Por Michael Mohallem*
A liminar concedida em favor de Lula esvaziou a expectativa que havia sobre o julgamento dos embargos, na segunda feira, mas sinalizou que a tese sobre antecipação da prisão será debatida pelo plenário do Supremo.
A decisão surpreendeu. Em geral, pedidos de habeas corpus são simples do ponto de vista do direito. Caso os ministros julgassem existente a ameaça à liberdade de locomoção por alguma ilegalidade, poderiam conceder o HC preventivo. Se entendessem que não havia risco concreto iminente, como foi o caso da 5ª turma do STJ, poderiam denegar o HC. Portanto, mesmo com o alongamento da discussão das questões preliminares, seria pouco provável que o mérito de um HC se arrastasse por muitas horas. O regimento do STF, inclusive, determina que se deva finalizar a análise do HC em pauta mesmo que a sessão avance na noite.
O caso de Lula, entretanto, é revestido de expectativas que extrapolam a sua liberdade. O adiamento atípico para casos assim se explica pela verdadeira agenda que acompanha o HC pautado, que é a interpretação sobre se a constituição admite a execução da pena de prisão imediatamente após a decisão de segunda instância, antes do trânsito em julgado. Essa sim é uma longa discussão.
+ Conheça as “Novas medidas contra a corrupção”
A grande dúvida que antecedia ao julgamento — e que permanecerá até o dia 4 de abril — era se os ministros conseguiriam pautar a rediscussão da tese sobre a prisão antecipada de forma que valesse para todos os casos de modo vinculante, e não apenas para Lula. O caminho processual ideal para que os efeitos da decisão sejam para todos os tribunais e condicionem casos futuros são as Ações Diretas de Constitucionalidade. O habeas corpus, tipicamente, serve para solucionar a dificuldade de quem o apresenta.
Como o Supremo é, ao mesmo tempo, um tribunal constitucional — e como tal responsável por analisar dúvidas constitucionais capazes de ordenar todo o sistema — e um tribunal recursal — responsável, em última instância, por recursos e ações de habeas corpus de quaisquer indivíduos —, a via processual escolhida pelos ministros dirá qual dos dois tribunais está com a palavra.
Mas não é apenas a dúvida sobre qual tribunal falará após o feriado. Por se tratar de provável maioria apertada, especula-se que a ausência de um dos ministros no dia da nova sessão possa impactar o resultado. Ausente um dos ministros, se houver empate no julgamento de habeas corpus, prevalece a decisão mais favorável ao réu. Mas se a decisão for de natureza constitucional, o desempate cabe à presidente, cuja posição já se conhece.
*Michael Mohallem é professor da FGV Direito Rio
Fonte: “O Globo”