Cada época tem o seu próprio desafio histórico a vencer. No horizonte dos fatos, não há dúvida ou entredúvida de que a democracia vive um momento difícil. As insuficiências da política são gritantes; as instituições parecem terem perdido o rumo, revelando-se absolutamente inaptas a bem equalizarem as frenéticas demandas de uma sociedade afobada e com aversão ao longo prazo. Somos reféns do imediatismo tantas vezes estúpido, raso e pueril. É como se o sexo prevalecesse ao amor…
Na impressionante falta de líderes referenciais, vemos um povo perdido e atordoado no redemoinho das incertezas. Queremos acreditar em alguém, mas olhamos para frente e não enxergamos nada. O passado se foi; o presente é fugidio; o futuro, a interrogação permanente. Nesta angústia profunda, o grito autoritário pode soar como um eco de liderança. E, assim, gradativamente, conquistas civilizatórias fundamentais começam a ser postas em xeque pela bestialidade dos homens de poder.
Objetivamente, as chamadas “fake news” não passam de um nome bonitinho para algo velho e puído. Desde que o mundo é mundo, a desinformação, a inveja, o ódio, a incompreensão, críticas e ofensas vicejam entre os homens. Para evitar a desordem e o caos, a civilização foi criando canais de cultura e responsabilidade, visando o aprimoramento crítico e intelectual da população.
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Nesse contexto de otimização da vida, foram criadas escolas, universidades, poderes de Estado, jornais, rádios, televisão, teatro, cinema, bibliotecas, enfim, todo o aparato institucional de desenvolvimento da liberdade e florescer democrático. Agora, com o advento das redes sociais, o fluxo informacional do processo coletivo foi jogado para uma nova instância de mediação, de natureza privada e, por assim ser, livre das amarras estatais, revelando o tom frenético, nervoso e praticamente incontrolável de vozes humanas tantas vezes esquecidas pelos donos do poder.
Com o surgir de novos players econômicos, os velhos barões reagem para proteger seus feudos. Acontece que esse jogo está jogado. O valor não mais está atrelado a bens materiais, mas a experiências vivencias que, por sua intangibilidade, exigem o reviver constante. Há, aqui, uma profunda revolução no conceito de “propriedade” que, no mundo digital, desmaterializa-se para exponenciar a roda da fortuna em cifras antes impensadas.
Emparedado por suas ineficiências crônicas, as velhas engrenagens do Estado também reagem com instinto de proteção. O problema é que, assim, se fecham mais em si mesmas, ao invés de se abrirem para as necessárias novidades estruturais. Sim, não adianta querer negar a realidade. O fato é que existe um novo jogo de poder, muito mais ágil e dinâmico do que o arquétipo passado. Sem cortinas, e diante das circunstâncias postas, as instituições têm duas opções: adaptar-se ou morrer.
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Não se trata de uma via trágica, mas da mera lei da vida.
Em tempo, como arranjos ficcionais que são, as instituições representam as tecnologias de legalidade. Ou seja, nosso sistema legislativo está superado e precisa, urgentemente, repaginar a institucionalidade estatal, através de arranjos mais simples, práticos e eficientes. Em outras palavras, o sucesso da experiência democrática está a depender do Parlamento, que tem o incontornável dever de renovar as leis brasileiras, possibilitando o surgir de estruturas governamentais mais leves e responsivas às plurais exigências da sociedade contemporânea.
Mas como fazer isso com um Congresso Nacional que só olha para o próprio umbigo, andando de costas para o povo brasileiro? Quem souber a resposta, favor se apresentar para o merecido reconhecimento público.
Voltando ao principal, a pueril tentativa de reprimir fake news com autoritarismo revela apenas mais um suspiro de dor em um corpo moribundo. O caminho do futuro definitivamente não é esse. Aliás, quando o conceito de autoridade se confunde com autoritarismo, o exercício abusivo do poder se torna evidente. E, na presente quadra democrática, nada mais provoca as ruas do que a extravagância dos poderosos.
Fonte: “Gazeta do Povo”