*Por André Hemerly Paris/ Líderes do Amanhã
Sem liberdade de pensamento não existe qualquer forma de desenvolvimento humano. A liberdade de pensamento é um pressuposto para o exercício pleno da razão humana, a qual, por sua vez, foi e é o motor de cada descoberta que permitiu o avanço da humanidade.
Sem liberdade de expressão os frutos gerados pelo exercício da razão não podem ser colhidos. É verdade que nem sempre os frutos desse exercício são os mais “brilhantes”, para dizer o mínimo, como é o caso de muitas das manifestações realizadas pelo deputado federal Daniel Silveira.
Contudo, especialmente no âmbito das liberdades de pensamento e de expressão, não existe “meia liberdade”. Ou se tem a liberdade de pensar diferente e expressar opiniões contrárias a de seus pares, ou não se tem.
O preço, extremamente “baixo” quando comparado com os ganhos, que se paga é o inconveniente de, por exemplo, termos que escutar indivíduos proferindo ideias estúpidas, discursos de ódio ou falas preconceituosas.
E, inclusive, é a partir desse “preço” pago que somos capazes de identificar claramente as ideias que não queremos seguir e os indivíduos com os quais podemos escolher não nos relacionar. Só a transparência e liberdade no discurso é capaz de nos permitir isso e, igualmente, a oportunidade de demonstrar o porquê de determinadas ideais serem estúpidas, falaciosas ou contrárias ao que pensamos ser certo.
É extremamente sedutora a possibilidade de silenciar ou retirar do convívio social aqueles que não concordam com a forma como vemos e acreditamos que o mundo deveria ser, especialmente quando classificamos determinadas ideias como “perigosas”.
Mas, uma liberdade de pensamento e de expressão que não seja “voltairiana” (ou “halliana”, já que a célebre frase atribuída a Voltaire foi na verdade por sua biógrafa, Evelyn Beatrice Hall, ao resumir seu pensamento), não pode ser considerada plena. Do mesmo modo, também o exercício da razão humana não pode ser pleno sem tais liberdades.
Pensamentos, ideias e discursos não são capazes de gerar danos quando não acompanhados de uma ação para materializá-los, antes disso são apenas isso: ideias e intenções.
Alguém pode argumentar que a liberdade de expressão pode gerar danos quando materializada em falas ofensivas. Contudo, aqui devemos nos perguntar se uma ofensa é o suficiente para justificar o encarceramento de um indivíduo, além de refletir sobre a frase escrita por Marcus Aurelius há quase dois milênios: “escolha não ser ofendido – e você não se sentirá ofendido. Não se sinta ofendido – e você não terá sido ”.
Nesse ponto, a decisão proferida recentemente pelo STF, que culminou na condenação do Deputado Federal a quase nove anos de prisão, é alarmante pelo caráter autoritário e pela censura à liberdade de expressão a ela inerente (sem falar no caráter inquisitorial de um procedimento julgado inteiramente pelas supostas vítimas dos discursos proferidos por Daniel Silveira).
O perdão individual concedido pelo Presidente através da do instituto da “graça” a Silveira trouxe certo alívio (apesar das dúvidas levantadas sobre sua legalidade) para aqueles preocupados com os avanços totalitários de nosso poder judiciário.
Contudo, é difícil imaginar que tal perdão presidencial teria sido concedido a um adversário político do Presidente que se encontrasse em situação similar. Estamos mais próximos do que gostaríamos das distopias fictícias presentes nas obras “1984”, de Orwell, e “Fahrenheit 451”, de Bradbury.
A cada vez que o Leviatã é alimentado, mais faminto ele se torna. O próximo passo que procede os aplausos que a decisão recebeu de parte da população é uma restrição cada vez maior de nossa liberdade de pensamento e de expressão. O alerta de Heine, feito no século XIX é cada vez mais latente: “Onde se queimam livros, acaba-se queimando pessoas”.