A presidente Dilma Rousseff começa o terceiro ano de mandato sem Orçamento aprovado, com a economia emperrada e a inflação ainda longe de 4,5%, meta muito mais alta que a de outros países bem mais dinâmicos. O cenário mundial continua ruim, com a Europa estagnada e a recuperação americana em perigo, mas o governo brasileiro, se tiver juízo, deverá abandonar a ilusão dos últimos dois anos: será inútil confiar no mercado interno como fator de crescimento, se a indústria permanecer incapaz de responder à demanda dos consumidores. Os grandes beneficiários do estímulo serão mais uma vez os produtores estrangeiros, além de alguns setores sempre favorecidos pelas autoridades.
O governo encerrou 2012 com promessas de tempos melhores, mas sem formular, pelo menos em público, sequer um bom propósito de ano-novo. Ao contrário: aceitou sem espernear a decisão dos parlamentares de jogar para fevereiro a votação do Orçamento. O adiamento, disse a presidente, foi decidido com a concordância do governo. A história é um tanto intrigante, porque o atraso impediria o governo de investir. A solução encontrada foi a edição da Medida Provisória n° 598. Objetivo: liberar R$ 42,5 bilhões para investimentos desde o início do ano.
Os artigos 62 e 167 da Constituição proíbem a edição de medidas provisórias (MPs) sobre matéria relativa a planos plurianuais, orçamentos e abertura de créditos extraordinários, exceto para “atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública”. Qual dessas condições é aplicável ao caso, especialmente depois de ter o governo concordado com o adiamento da votação?
Essa MP é prenúncio de mais um ano de política econômica voluntarista, conduzida a partir do Palácio do Planalto. Só os freqüentadores do gabinete podem dizer como são dadas as ordens, mas os resultados são inequívocos. O investimento encolheu, a produção industrial diminuiu e os estímulos mal dirigidos foram um fracasso. Ao mesmo tempo, ajuste cambial e mais barreiras foram insuficientes para impedir a piora do saldo comercial. Longe de ser um luxo, um amplo superávit na conta de mercadorias é essencial para o Brasil, por causa do déficit estrutural da balança de serviços.
Para o novo ano o Banco Central (BC) projeta um superávit comercial de US$ 17 bilhões, inferior ao de 2012. Estima-se exportação de US$ 268 bilhões, com crescimento de apenas 4,7% em dois anos (sim, dois anos). As projeções do mercado financeiro são mais magras, com o saldo comercial estimado na vizinhança de US$ 15 bilhões. Se houver alguma recuperação do comércio global, em 2013, deverá ser muito lenta. A Organização Mundial do Comércio divulgou, recentemente, uma projeção de 4,5%, mas até esse número pode ser muito otimista, segundo técnicos da área.
Para os brasileiros os motivos de preocupação vão muito além dessas estimativas. No trimestre final de 2012 a presidente Dilma Rousseff acrescentou a palavra “competitividade” a seus pronunciamentos habituais. Esse reforço vocabular foi usado na apresentação dos novos planos de logística.
Esses planos incluem um novo convite ao setor privado para investir em rodovias, ferrovias, portos e aeroportos idéia incorporada pelo governo depois de muita resistência. Os investimentos só sairão, naturalmente, se houver realismo nas condições de concessão e de parceria.
Parte importante dos projetos nas áreas de transporte e energia ainda depende, no entanto, diretamente do governo e de suas empresas. De janeiro a novembro o Tesouro investiu 22,8% mais que no ano anterior, segundo a última demonstração de contas do governo central. Mas o valor desembolsado continua inferior a 60% da provisão orçamentária, inclui financiamentos imobiliários e corresponde, em boa parte, a restos a pagar. Além disso, a qualidade dos projetos e de sua execução é muito baixa. Sobra voluntarismo e falta competência na estratégia e na gestão de projetos. Não basta recorrer a truques para liberar R$ 42,5 bilhões, quando o governo é incapaz de usar bem os recursos, nem oferecer benefícios fiscais temporários e localizados, se o sistema tributário ainda onera o investimento, a produção e a exportação. Quanto aos juros, continuarão reduzidos se a inflação permanecer longe da meta?
Fonte: O Estado de S. Paulo, 02/02/2013
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