A crise pela qual passa a economia brasileira tem evidenciado uma conta que não fecha no mercado de trabalho. Com a inflação alta corroendo o poder de compra das famílias, mais pessoas passaram a buscar emprego para complementar o orçamento da casa. Boa parte delas, no entanto, encontra portas fechadas, porque, com a economia desaquecida, as empresas estão cortando investimento e produção.
O efeito dessa combinação fica claro no resultado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua de maio, divulgado nesta quinta-feira pelo IBGE. Pela primeira vez desde o início da série histórica do levantamento, em 2012, o número de pessoas com algum tipo de ocupação ficou estagnado, indicando que o país parou de gerar vagas. Já o contingente que procura e não consegue emprego disparou. Resultado: a taxa de desemprego subiu para 8,1%, um salto em relação aos 7% registrado em maio do ano passado e também a mais alta da série histórica.
Segundo a pesquisa, de abrangência nacional, a quantidade de brasileiros sem trabalho teve alta recorde. Cresceu 18,4% na comparação com o ano anterior e já chega a 8,2 milhões de pessoas. No mesmo período do ano passado, o grupo somava 6,9 milhões. Nessa pesquisa, o IBGE usa o conceito de trimestres móveis, ou seja, os dados de cada novo mês são combinados com os os números dos dois meses anteriores, para suavizar os resultados.
Já o total de ocupados teve uma ligeira alta, de 0,3% em relação ao mesmo período de 2014, alcançando 92,1 milhões de pessoas. Mas o próprio IBGE considera essa alta estatisticamente irrelevante. Até então, esse grupo ainda subindo frente ao ano anterior. Em abril, o aumento ainda foi significativo, segundo o instituto: 0,7%. É esse descolamento entre desocupados e ocupados que faz a taxa de desemprego subir.
Por trás desse movimento, está a alta maior da chamada força de trabalho, formada pelos que estão trabalhando e os que estão procurando emprego. O grupo cresceu 1,6% em maio, frente a 2014, e já soma 100,3 milhões de pessoas.
— O que contribui para o aumento do contingente de desempregados é o fluxo dos que estavam à margem do mercado de trabalho e passaram a procurar emprego — afirma Rodrigo Leandro, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
Queda na renda
A queda na renda, apontada pela maioria dos especialistas como principal motivador para que mais pessoas corram atrás de uma vaga, ainda não apareceu com tanta força nos números da Pnad Contínua. Em maio, o rendimento médio real (descontando o efeito da inflação) ficou em R$ 1.863, uma queda de 0,4% frente ao ano passado. A Pesquisa Mensal de Emprego, que considera só seis regiões metropolitanas do país, no entanto, já mostrou recuo de 5% do rendimento naquele mês, em relação a maio de 2014. Para especialistas, a discrepância está relacionada às diferenças de amostras das pesquisas.
Mas há outras razões, explica Gabriel Ulyssea, economista do Ipea e professor da PUC-Rio. Por um lado, trabalhadores menos qualificados e, portanto, com menor renda, têm sido maior alvo de demissões. Isso impulsionaria a renda média da população ocupada para cima, já que aqueles que ganham mais são mais numerosos entre os que mantiveram seus empregos. Muitas negociações salariais, porém, têm resultado em reajustes abaixo da inflação, o que neutralizaria essa tendência de alta na renda. No fim das contas, o rendimento se mantém constante.
Além da necessidade de recompor a renda familiar, um dos fatores que pode estar por trás do aumento da busca por vagas é a perda do emprego pelos chefes de família, seja ele mulher ou homem. Nesses casos, não apenas a pessoa que perdeu o emprego passa a procurar trabalho, como também filhos e cônjuge, com o objetivo de recuperar a renda da família.
— Quando o chefe de família perde o emprego, ele empurra outros membros da família para a busca por trabalho — diz Gabriel Ulyssea.
De acordo com os dados do IBGE, a redução do emprego atingiu tanto o mercado de trabalho formal como o informal. O número de vagas com carteira assinada caiu 1,9% ou em 708 mil na comparação com 2014, enquanto o de postos sem carteira encolheu 3%. Considerando os dois grupos, o corte no setor privado chega a 1,02 milhão de trabalhadores.
Enquanto isso, o número de pessoas que trabalham por conta própria cresceu 4,4% no mesmo período, como reflexo da falta de emprego tradicional. É um milhão de trabalhadores a mais. O problema, destaca o economista Antonio Carlos Porto Gonçalves, da FGV, é que boa parte desse grupo é formado por pessoas sem qualificação, que abrem pequenos e pouco lucrativos negócios, a maioria informais, e ficam à margem do sistema de seguridade social.
— É o cara que compra bombom para vender na esquina. Não tem vocação de empreendedor. O que ele está fazendo é se virar numa situação de alta de desemprego — afirma o especialista.
Cimar Azeredo, coordenador de trabalho e rendimento do IBGE, destaca ainda que essas pessoas estarão fora da rede de proteção do emprego formal:
— Perder a carteira de trabalho é perder a estabilidade.
A Pnad também mostra a construção civil, como segmento que mais fechou vagas no setor privado, reduzindo o contingente de trabalhadores em 8%. Na contramão, educação, administração e alojamento aumentaram o número de empregados.
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