Excesso de vagas e ausência de mão de obra qualificada. Esta é a realidade do mercado de tecnologia no Brasil. De acordo com pesquisa da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) para atingir a meta de dobrar o setor de software e serviços em seis anos, 70 mil profissionais serão demandados ao ano até 2024.
Porém, há um forte descasamento entre oferta e demanda: o país forma 46 mil pessoas com perfil tecnológico por ano. Ou seja, um déficit de 24 mil especialistas anualmente. As áreas que mais contratam são desenvolvimento de software, ciência de dados e engenharia de dados.
— Há várias vagas abertas para estes profissionais, mas não encontramos desempregados. Ou seja, há mais vagas abertas do que candidatos disponíveis, o que nos leva a conclusão que as universidades brasileiras, os cursos tecnológicos e técnicos não são capazes de suprir a demanda atual existente —afirma Marcos Chiodi, diretor executivo da Monitora, fábrica de software personalizado.
Na empresa, até o final do ano serão abertas 60 novas posições de trabalho relacionadas nos setores de desenvolvimento de software, inteligência artificial, big data e design de serviços UI/UX.
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Para quem consegue contratar, o desafio é reter o talento. Andressa Karen, gerente de Talent Acquisition Tech da Stone Pagamentos, salienta que o especialista em TI é assediado a todo momento pelo mercado. A empresa de máquina de pagamentos tem a meta de contratar 850 pessoas em todo território nacional, somente em tech.
— A investida é tanto de empresas daqui do país quanto de fora (sendo mais comum de Portugal e Alemanha) —salienta ela.
O fenômeno da ausência de mão de obra em tecnologia não é exclusivo no Brasil. Segundo a IDC, consultoria mundial para os mercados de tecnologia, o mercado de TI, globalmente, terá déficit de 570 mil profissionais este ano.
Além de Portugal e Alemanha, Chiodi adiciona que países como Canadá, Reino Unido e Irlanda também fazem uma investida muito forte nos trabalhadores brasileiros da área.
—Recrutadores estrangeiros vêm até o nosso país ou selecionam através das redes sociais especializadas e conseguem atrair para vários países europeus e para a América do Norte — relata ele.
Graduação é ou não necessária?
A faculdade é essencial ou um curso técnico é suficiente para ter sucesso na área? Marianna Ford, gerente comercial da Elumini,consultoria de recrutamento de profissionais de TI, não percebe diferenças no diploma de graduação em termos de performance ou qualidades nas entregas.
— As grandes empresas tradicionais exigem essa formação. Outras, com uma cultura mais flexível, não fazem essa exigência e, da mesma forma, têm um bom resultado — explica ela.
Diego Barbosa, headhunter da Yoctoo, consultoria de recrutamento e seleção para tecnologia concorda.
— A gente vê cada vez mais profissionais de diferentes graduações migrando para posições nas áreas de tecnologia e digital. Então, a graduação não é mais um fator essencial, mas algo que pode facilitar a entrada em algumas empresas. Existe esse movimento das companhias valorizando cada vez mais o conhecimento aplicado e cada vez menos a graduação . No processo de seleção, em vez de pedir um certificado, elas podem solicitar para que o candidato realize um teste ou um case técnico para validar aquele conhecimento, por exemplo —cita ele.
Na opinião de Leonardo Filardi, diretor executivo da 42|RIO, escola que ensina programação gratuitamente da Fábrica de Startups, dependendo da área, um técnico pode ter bastante destaque.
— No Brasil, temos um apagão de profissionais de nível técnico, uma vez que por anos fomos estimulados a fazer uma universidade, um, dois e três MBA’s. E isso fez com eles sejam escassos. Para trabalhar em TI, existem diversas alternativas de formação, sem a exigência de currículo — afirma ele, que exemplifica:
— A linguagem do futuro é a programação. O verbo “codar”(que vem do inglês coding, ou programar) é cada vez mais comum. Hoje, um programador ou desenvolvedor é avaliado mais pela sua habilidade de “codar” do que as formações que ele tem — reforça ele.
Outra questão apontada para a escassez de mão de obra é a ausência de fluência em inglês. Filardi considera que a discussão sobre esta deficiência é antiga. Como há a necessidade de trocar informações com clientes e fornecedores de outros países, saber se comunicar nesta segunda língua é requisito básico.
— Tivemos uma experiência com uma empresa que disse que só contrata desenvolvedores com inglês fluente, uma vez que 95% do tempo ele irá lidar com pessoas ao redor do mundo — lembra Leonardo Filardi, da 42|RIO.
O especialista nesta área tem que ter este conhecimento na língua inglesa, mas a oferta de vagas é tão grande que, muitas vezes, é necessário contratar o candidato que não tem essa habilidade, diz Chiodi, diretor executivo da Monitora. Para isso, a empresa oferece treinamentos e incentivos ao aprendizado da língua.
— Motivamos internamente o aprendizado da língua. Todo mundo tem acesso a aulas de inglês de graça: temos duas a três turmas de inglês, de níveis diferentes, rodando dentro da empresa para que todos os profissionais tenham sua proficiência aumentada para assim chegar à fluência — diz ele.
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Ausência de diversidade no mercado de trabalho
O estudo da Brasscom mostra que a tecnologia de informação e comunicação no Brasil é masculina e branca. Em 2018, 59% dos trabalhadores do setor eram brancos e asiáticos, sendo 22% mulheres e 37% homens. No mesmo ano, 30% eram trabalhadores negros, pardos ou indígenas, sendo 11% mulheres e 19% homens.
“Considerando que a população nacional é majoritariamente feminina e negra, estes números demonstram a desproporção de acesso ao mercado de trabalho por este grupo”, diz o levantamento.
Marianna Ford, gerente da Elumini, salienta que é difícil encontrar desenvolvedoras.
— Esse é um nicho muito masculino, pela crença no mito de que as mulheres não sejam tão boas em matemática, o que é uma bobagem. Já no perfil de gerente de projetos ou de analistas de testes de software, a gente encontra muitas profissionais do sexo feminino. Talvez por outro mito: de que as mulheres tenham uma visão mais holística dos cenários — salienta ela.
Fonte: “O Globo”