Estamos chegando à etapa final da tramitação da reforma da Previdência. O projeto inicial do governo era bastante ambicioso nos objetivos fiscais (o famoso R$1,2 trilhão) e também na redução da desigualdade previdenciária que pretendia alcançar. O texto que agora vai à votação terá uma “potência” fiscal menor (agora “apenas” R$1 trilhão) e também um menor impacto igualitário. Algumas categorias conseguiram se manter “mais iguais” que as outras, contrariando a expectativa geral de redução mais significativa dos diferenciais entre aposentados e pensionistas. De qualquer forma, devemos todos comemorar a profundidade do texto e os impactos que provocará. Menores dos que os que pretendíamos, mas certamente os maiores que conseguimos até hoje.
Durante a tramitação na Comissão Especial, repetiu-se o enredo observado nas tentativas anteriores de reformar a Previdência. Grupos organizados fizeram pressão sobre os parlamentares para defender seus interesses, mesmo que contrários aos da maioria. Professores defendendo idade mínima menor e policiais federais lutando por idade mínima reduzida e por benefícios generosos foram os exemplos mais visíveis. Como avaliar a ação de grupos de funcionários públicos que se organizam para influenciar as decisões do Parlamento?
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Evidentemente, trata-se de grupos minoritários pretendendo impor seus interesses aos da maioria. Sob essa ótica, a ação deveria ser combatida por ser intrinsecamente antidemocrática. Essa é uma avaliação. Será a única? Será a correta?
O processo político é uma sucessão contínua de conflitos de interesses e nenhum grupo é proibido de se organizar e defender os seus. Sob essa ótica, a mobilização de professores, policiais e outros grupos é perfeitamente legítima e democrática. E só conseguem impor seus interesses minoritários quando a maioria não é capaz de se organizar e se defender. Em vez de condenar a mobilização das minorias corporativas, a sociedade precisa aprender a manifestar, defender e fazer prevalecer os interesses majoritários. Temos de construir um jogo de lobbies menos desigual.
Fonte: “Estadão”, 05/07/2019