O lado positivo do cenário de insegurança, incertezas e turbulências que os negócios vivem – aqui e no exterior – é o estímulo a uma discussão mais séria sobre como levar a economia a sair do marasmo. A resposta clássica ao desafio, desde os tempos de Adam Smith, sempre foi uma: austeridade!
Austeridade dos governos no manejo das finanças e das contas públicas, gastos e investimentos; austeridade das empresas no uso de seus haveres, na distribuição de lucros a seus acionistas e aos empregados nos sistemas de participação; austeridade dos sistemas bancários na concessão de empréstimos e nos cuidados com a inadimplência; austeridade nos reajustes salariais e no crédito.
E por que isso?
Porque o comportamento austero, tanto dos governos como das empresas e pessoas físicas, infunde confiança – palavra-chave na atração do investimento, privado principalmente. Como todo investimento embute risco, tanto maior quanto ele é maior, a confiança não só é um grande redutor da aversão aos riscos (moral hazzards) como é promotora de investimentos inovadores.
Mas o mundo testemunhou nos últimos 20 ou 30 anos uma espantosa disseminação do laxismo. Pior, uma adesão ao laxismo pelos governos, principalmente, e, por contágio, pelo setor privado. Laxismo é a “tendência de fugir ao dever e à lei, com base em razões pouco ou mal fundamentadas”. (v. Aurélio).
Atrás de aprovação popular, os governos democráticos mais reconhecidamente austeros do planeta aderiram com grande irresponsabilidade ao laxismo em todas as esferas. Isso deveria, ter provocado um recolhimento do setor privado, por desconfiança. Mas o relaxamento das normas e da segurança chegou também ao setor bancário, ao mercado financeiro e de capitais, em meio a profunda crise de confiança, acompanhada de aumento excessivo da liquidez internacional. A soma da perda de confiança com aumento da liquidez levou ao emprego maciço de capitais não propriamente na produção de bens e no reforço da produtividade, mas na aquisição e fusão de empresas, ou seja, mais capitais entrando no estoque pouco crescente de ativos já existentes. O que valorizava os papéis financeiros: dinheiro aplicado em dinheiro criava mais dinheiro e a ilusão de enriquecimento de amplitude sem par na História. No Brasil, o caso típico foi o de Eike Batista, “um dos homens mais ricos do mundo” – quase só em papel timbrado.
A onda mundial de laxismo desaguou primeiro na famosa crise de 2008, mas não só: motivou a reunião dos “8” em Toronto, onde se decidiu “chega de laxismo”, a ordem agora é “austeridade”. Os governos europeus baixaram o facão nos orçamentos públicos, no crédito, nos reajustes de salários visando a restaurar a confiança e, com isso, atrair investimentos. Mas a violenta reação dos sindicatos e do povo em geral nas sociedades afetadas gerou mais insegurança e assustou os investidores mais do que a situação anterior de relax geral. A austeridade não levou à retomada, mas a mais estagnação.
A indagação que se lê hoje em artigos até de renomados economistas de cepa ortodoxa é por que a austeridade tem produzido efeitos contrários ao que dela se espera e se não seria o caso de um pouco de laxismo para combater a anemia econômica.
No Brasil, houve um curso com sinal trocado: uma equipe de laxistas assumiu o poder com Lula, apostrofando a ortodoxia tucana e seu quartel general, o Banco Central (BC), do Meirelles. Enquanto o mundo tentava reencontrar a austeridade, o governo brasileiro abandonava a pouca que tinha. Já agora, o mundo começa a pensar que um pouco de laxismo não é tão ruim para a economia, e o governo brasileiro se inclina para um pouco mais de austeridade, com o BC tentando voltar à ortodoxia.
Chegaremos aonde?
Os próximos meses dirão.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 18/07/2013
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