Estima-se que 500 mil imigrantes, a maioria dos quais latina, vivam ilegalmente no estado americano do Arizona. A recente lei de imigração sancionada pela governadora do estado fronteiriço ao México, a qual criminaliza a entrada e a permanência ilegais no território do Arizona, impõe à polícia a obrigação de abordar pessoas que apresentem indícios de não estarem legalmente nos Estados Unidos e chega a autorizar a detenção de um indivíduo com base em simples suspeita, provoca, com razão, perplexidade mundial. Apesar de negativas das autoridades do estado e da promulgação de nova lei que ameniza a severidade do texto original, é evidente o objetivo de erradicar um tipo humano do Arizona, valendo-se de característica comum ao grupo. Em outras palavras, é uma lei racista.
Não foram poucas as vozes que se levantaram nos Estados Unidos contra a lei ? Até o presidente Barack Obama afirmou que a lei ? Solapa as noções básicas de justiça que nós prezamos como americanos? No entanto, pesquisa nacional realizada pelo instituto Gallup revelou que 51% dos americanos aprovam a lei, enquanto apenas 39% opõem-se a ela. Esse quadro provoca outra perplexidade: como podem tantos imigrantes ilegais viverem, sem maiores contratempos, em um país cujo povo majoritariamente preferiria vê-los bem longe? Para responder à pergunta, precisamos compreender a relação entre economia de mercado e discriminação.
A história econômica mundial poderia ser descrita como a história da crescente interdependência entre as incontáveis pessoas que integram e mantêm em funcionamento uma economia de mercado. No mundo atual, e sobretudo nos países de capitalismo mais avançado, como os Estados Unidos, não podemos viver isolados. Precisamos nos alimentar, nos locomover e nos vestir, alugar um imóvel, frequentar escolas e cursos, e, para isso tudo, auferir renda, como empresário ou como empregado. Os milhares de latinos que vivem ilegalmente no Arizona conseguem obter todos esses insumos necessários para se manter vivos. Mas será que contam com a cooperação apenas dos 39% de americanos que apoiam sua presença nos EUA? Não, contam com a cooperação de todos os americanos. Por quê? Porque discriminar implica custos.
Imaginemos que uma empresa receba currículos de duas pessoas para preencher uma vaga. Uma pessoa tem formação mais sólida e mais experiência do que a outra, mas é, digamos, judia. O empresário, antissemita, decide contratar o indivíduo menos capacitado, mas cristão. Um concorrente acaba por contratar o judeu e, passando a operar com maior produtividade, conquista mais clientes e desfruta de lucros mais generosos. O empresário racista simplesmente reduziu, por motivos irracionais, sua oferta de mão de obra e deixou de maximizar o lucro. Discriminar lhe custou caro.
Como também lhe custará se não vender bens e serviços a clientes devido a preconceitos. Os custos provêm não apenas da perda direta de negócios que seriam fechados com as pessoas discriminadas, mas também da reputação negativa que alimentará no seio dos que não aprovam suas políticas e poderão deixar de contratar seus serviços ou consumir seus bens.
Assim, a economia de mercado não oferece meios para a discriminação prosperar. No cálculo racional que os agentes econômicos efetuam a todo momento no mundo moderno, não há espaço para considerações mesquinhas que representem obstáculos ao objetivo de atingir níveis superiores de bem-estar. Diante disso, só resta aos racistas produzir por meio da força do Estado o que a livre interação entre os seres humanos não pode lhes dar: a miséria e o banimento de um grupo indesejado.
Como Ludwig von Mises, um dos mais importantes filósofos e economistas liberais do século 20, afirmou na obra Governo onipotente, analisando o contexto da Alemanha hitlerista, ?muitas décadas de intensa propaganda antissemita não conseguiram impedir os alemães ?arianos? de comprar em lojas de donos judeus, de se consultar com médicos judeus e de ler livros de autores judeus?. E conclui: ?Era necessária uma discriminação legal contra os judeus?.
Enquanto a polícia do Arizona não aplica a nova lei de imigração, os imigrantes ilegais, sobretudo latinos, seguem a vida, contando com a cooperação de todo o povo americano graças à fabulosa engrenagem da economia de mercado.
A opinião expressa neste artigo pertence exclusivamente ao autor e não reflete a posição do Ministério das Relações Exteriores.
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