Mudanças estruturais em uma sociedade contemplam diversos conflitos de interesse. Beneficiários do sistema vigente com frequência se articulam contra as propostas inovadoras que possam colocar em risco seus privilégios. Um exemplo claro disso, no caso brasileiro, se refere à reforma tributária nos moldes da PEC 474/01, que cria o Imposto Único sobre movimentação financeira e que está parada na Câmara dos Deputados, desde 2002.
Uma minoria que ganha com a burocracia dos tributos reage contra esse projeto simplificador capaz de combater a evasão de receita pública, de desmantelar esquemas de corrupção, de facilitar a vida do contribuinte em geral e de reduzir custos para os agentes públicos e privados.
Há anos, o complexo sistema tributário brasileiro é apontado como o principal inibidor de negócios no país. No relatório “Doing Business”, de 2017, o Brasil ficou na 123ª posição, entre 190 economias analisadas, em dez itens diferentes. Em relação ao pagamento de impostos, a colocação nacional despenca para a 181ª posição. A produção doméstica paga um alto preço, mas alguns ganham com essa situação vexatória.
O Imposto Único sobre movimentação financeira é um projeto estrutural que simplifica a burocrática legislação tributária do país. Ele acaba com as contribuições e impostos declaratórios e mantém apenas um tributo cobrado automaticamente sobre a movimentação nas contas bancárias. É um novo paradigma que encontra resistência de pelo menos três grupos de interesse: os burocratas públicos e privados, os envolvidos em esquemas de corrupção e os sonegadores.
A reação dos burocratas públicos ocorre em função do anseio de eles manterem o poder que emana de um ambiente tributário complexo, que se intensifica com as cerca de 30 novas normas editadas por dia no país. Apenas no âmbito da Secretaria da Receita Federal são quase 10 mil auditores fiscais e 7 mil analistas tributários atuando em meio ao emaranhado de leis. Esse ambiente também permite que a burocracia privada atue como autoridade capaz de decifrar a balbúrdia em relação aos tributos.
No tocante à corrupção, cabe lembrar o exemplo do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (CARF), alvo da Polícia Federal na operação denominada Zelotes. O esquema contava com membros do órgão que manipulavam a tramitação de processos de autuação fiscal envolvendo empresas em troca de suborno. De acordo com a PF, a União foi lesada em cerca de R$ 19 bilhões, próximo aos R$ 20 bilhões de desvios estimados na Operação Lava Jato.
Os que se beneficiam com a sonegação reagem contra o Imposto Único porque seria o fim da concorrência desleal que eles conseguem praticar. No sistema atual, uma empresa que não consegue fugir da legislação tributária dificilmente prospera frente ao seu concorrente que burla o fisco. De acordo com o Sindicato dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz), o total sonegado anualmente é da ordem de meio trilhão de reais, sendo o mais sonegado o ICMS (R$ 110 bilhões) e em seguida o INSS (R$ 103 bilhões).
O interesse de uma minoria claramente se sobrepõe aos anseios da grande maioria da sociedade brasileira na questão tributária. O país não pode continuar refém desses grupos. Enfraquecer uma reforma nos moldes do Imposto Único é tudo que eles querem.
Fonte: Jornal SP Norte, 21/07/2017.
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