Alguns ‘Youtubers’ brasileiros de direita anunciaram, no último dia 13, o fim de suas transmissões (um deles pela oitava vez nos últimos dois anos), em protesto contra uma suposta censura da Google (dona do YouTube) contra seus vídeos. O protesto dos blogueiros tupiniquins acontece na esteira de uma polêmica semelhante, que acontece nos estados Unidos.
Dennis Prager, o direitista dono de uma plataforma digital chamada ‘Prager University’, recentemente defendeu a gestão governamental de mídias sociais em artigo no Wall Street Journal. Prager é um conservador, por isso pode parecer estranho vê-lo defendendo o controle do governo sobre empresas privadas. Mas ele faz parte de um novo conservadorismo, que rejeita a tradição de liberdade que orientava a velha direita.
Prager argumenta que as empresas de mídia eletrônica têm a obrigação legal de administrar e moderar suas plataformas sem viés político ou ideológico. O problema é que, pela lei e principalmente pela primeira emenda, que garante a liberdade de expressão e divulgação, as empresas de mídia não são obrigadas a não serem tendenciosas.
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Pelo contrário. A lei americana permite que as plataformas restrinjam conteúdo que seja “obsceno, lascivo, sujo, excessivamente violento, ofensivo ou censurável”. Em outras palavras, ao colocar a expressão “censurável” na lei, o legislador permitiu que o YouTube seja subjetivo e até parcial contra Prager, se assim desejar. Mas será que ele é parcial?
Em seu artigo, o próprio Prager informa que o YouTube, no momento, hospeda 320 vídeos da ‘Prager University’ (cujos vídeos costumam ser muito bons, diga-se de passagem), que recebem um bilhão de visualizações por ano. De fato, um novo vídeo da ‘Prager U’ aparece toda semana na plataforma do YouTube.
Mas ele reclama que 56 desses 320 vídeos estão na “lista restrita” do YouTube, o que significa que “qualquer lar, instituição ou indivíduo que use um filtro para bloquear a pornografia e a violência não pode acessar esses vídeos”. Em outras palavras, o YouTube dá “acesso restrito” em seu site a materiais que seus gerentes consideram “censurável”. Por outro lado, o próprio Prager observa que sites de esquerda também estão na lista restrita. Mas isso é diferente, diz ele, porque, afinal, seus vídeos são violentos ou obscenos, enquanto os dele não são.
Como lembrou John Samples em artigo para o Cato Institute, Prager não menciona que vídeos do (esquerdista?) ‘History Channel’ estão restritos a uma taxa duas vezes maior que a de seus filmes. Embora esses vídeos históricos possam ser educativos, o Google parece acreditar que 1,5% dos usuários do YouTube, que voluntariamente optam pelo modo restrito, desejam evitar discussões educacionais sobre atrocidades históricas. Em resumo, está longe de ser irracional permitir que os pais decidam como seus filhos são ensinados sobre os horrores da história e que confiem nas plataformas para decidir o que está permitido ou não. Um conservador razoável deveria até aplaudir esse apoio à família.
Como muito bem resumiu Don Boudreaux em comentário recente, “o Google, o YouTube e outras empresas de tecnologia são privadas. Como eles conduzem seus negócios comerciais – incluindo o grau em que são guiados nesses assuntos por quaisquer que sejam as ideologias de seus donos – é assunto deles; não é da sua conta, da minha, do Sr. Prager ou do estado.
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O Sr. Prager afirma ser um proponente dos princípios da liberdade de expressão. Essa afirmação, no entanto, soa vazia, vinda de alguém que agora pede ao governo dos EUA que supervisione, com o poder de anular, as decisões pacíficas de pessoas privadas sobre que tipos de fala e expressão ocorrem em suas propriedades.
Em outras palavras, Dennis Prager e os blogueiros brasileiros estão insatisfeitos com a operação do Google. Mas essa empresa não pertence a eles. O Google também não é “público”, no sentido de ser uma agência ou braço do estado; é, de fato, privado, embora preste serviços a um grande público consumidor. Portanto, o que Prager e outros estão arrogantemente exigindo é que os agentes do governo ordenem que os empresários usem sua propriedade privada não como esses cidadãos julgam melhor, mas como eles próprios julgam melhor. Não somente essa ação do governo violaria o direito de propriedade, mas seria um ataque direto e perigoso aos princípios de uma sociedade livre.