Não há dúvidas de que o Brasil tem sérias dificuldades no que se refere à sua capacidade de crescimento sustentável. Passamos, é verdade, por um período de desenvolvimento mais acelerado entre 2004 e 2011, quando o ritmo médio de expansão chegou a quase 4,5% ao ano, correspondente a aumento de 3,3% ao ano da renda per capita, mas há bons motivos para crer que naquele momento crescíamos mais do que nosso potencial.
Com efeito, a taxa de desemprego, que beirava 11% da força de trabalho em 2003, caiu para 7,5% no começo de 2012, o que só é possível quando o produto se expande além da taxa sustentável no longo prazo.
Obviamente isso não é um problema se o desemprego inicial é (como era) elevado, já que permite incorporar trabalhadores originalmente às margens do processo produtivo, fator, aliás, que foi o principal responsável pela melhora da distribuição de renda no período.
No entanto, mesmo duradouros, tais episódios acabam encontrando seus limites, como observado entre 2011 e 2014, quando, apesar dos estímulos à demanda associados à agora órfã Nova Matriz, o produto cresceu a um ritmo bem mais modesto (1,7% anual), correspondente a menos de 1% ao ano de expansão da renda per capita. Uma vez esgotada a capacidade ociosa, representada principalmente (mas não só) pelo desemprego, o crescimento passa a depender de fatores como a qualificação da mão de obra e a melhora da produtividade.
Não há motivo (nem espaço) aqui para repetir o excelente artigo de Alexandre Scheinkman e Marcos Lisboa publicado sobre isso no domingo (18) nas páginas da “Ilustríssima”, que recomendo enfaticamente. Os autores mapearam de forma detalhada os fatores que nos impedem de crescer de forma mais acelerada no longo prazo, essencialmente ligados a restrições do lado da oferta da economia.
À luz disso, alguém poderia concluir que o pacote da semana passada –ao atacar, ainda que timidamente, algumas destas restrições– teria efeitos sobre o crescimento. Não é minha opinião.
Não se trata, é bom deixar claro, de medidas equivocadas (com exceção de mais uma tentativa de fazer com que o BNDES reative a economia). Ao contrário, individualmente a maior parte delas faz sentido, ao facilitar transações (até mesmo o pagamento de impostos, atividade incrivelmente custosa no país), mas há ao menos dois problemas.
O primeiro é que as medidas não parecem conversar entre si. Fica a impressão de que, premido pela fraqueza da atividade econômica, por um lado, e pela Lava Jato, por outro, o governo divulgou um conjunto pouco concatenado de propostas para responder às críticas de foco excessivo na questão fiscal.
O outro é que, na atual conjuntura, com o desemprego elevado e capacidade ociosa de sobra (fatores que têm contribuído para trazer a inflação para baixo), a expansão do produto não está restrita pelos gargalos de oferta. Em outras palavras, hoje (e friso o “hoje”), a retomada não depende de elevarmos nosso potencial.
Nada contra, mesmo porque, quando a retomada vier, a questão da sustentabilidade retornará, mas esta só virá na esteira da redução de juros, que já começou e será tão mais intensa quanto maior o sucesso da reforma fiscal. Há uma saída, mas é estreita e exige, mais que nunca, perseverança no esforço de conserto das contas públicas.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 21 de dezembro de 2016.
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