A possibilidade de mandar para a cadeia um réu condenado em segunda instância, aprovada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal no ano passado, é uma das questões fundamentais da disputa político-jurídica que se trava no momento em que a Operação Lava-Jato está sob ataque.
Na quarta-feira dia 23, o juiz Sergio Moro mandou prender dois condenados que perderam recursos no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o tribunal de apelação que pode revisar ou confirmar sentenças da Primeira Instância de Curitiba. O TRF-4, aliás, tem decidido mandar prender os réus em todas as ações em que confirma a condenação da primeira instância.
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Na mesma semana, o ministro Gilmar Mendes mandou soltar uma pessoa que estava com recurso no STJ, condenada em segunda instância. O ministro Gilmar Mendes foi um dos votos a favor da possibilidade de prender o réu condenado em segunda instância — a decisão foi de 6 a 5 —, mas hoje declara-se contrário à medida, adotando a tese do ministro Dias Toffoli, que votou pela prisão somente após recurso ao STJ. Sergio Moro criticou a decisão de Gilmar Mendes e disse não acreditar que o Supremo altere sua decisão.
A prisão em segunda instância era a jurisprudência do Supremo até 2009, quando o tribunal julgou um habeas corpus e, liderado pelo então ministro Eros Grau, a maioria dos ministros decidiu que a Constituição não autorizava a execução da pena antes do trânsito em julgado do processo.
Assim votaram os ministros Eros Grau (aposentado), Celso de Mello, Cezar Peluso (aposentado), Carlos Ayres Britto (aposentado), Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio. Votaram a favor da execução provisória os ministros Menezes Direito (falecido), Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa (aposentado) e Ellen Gracie (aposentada).
Com a mudança na composição e a revisão de voto do ministro Gilmar Mendes, a maioria no plenário votou pela reversão da jurisprudência. Agora, novamente, Gilmar mudará de posição e pode alterar outra vez a jurisprudência se a ministra Rosa Weber mantiver seu entendimento de que o que vale é a posição de 2009.
Mendes alega que a permissão para prender passou a ser “prisão sistemática” quando a decisão do Supremo Tribunal Federal foi de que a prisão no segundo grau estava condicionada à avaliação de cada caso. “Não é obrigatório. Mas virou regra geral”.
A lógica jurídica da prisão em segunda instância é que, a partir da condenação em segunda instância, não é possível mais rever provas. Os recursos que restam são de questões jurídicas como a dosimetria da pena ou a prescrição. Não há mais possibilidade de o réu ser absolvido e, portanto, é cabível a prisão imediata.
Esse debate políticojurídico tem como pano de fundo a crítica ao que o ministro Gilmar Mendes chama de “prisões preventivas alongadas”. A presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, já disse que não há previsão para colocar novamente a questão em votação, mas essa revisão de jurisprudência já está ocorrendo na prática nas Turmas do STF, conforme ressaltou o ministro Gilmar Mendes ao blog de Josias de Souza.
Na Segunda Turma, composta pelos ministros Edson Fachin, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, o presidente Fachin perde por 4 a 1. Na Segunda Turma, dos ministros Marco Aurélio, Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, ainda não há, na prática, uma definição.
A ministra Rosa Weber votou contra a prisão em segunda instância, na única vez em que se pronunciou, para manter a jurisprudência anterior, alegando que a mudança de composição não deve mudar o entendimento da Corte. O ministro Alexandre de Moraes, que entrou na vaga aberta com a morte de Teori Zavascki, embora tenha dito, antes de ser empossado, que era a favor da prisão em segunda instância, como seu antecessor, ainda não teve a oportunidade de explicitar sua posição na prática.
“O Globo”, 31/08/2017
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