Diante da necessidade de adaptar o censo de 2020 às restrições financeiras do país, a nova direção do IBGE está em conversas iniciais com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para uma assistência técnica no censo de 2020, que visa potencializar o trabalho da equipe do IBGE, de qualidade reconhecida internacionalmente.
Tentando fazer do limão uma limonada, a presidente do IBGE, economista Susana Cordeiro Guerra, pretende aproveitar a oportunidade para fazer a transição do censo tradicional para um modelo de Censo Misto, cada vez mais utilizado no mundo, devido a avanços tecnológicos e melhora em registros administrativos.
O Censo Misto coleta as informações básicas através da operação tradicional, e as complementa com outras pesquisas e registros administrativos. A direção do IBGE garante que não haverá perda de informação, pois há outros meios de conseguir a mesma informação ao longo do tempo, através da otimização de pesquisas existentes e avanços tecnológicos.
Isso envolve dar mais potência às pesquisas do IBGE já existentes, como a Pesquisa Nacional por Domicílio (PNAD), usando tecnologia e ferramentas para se buscar a mesma informação de forma mais eficiente, melhorar a qualidade, acesso e integração de registros administrativos, e em certas áreas, desenvolver suplementos para se coletar esses dados com uma amostra menor.
Leia mais de Merval Pereira
A importância política do Censo
O centro se arma
Luta pela imagem
Já há o convencimento dos técnicos do IBGE de que o questionário precisa ser simplificado. O IBGE faz muitas pesquisas amostrais ao longo das décadas, e elas poderiam ser utilizadas. Nossos registros administrativos ainda são falhos, mas estão melhorando. Temos um censo escolar todo ano, por que precisamos voltar ao assunto no censo geral?
Por que precisamos ter informações de fluxo no Censo, taxa de desemprego no Censo? Um bloco imenso de imigração internacional?, perguntam os técnicos como Ricardo Paes de Barros, que está dando uma consultoria pro-bono para o censo, e Sérgio Besserman, ex-presidente do IBGE. A ideia central é que variáveis não-estruturais que se modificam no curto prazo, relacionadas, por exemplo, ao mercado de trabalho, ao emprego e desemprego, às características de consumo da população, não deveriam ser levantadas a cada dez anos no Censo Demográfico.
Tais variáveis são de natureza dinâmica e os dados decenais deixam de ser úteis e de bem representar a realidade, perdendo a validade muito rapidamente. Tais quesitos seriam melhor investigados em pesquisas de menor periodicidade, por amostragem.
Uma pesquisa amostral como a PNAD Contínua, que fornece informações mensais, trimestrais, anuais ou periódicas para temas especiais, se potencializada, passando por aperfeiçoamento do desenho e dos métodos amostrais, poderia ser muito mais útil nesses casos, para a tomada de decisão mais dinâmica, com base em evidências atualizadas, mesmo que realizada com amostras menores.
Em um extremo, a Dinamarca, há quatro décadas, realiza o recenseamento de sua população com base em registros. Neste formato, não há coleta direta de dados da população, e a enumeração tradicional é substituída pela utilização de dados administrativos, o que permite a produção de dados censitários a um custo bastante reduzido e com força de trabalho significativamente menor.
Desde 1990, vários outros países pertencentes à UNECE, órgão econômico das Nações Unidas que engloba países da Europa, América do Norte, Ásia Central, além de Turquia e Israel, vêm ampliando a qualidade de seus registros, que passam a ser usados para a condução dos Censos, mesmo que, inicialmente, adotando um modelo combinado de transição.
No censo de 2000, apenas três países pertencentes à UNECE realizaram um Censo baseado em registros administrativos e outros cinco adotaram o Censo de transição. Nesta ocasião, o Censo tradicional ainda era a abordagem mais popular, adotada por 40 países.
Já na rodada de 2010, houve um aumento significativo do número de países que conduziram a operação com base em registros (nove países) ou fizeram o censo combinado (dez países), sendo expressiva a diminuição no número de países da UNECE que realizaram o Censo tradicional (34 países).
Com base em informações preliminares sobre o planejamento para a próxima rodada de 2020, a tendência é que, dos 48 países da UNECE, 14 realizem o Censo com base exclusivamente em registros administrativos (29%), 12 países adotem o modelo de transição (25%) e apenas 22 ainda façam o Censo tradicional (46%).
Fonte: “O Globo”, 02/05/2019