Ao deixar a reforma da Previdência para 2019, o governo Michel Temer só aumentou a lista de problemas fiscais que o próximo presidente precisará de resolver já no primeiro ano de mandato. Além de negociar com o Congresso mudanças no regime de aposentadorias, o vencedor da corrida eleitoral terá pela frente a missão de discutir uma nova regra para o salário mínimo (a atual acaba em 2019), negociar com o funcionalismo mais uma rodada de reajustes salariais e encontrar a solução para um desequilíbrio de cerca de R$ 200 bilhões no Orçamento provocado pelo desenquadramento na regra de ouro. Tudo isso pressionado pela regra do teto de gastos, segundo a qual as despesas públicas só podem crescer com base na inflação do ano anterior.
As decisões de política fiscal tomadas primeiro ano do próximo governo terão impacto sobre 70% do Orçamento e definirão a trajetória das despesas públicas por um ciclo de quatro anos, afirmam especialistas. O pesquisador do Ibre/FGV, Manoel Pires, destaca, por exemplo, que um dos maiores impactos será provocado pela forma de reajuste do salário mínimo. Cada 1% de aumento na remuneração básica dos trabalhadores tem impacto de R$ 3,8 bilhões nas contas públicas.
A atual forma de correção do mínimo – pela qual o salário deve ser reajustado pela inflação do ano anterior mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes – vale até 2019. Essa é uma forma de assegurar que haja ganho real para os trabalhadores. Pires lembra que o governo tem dado aumentos reais para o salário mínimo desde a década de 90. Assim, será muito difícil que a nova regra não mantenha o mesmo princípio.
– Do ponto de vista fiscal, a dificuldade é que o salário mínimo tem impacto tanto nas despesas de aposentadorias quanto nas de benefícios como a Loas. E o governo estará pressionado pelo teto do gasto – destaca Pires, lembrando que a própria regra do teto determina que, se ele for descumprido, o governo é obrigado a adotar uma série de medidas de correção, inclusive ficando impedido de dar aumentos reais ao mínimo.
Corte de despesas para cumprir Teto de gasto
Outro desafio será a negociação salarial com os servidores públicos. O acordo firmado com as categorias se encerra em 2018. Para fechar as contas deste ano, a equipe econômica ainda tenta adiar o reajuste de 2018 para 2019, o que representaria uma economia de R$ 4,4 bilhões. A medida, no entanto, está suspensa por liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda precisa julgar o assunto em plenário.
– As categorias têm pautas próprias e vão pressionar por reajustes. O governo também vai ter que fazer essa negociação com o teto em vista – explica o pesquisador do Ibre.
Em meio a esse cenário, o próximo presidente terá pela frente que definir se vai propor uma reforma da Previdência e em que termos. A não aprovação da reforma em 2018 já vai ter um impacto de R$ 19 bilhões nas despesas de 2019, o que obrigará a equipe econômica a apertar o Orçamento do ano que vem. Mas quanto mais tempo o governo levar para atacar o problema, mais dura será a reforma.
Dados do Ministério do Planejamento mostram que os gastos obrigatórios, incluindo Previdência, pessoal, abono salarial e seguro desemprego já consumirão 90,6% das despesas primárias de 2018. Esse número subirá para 93,6% em 2019 e para 96,4% em 2020. Em 2022, esse percentual vai superar 100%. Isso obrigará o governo a cortar despesas para cumprir o teto de gastos.
O diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto, lembra que existe ainda o problema da regra de ouro. Ela define que as operações de crédito da União não podem ficar acima das despesas de capital (essencialmente investimentos). Seu principal objetivo é impedir que o governo aumente a dívida pública para pagar gastos correntes, como salários e benefícios previdenciários. O problema é que a crise fiscal dos últimos anos derrubou os investimentos e elevou o endividamento, dificultando o cumprimento da norma.
Fonte: “O Globo”