Metas para o governo
Em grandes empresas do setor privado, é comum os gestores receberem metas de desempenho e serem continuamente cobrados pelos resultados do seu trabalho à luz dessas metas. Em vários casos, funcionários recebem bônus por desempenho. Se a empresa vai mal, os gestores devem prestar contas e podem, no limite, até perder seu emprego. Estudos têm indicado que a adoção dessas práticas responde por cerca de 25% das diferenças de produtividade entre empresas.
E no setor público, o que acontece quando o desempenho está aquém do desejado? Com algumas meritórias exceções, nada. Os cidadãos podem espernear, ir às ruas, depositar o voto em candidates que falsamente prometem mudança, mas no fim tudo fica como está, ou até pior. Políticos, que em tese deveriam seguir os anseios dos seus eleitores, pouco se interessam em cobrar por resultados e muitas vezes são apoiados por grupos que querem manter o status quo. Quando no governo, ficam mais preocupados em acomodar aliados na máquina pública do que em pressionar por mudanças efetivas. Críticos da avaliação dos gestores públicos dizem que tudo isso é tentativa de impor uma lógica “do mercado” para ditar a operação do Estado. É inegável que o funcionalismo público precisa de certa estabilidade para não se sujeitar a pressões casuísticas vindas com trocas de governo ou grupos organizados.
Mas essa estabilidade não pode vir à custa da falta de prestação de contas. Poucos sabem, mas a própria Constituição Federal já prevê esse tipo de avaliação. De acordo com o artigo 41 da Constituição, o funcionário público poderá perder o cargo “mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa”.
O problema é que essa lei complementar ainda não foi regulamentada, apesar Poucos sabem, mas a Constituição prevê avaliar o desempenho do servidor público de algumas tentativas em tramitação. E isso tem servido de pretexto para deixar tudo como está.
É preciso, com máxima urgência, preencher esse vácuo legal. Em um artigo em conjunto com meus colegas do Insper Fernando Schüler e Sandro Cabral, sugerimos uma “Lei de Responsabilidade Gerencial”. A primeira medida é limitar novas contratações até que cada esfera da federação implante mecanismos de avaliação. Após estabelecer metas gerais para as áreas (por exemplo, resultados dos alunos em teste ou indicadores de criminaldade), desdobram-se essas metas para cada subárea do governo e individualmente para cada funcionário. Quem tiver desempenho avaliado como insuficiente deverá estabelecer um piano individual de desenvolvimento, com ações de melhoria claramente definidas, dentro de certo prazo. Para evitar injustiças, eventuais propostas de desligamento por insuficiência de desempenho devem ser sujeitas a processo administrativo com direito a defesa. E todo o processo deve ser acompanhado por unidades independentes do governo e comitês externos de cobrança com amplo acesso a dados e relatórios sobre resultados versus metas. Governantes que não sigam esses procedimentos deverão sofrer sanções, no mesmo espirito da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Alguns podem dizer que o problema do setor público não está na falta de metas e gestão, mas sim na falta de recursos para alcançar os objetivos almejados. O remédio normalmente vem na forma de recomendações para aumentar salários e gastos. Eis então uma proposta: qualquer tentativa de aumentar o orçamento de determinadas áreas deve ser necessariamente condicional a metas claras de desempenho, havendo plena responsabilização dos gestores caso os resultados não sejam atingidos. Existem ótimos servidores decepcionados por não conseguirem fazer um bom trabalho, não apenas por falta de recursos mas principalmente pela falta de engajamento. Esses não têm nada a temer e certamente não deverão se opor a iniciativas que busquem maior prestação de contas e alinhamento rumo a serviços de maior qualidade. O mesmo deveriam fazer politicos cujos eleitores já há bastante tempo se cansaram de um Estado que custa muito mas entrega muito aquém do que lhes é prometido.
Fonte: Veja, 26/09/2016.
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