E se o nariz de Cleópatra fosse menor? E se você tivesse sido aprovado no exame da Escola Militar? E se Bentinho tivesse estudado em Harvard? E se os economistas realmente entendessem a crise? E se as leis fossem honradas? E se os holandeses tivessem colonizado o Brasil? E se a sua mulher tivesse tido um caso com aquele carinha de costeleta e bigodinho, metido a cantar boleros? E se o Diabo que você viu naquela madrugada, aos dez anos, aparecesse de novo? E se Papai Noel existisse? E se você fosse negro, gay e judeu? Ou uma loura gostosa? E se Maomé tivesse se convertido ao cristianismo?
E se o Positivismo de Augusto Comte não tivesse sido tão popular no Brasil? E se você tivesse ficado perdido para sempre naquele parque de diversões? E se o navio de Darwin tivesse naufragado a caminho das Ilhas Galápagos? E se o avião tivesse caído? E se você não fosse tão invejoso? E se não houvessem mulatos, morenos, pardos, cabo-verdes, mamelucos, cafuzos, curibocas, mestiços, morenos puxados, roxinhos, neguinhos, brancos-baianos e escurinhos no cenário das peles nacionais? E se Oliveira Vianna tivesse lido Émile Durkheim? E se não existissem titias e babás? E se não existisse o ´mais ou menos´? E se aquele índio tivesse deixado você no meio do mato? E se você não tivesse tido aquele professor? E se o barão de Drummond não tivesse inventado o jogo do bicho?
E se não existissem doenças incuráveis? E se Ary Barroso não tivesse feito Aquarela do Brasil? E se os jornalistas brasileiros não tivessem lido H.L. Mencken? E se não tivéssemos carnaval e procissões? E se não houvessem compadres e amigos do coração? E se Gilberto Freyre tivesse estudado na USP e o Florestan Fernandes fosse pernambucano?
E não existisse o Plano Real? E se você não tivesse escrito aquela carta e enviado ao ministério aquela lista? E se não existisse esmola? E se acabássemos com a arrogância? E se os adultos da sua casa não lhe tivessem enxotado quando falavam de sexo? E se a crise nos tornar ricos e os Estados Unidos pobres? E se as mulheres fossem feias? E se o Diabo fundasse uma igreja? E se em vez de cineastas tivéssemos diretores de cinema? E se os políticos eleitos cumprissem o que prometeram? E se o mar virasse sertão? E se você fosse a pessoa mais famosa do Brasil? E se não houvessem drogas? E se você ganhasse milhões na Mega Sena? E se você fosse o Brad Pitt? E se você fosse índio? E se Cristo voltasse glorioso, julgando os vivos e os mortos? E se os operários do mundo se unissem? E se todos acreditassem no Credo? E se você soubesse que iria morrer dentro de duas horas? E se Pedro Álvares Cabral tivesse descoberto a Argentina? E se você tivesse morado na Montanha Mágica?
E se seu pai voltasse do túmulo? E se os bichos falassem? E se houvesse pão para os pobres? E se a Revolução Russa tivesse ocorrido da Alemanha? E se a ópera não tivesse sido inventada? E se Machado de Assis fosse alto, branco e tivesse nascido num palacete? E se você não tivesse assistido ao filme Cantando na Chuva? E se D. João VI não tivesse vindo para o Brasil? E se falássemos holandês? E se você tivesse tido uma governanta francesa? E se você tivesse escrito Grande Sertão, Veredas? E se tivéssemos tomado o Pão de Açúcar com café com leite? E se Hitler tivesse sido um bom arquiteto? E se não existisse esquerda e direita? E se deixássemos de mentir? E se não tivéssemos futebol? E se o Lula não tivesse sido eleito? E se os espíritos se manifestassem em massa?
E se os intelectuais fossem a praia em vez de beber? E se não tivesse havido o golpe? E se você soubesse onde mora a felicidade? E se fôssemos todos bonitos, inteligentes e podres de rico? E se todos os bandidos fossem presos? E se o Papa doasse o Vaticano? E se em vez de três, você tivesse dez filhos? E se não falássemos a mesma língua? E se você fosse um deficiente físico? E se não tivéssemos praia e pastel? E se não tivéssemos tido escravidão? E se não existisse poesia? E se você pintasse como o Pancetti? E se você fosse mais comunista que o Prestes?
E se não tivesse existido hiperinflação? E se todos obedecessem aos sinais? E se ninguém falasse nome feio? Se não existisse guerra? Ou malandragem? E se o Olavo Bilac aparecesse no programa do Faustão? E se você tivesse descoberto a Pasárgada? E se não existisse violência? E se você fosse poliglota? E se o amor acabasse? E se não sonhássemos? E se ninguém morresse? E se você fosse burro? E se Freud não tivesse nascido? E se não tivéssemos dívidas? E se todos fôssemos lúcidos? E se não existisse o ´se´?
Respondendo a metade, você vira ´filosofo´. Deixando todas as questões sem réplica, você continua normal. Agora, se você jamais pensou em nenhuma delas, és – com diria Kipling – um idiota, meu filho.
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