. Foi, inclusive, mais responsável com as contas públicas. Mas por que não é ela a estadista global? Porque o Chile é menor que o Grande Rio. E por que não alguém dos outros grandes emergentes? Porque a China é uma ditadura, a Índia não definiu uma liderança única e o Ocidente desconfia do russo Putin.
Lula disse que é preciso “reinventar o mundo”. Precisa nada. Basta restabelecer um bom sistema financeiro – o que não é pouca coisa – e preservar aberto o comércio mundial.
O Brasil também não precisa inventar nada. Basta aperfeiçoar o que fez nos últimos 15 anos e melhorar a educação (aqui, sim, uma reinvenção) e a infraestrutura
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