A atuação dos monopólios tem provocado debates quando se discute o novo capitalismo. Há dois conceitos de monopólio: o regulado e o desregulado. O regulado é aquele em que existe o chamado monopólio natural, que ocorre em mercados caracterizados pela presença da indústria de rede, como ferrovias e distribuição de energia elétrica e gás natural. Neste caso, a existência de uma única empresa gera maior eficiência para a economia e protege melhor o consumidor. Nestes mercados, ao invés de preço, temos o conceito de tarifa fixada por agências reguladoras. As inovações tecnológicas cada vez mais tendem a questionar esses monopólios naturais.
O monopólio desregulado prejudica a produção, aumenta os preços e cria obstáculos à concorrência. Esses monopólios impedem a entrada de outras empresas por meio de barreiras como dumping, volume alto de capital, inovação tecnológica ou por legislações e decisões políticas que criam monopólios estatais. O Brasil durante anos foi o paraíso dos monopólios estatais.
Hoje começam a crescer os questionamentos aos benefícios trazidos para a economia pelo poder de monopólio das chamadas Big Techs: Apple, Amazon, Google, Facebook. O exemplo sempre lembrado é o caso da Standard Oil, que foi obrigada pelas autoridades antitruste americanas a se dividir em várias empresas em 1911. O caso da Standard Oil tornou-se referência na história econômica e a sua divisão acabou criando as principais e mais lucrativas empresas do mundo nos 30 Anos Gloriosos (1945-1975).
Numa recente live da Verde Asset Management, Scott Galloway, autor de diversos livros e professor da Escola de Negócios Stern em Nova York, afirma que as Big Techs são monopólios desregulados que usam a inovação como barreira à entrada. Por isso seria urgente discutir a regulação dessas empresas. Isso poderia ocorrer, primeiro, em economias como a brasileira, onde o benefício de ter uma Amazon ou Facebook é muito menor do que nos EUA. O argumento principal seria a pouca geração de empregos em países como o Brasil e o fato de esses monopólios dificultarem as inovações locais.
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E quando essa tempestade passar?
O monopólio desregulado das Big Techs vai continuar existindo no novo capitalismo do mundo pós-pandemia? Durante as prévias dos candidatos à presidência dos EUA, a pré-candidata democrata Elizabeth Warren chegou a anunciar um grande plano de desmembrar as gigantes da tecnologia, afirmando que essas empresas prejudicam a competitividade e impedem o avanço da inovação.
Essa discussão sobre monopólios e a inovação são temas tratados por Schumpeter nos anos 40 em seu livro Capitalismo, socialismo e democracia. Para Schumpeter, o coração do capitalismo era a inovação, e ela exigia um determinado grau de poder de monopólio. Segundo ele, se a concorrência fosse perfeita, os inovadores não conseguiriam se apropriar do retorno de suas inovações, e sem inovações não haveria crescimento econômico. Os monopólios seriam temporários, já que a inovação levaria a um monopolista ser substituído por outro. A questão é que os monopólios podem ser muito menos temporários do que pensava Schumpeter.
Se a solução for dividir as Big Techs, poderemos repetir o fenômeno da Standard Oil grandes recursos para criar barreiras socialmente improdutivas à entrada de outras, desestimulando novas inovações. As Big Techs seriam a encarnação desse fenômeno, criando mais formas de barreira à entrada e extraindo dividendos elevadíssimos usando seu poder de monopólio.
O fato é que, se a solução for dividir as Big Techs, poderemos repetir o fenômeno Standard Oil. Ou seja, as empresas divididas seriam ainda mais lucrativas que o monopólio. Por outro lado, o período com maior crescimento econômico foi pós-divisão da Standard Oil. A História pode se repetir? O fim do monopólio das Big Techs seria o início do novo capitalismo pós-pandemia? E as inovações que virão com a destruição criativa, criarão mais monopólios? Perguntas fáceis de fazer e difíceis de responder. Schumpeter responderia por meio da teoria dos ciclos econômicos. Mas a grande novidade, sem dúvida, serão as inovações sociais, que passarão a ser tão importantes quanto as tecnológicas.
Fonte: “O Estado de São Paulo”, 27/6/2020