Na semana passada, tratei do manifesto assinado por diversos economistas heterodoxos, com críticas a um ajustamento econômico mais profundo no segundo mandato de Dilma. O texto do manifesto pode ser encontrado em http://brasildebate.com.br/economistas-pelo-desenvolvimento-e-pela-inclusao-social/.
O manifesto defende a continuidade da política econômica adotada a partir de 2009 e com mais intensidade a partir de 2011.
Trata-se de um conjunto de medidas, que ficou conhecido por nova matriz econômica, na expressão cunhada pelo ministro da Fazenda, que representa forte virada heterodoxa em relação ao regime de política econômica do período de Malan e Palocci, também chamado de “Malocci”.
Entre tantas medidas do pacote de heterodoxias do atual regime de política econômica, podem ser mencionados:
a) o controle direto dos preços e a maior leniência com a inflação; b) a tentativa de reduzir na marra os juros; c) a perda de transparência na política fiscal, além da forte piora das contas públicas; d) o excesso de intervencionismo nas políticas de desenvolvimento setorial (política de conteúdo nacional e alteração do marco regulatório do petróleo, entre outras) e de concessão de crédito subsidiado (hipertrofia do BNDES); e) desonerações de impostos tópicas, segundo lógica muito pouco transparente; etc. A lista é longa.
Evidentemente discordo integralmente dos termos do manifesto. Devo ser mais um dos “porta-vozes do mercado financeiro”, que é como o documento se refere a quem pensa diferente deles. Um dos erros mais crassos do manifesto é comparar a situação econômica que vivemos com a dos países centrais, principalmente a União Europeia e o Japão e em menor medida os Estados Unidos.
As economias centrais experimentam elevadas taxas de desemprego, risco deflacionário, juros nominais nulos e superávit externo.
No nosso caso temos baixo desemprego, inflação no teto da meta, juros nominais de 11,25% ao ano e subindo e deficit externo a caminho de 4% do PIB. O baixo crescimento, diferentemente do caso europeu ou do japonês, não resulta da carência de demanda, mas sim do baixo crescimento da produtividade. Trata-se de problema de oferta, e não de demanda.
Na semana passada, a ministra da Cultura e ex-prefeita de São Paulo pelo PT, Marta Suplicy, entregou sua carta de demissão.
Carta de oito parágrafos, no sétimo lê-se: “Todos nós, brasileiros, desejamos, neste momento, que a senhora seja iluminada ao escolher sua nova equipe de trabalho, a começar por uma equipe econômica independente, experiente e comprovada, que resgate a confiança e a credibilidade ao seu governo e que, acima de tudo, esteja comprometida com uma nova agenda de estabilidade e crescimento para o nosso país. Isso é o que hoje o Brasil, ansiosamente, aguarda e espera”.
Há claramente na carta da ministra demissionária uma crítica ao atual regime de política econômica e um pedido para que se retorne ao regime de política econômica do período “Malocci”. Meu entendimento é que a ministra ecoa crítica maior do partido, e principalmente dos políticos do partido, à alteração do regime de política econômica que houve em 2009.
Os políticos, animais pragmáticos que são, incluindo Lula, já perceberam há tempos que a nova matriz econômica deu com os burros n’água. A defesa da nova matriz é tarefa unicamente ideológica das pessoas que, por formação, creem que esse pacote de política econômica está correto e que todos os problemas que temos tido resultam da crise internacional.
A temperatura deve estar quente nas hostes petistas. De um lado, os políticos profissionais, liderados por Lula, demandando uma virada pragmática na política econômica -de preferência que a presidente terceirize a política econômica para um novo Palocci.
Enquanto isso, economistas ideológicos, incluindo a presidente e o atual ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, defendem o legado da nova matriz. É esse o sentido da escolha do novo ministro da Fazenda. O nome sinalizará se haverá ou não uma virada liberal na política econômica.
Fonte: Folha de S.Paulo, 16/11/2014.
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