Em seu livro “Good Economics for Hard Times”, os professores do MIT Abhijit Banerjee e Esther Duflo, laureados com o Prêmio Nobel de Economia de 2019, destacam que as opiniões sobre migrações não são, em geral, confirmadas pelos números. A presunção de que migrantes deprimam os salários e a oferta de empregos não coincide com a realidade na maior parte dos países, mas infelizmente servem a propósitos eleitorais, em tempos de polarização.
É muito fácil, em meio a crises, colocar o imigrante ou o migrante interno como o “outro”, o principal culpado dos males que nos afligem.
Assim, em países multiétnicos, chineses, rohingyas ou mexicanos têm sido apresentados como os que trouxeram a Covid-19 para seu interior e não faltaram manifestações que ligaram a doença ao eterno bode expiatório, os judeus.
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Essas narrativas se associam a teorias conspiratórias variadas que circulam por redes sociais num contexto em que a imprensa —e a ciência— são vistas com desconfiança.
Assim, já existem histórias em grupos de WhatsApp afirmando que os principais protagonistas da doença no Brasil seriam os venezuelanos que, além de tirar empregos e onerar os cofres do poder público, estariam trazendo a Covid-19 para dentro dos nossos lares.
Uma primeira questão que me ocorre ao ouvir tais narrativas é um ponto corretamente levantado por Banerjee e Duflo: pelas pesquisas, dificilmente alguém com habilidades mais baixas sai de seu país de origem porque deseja passar por aventuras ou mesmo ganhar um pouco mais.
A migração tende a romper conexões culturais e uma estrutura de suporte com a família estendida, o que tende a tornar a vida bem mais desafiadora no lugar de exílio. Ela ocorre, dizem os autores, citando o poeta inglês originário da Somália Warsan Shire, porque o país chamado de lar teria se tornado a boca do tubarão.
Nesse sentido, fiquei emocionada ao ouvir o secretário de Educação de Boa Vista, num webinário, na semana passada, sobre as respostas educacionais à pandemia, relatando os esforços da rede municipal de ensino para garantir aprendizagem emergencial remota aos alunos da cidade.
Questionado sobre os venezuelanos que ali vivem e, em grandes números, frequentam escolas, se eles também estariam sendo atendidos em casa, respondeu: “Naturalmente, afinal são nossos alunos”.
Há uma complexidade no atendimento, dada a questão da língua, mas a postura não excludente dos professores vem construindo soluções para que aqueles que tiveram que abandonar seus locais de origem não percam o direito de aprender, na escola ou em casa. Nem um a menos!
Fonte: “Folha de São Paulo”, 8/5/2020