Interessante. O rebaixamento pela S&P na semana passada não caiu como uma “bomba nos mercados”. Muitos participantes já vinham comentando sobre a possibilidade de novos rebaixamentos, até porque o governo segue sem uma direção definida sobre o esforço de ajustar o setor público, ganhar pontos de credibilidade e ingressar num ciclo de retomada consistente do crescimento. O que surpreendeu foi a mesma agência que já havia rebaixado o País há cinco meses, em setembro do ano passado, voltar a fazê-lo agora. Além disto, todos estavam atentos aos movimentos da Moody’s, em visita recente ao País e a única agência ainda a não ter nos colocado entre os junk bonds.
Disse a S&P o que todos já estão cansados de saber. O governo segue tentando avançar com as reformas estruturais, mas o ambiente político, ainda mais com a ameaça de impeachment e os casos de corrupção, continua inviabilizando-as. O ajuste está muito prolongado, a correção fiscal mais lenta e a contração econômica pior do que se imaginava. Alguma novidade? Nenhuma, a não ser por um ponto. Disse que a dívida da Petrobras, em 7% do PIB, tem potencial explosivo, e que o governo terá que fazer algum aporte em breve. Ou seja, o Tesouro terá que socorrer a empresa petroleira.
Outra observação importante é que o S&P tirou o “selo de bom pagador do País”, em moeda estrangeira, de BB+ para BB, colocando em dúvida a capacidade do governo de rolar sua dívida externa, mas também o retirou em moeda local, de BBB- para BB, também duvidando da capacidade do governo de continuar rolando a dívida doméstica. Ou seja, neste nivelamento entre risco externo e doméstico reconheceu que não estamos livres de um calote. Bem, aí as coisas já começam a ficar mais sérias.
No caso da dívida externa, claro que a capacidade das empresas e do governo tende a ficar mais delicada, dado o rebaixamento. Importante salientar que, mesmo que por caminhos tortuosos, recessão doméstica e câmbio depreciado, as nossas contas externas registraram um considerável ajuste em 2015. O déficit em conta corrente, de US$ 104,0 bilhões em 2014, recuou a US$ 58,9 bilhões no ano passado, em muito, pelo superávit comercial registrado (US$ 19,9 bi), decorrente das importações recuarem mais do que as exportações. Em paralelo a isto, a necessidade de financiamento externo se manteve sob controle, visto que o ingresso líquido de investimentos externos diretos foi a US$ 75 bilhões no ano passado, mais do que o suficiente para financiar o déficit externo (4,4% do PIB contra 3,3%).
Claro que depois destes rebaixamentos, com novos devendo ocorrer em breve, esta capacidade de financiamento deve se deteriorar neste ano mas, por ora, a situação segue sob controle. Não esqueçamos também do nível de reservas cambiais atual, ainda considerável, US$ 370 bilhões, mais do que suficiente para encarar o endividamento externo, US$ 337,7 bilhões.
Contabilizando créditos externos e haveres de bancos comerciais, a dívida líquida externa do País se encontrava, ao fim do ano passado, negativa em US$ 50,6 bilhões, algo em torno de 2,9% do PIB (já esteve negativa em US$ 90,5 bilhões em 2013). Mais ainda. Na relação reservas cambiais/dívida externa bruta teríamos algo em torno de 109,2%, nível ainda confortável, mesmo depois de ter chegado em 2013 a 120%. Ou seja, mesmo diante do cenário externo adverso e dos variados problemas internos, causados pela falta de governança, ainda temos uma posição de “credor externo” (sobre endividamento falemos em breve).
O problema seria a capacidade de rolagem da dívida interna, já que a dívida bruta segue em trajetória preocupante, causada pelo adiamento de um ajuste fiscal mais efetivo e pelo excesso de crédito público ofertado desde 2011. Desde então, foram mais de R$ 367 bilhões do Tesouro injetados no mercado, via bancos públicos. Como resultado, a dívida bruta se acelerou. Estava em 53,8% do PIB em dezembro de 2012, foi a 66,2% no ano passado e deve passar de 70% neste ano. E o pior é que com o PIB recuando este endividamento tende a aumentar mais. Agências de rating comentam que acima deste patamar crítico de 70%, a capacidade de financiamento se torna problemática.
Haveria então o risco de calote da dívida interna? Se o governo mostrar seriedade e comprometimento e avançar nos próximos meses no ajuste fiscal, acreditamos que não. Caso contrário, se nada for feito, de forma efetiva no front fiscal, sim. Neste caso, diante da deterioração dos indicadores fiscais, com o déficit e a dívida se elevando, a capacidade de rolagem da dívida (nos seus vários leilões) se tornará cada vez mais custosa para o governo, até chegar ao ponto em que o calote será inevitável.
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