Por Felipe Moraes
Os economistas fisiocratas cunharam a máxima “Deixai fazer, deixai passar, que o mundo anda por si mesmo (Gournay)”. Assim sendo, a visão iluminista em oposição ao mercantilismo defendia uma menor intervenção estatal como meio de se encontrar eficiência econômica e liberdade política.
Ressalta-se que a preocupação nesta época era com a livre circulação de mercadorias tangíveis, que compunham a principal forma de mercancia. Em oposição a ideologia mercantilista, que propunha o acúmulo de metais preciosos mediante a troca de commodities por bens de consumo, o liberalismo defendia que não era desejável que o Estado orientasse os agentes econômicos em seus negócios.
Em um turbilhão de mudanças tivemos a revolução industrial, que conduziu à contemporaneidade a experiência das mais diversas. A mesma reforma industrial, que possibilitou o surgimento de democracias liberais no Estados Unidos, Brasil, Japão e vários países da Europa Continental, também culminou com ideário Marxista de uma revolução proletária com a ocorrência deste evento em 1917 e instalação de uma República “Popular” na Rússia (a)fundado neste País a maior experiência de planificação de mercado de todos os tempos.
A planificação total da economia na URSS foi refutada por Mises na expressão clássica de que a planificação decorrente da coletivização dos bens de produção torna impossível um cálculo econômico racional da demanda. Logo a URSS, a maior nação do mundo, por certo tempo, náufraga em suas próprias contradições internas e desintegra-se, legando apenas a Federação Russa como uma economia periférica no circuito internacional.
Em nossos tempos a discussão sobre o liberalismo como política econômica ensejou um turbilhão de preconceitos baseados na concepção da existência de uma imposição de um tal “Consenso de Washigton”. Desconstruiu-se toda influência dos efeitos da liberdade econômica sobre a névoa do “neoliberalismo” combatido sem trégua na Política Brasileira e na academia.
Enquanto o Judas do neoliberalismo era malhado na praça pública a ausência de princípio liberais na ordenança da economia fez com que o Estado Brasileiro entrasse em uma metástase de regulação desordenada tornando o País notoriamente reconhecido como um dos piores ambientes de negócios do mundo.
De tudo que foi dito, qual o sentido atual do deixe passar, deixe fazer, em uma economia onde o tangível e substituído gradualmente por bens intangíveis (dados). A liberdade econômica deve ser protegida apenas nos Portos ou também nas redes de computadores?
Entendo que a ânsia em regulamentar a internet guarda íntima relação com a ânsia que os bolcheviques tinham em 1917 de expropriar os bens de produção. A proposta de um fim da história do socialismo “científico” marxista reacende com a utilização massiva de inteligência artificial no capitalismo chinês, que conjuga a força de um governo de partido único com uma economia de mercado.
Eric Posner em sua obra Mercados Radicais aduz que a impossibilidade do cálculo econômico prevista pela Escola Austríaca de Economia (Mises e Hayek) pode ser um óbice superado pela suplantação do intelecto humano pelo poder computacional (Lei de Moore). Ao colocar a possibilidade do mercado, como instituição organizada, ser substituído por previsões e induções de comportamento produzidos por máquinas.
Logo a ilusão de um fim da história como escrito por Francis Fukuyama com uma hegemonia da economia de mercado em razão do colapso soviético não corresponde a uma perspectiva realista do futuro. A liberdade econômica deve ser defendida até mesmo diante da possibilidade de um futuro distópico onde nossas escolhas (a mão invisível) não serão levadas em consideração pelos algoritmos, que regerá a produção dos bens em sociedade induzindo comportamentos.
Não atentar para esses fatos é trilhar um novo caminho para uma discreta e autoinduzida servidão.