A crise dos sistemas democráticos contemporâneos é o reflexo das insuficiências da política frente aos desafios da realidade. O diagnóstico é claro: sistemas estáticos de poder são absolutamente incompatíveis com a fluidez das modernas relações sociais. Vivemos uma época de equilíbrio dinâmico, cuja lógica é como o andar de bicicleta: a estabilidade está no movimento. Ou seja, os velhos instrumentos da política não mais dispõem de condições de gerir a democracia, sendo imperativo o surgir de um sistema inovador de poder.
Objetivamente, a nova ordem global é muito mais complexa que as formulações binárias do passado, pressupondo inteligência exponencial de análise e criatividade geométrica no procedimento. Chega de mais do mesmo. Não adianta insistir com fórmulas ultrapassadas. O presente exige novas respostas, pois futuro não quer repetir os erros do passado.
No teatro da existência, a vida ganhou velocidade, enquanto a política ficou parada no tempo. O descompasso é evidente e incontornável. As crescentes pulsões sociais revelam, com nitidez, que os governos estabelecidos perderam a capacidade de bem gerir as complexidades da sociedade atual. Sem cortinas, a inteligência governamental perdeu a capacidade de se antecipar aos fatos, tornando-se refém dos acontecimentos.
Leia mais
Claudia Costin: Uma agenda para o país
Paulo Roberto de Almeira: Crônicas dos eventos correntes sobre as coisas do Brasil
Acontece que, como bem pontua Henry Kissinger, a política requer a “habilidade de projetar além do conhecido”; trata-se do problema da conjuntura e a arte interpretativa de contextos justapostos. Aqui, não há solução fácil, pois toda decisão estratégia traz consigo uma variável de incerteza. Todavia, sempre haverá um elemento de escolha que determinará o sucesso ou insucesso dos atos de poder.
Entre o fim do que se foi e a construção do que será, temos o hiato do possível. Nesse ponto, a memória faz lembrar a cintilante advertência de Tony Judt, no sentido de que “melhoramentos imperfeitos em circunstâncias insatisfatórias” representam aquilo que devemos esperar da realidade factível. O pragmatismo do notável historiador britânico revela que a política não é um campo de perfeições metafísicas, mas só – e somente só – um espaço disponível ao talento humano que, entre falhas e acertos, deve tentar contribuir ao máximo para o aperfeiçoamento civilizatório.
+ de Sebastião Ventura: A distribuição paritária do Fundo Eleitoral
Estamos diante de um mundo desconhecido. A fronteira tecnológica imporá radicais mudanças conceituais em nossas vidas. No apagar das luzes da política tradicional, o protagonismo democrático caberá a todos – pessoas físicas e jurídicas – capazes de auxiliar os governos com novas abordagens, perspectivas e atitudes. Talvez estejamos a adentrar na fase mais democrática da história humana, embora os riscos de retrocessos totalitários não sejam desprezíveis. Quem viver verá.