O declínio dos investimentos relacionados aos combustíveis fósseis é evidente. Qual será sua velocidade de queda, ainda é incerto. A perseguição aos combustíveis fósseis ganhou intensidade com a pandemia. No início do mês de maio, a IEA (Agência Internacional de Energia) disse em seu relatório para pararem, em todo o mundo, o investimento em combustíveis fosseis.
Em 26 de maio, a intitulada “Black Wednesday” fez com que empresas como Shell, Exxon e Chevron sofressem significativa derrota a favor dos ambientalistas. Foram eleitos 2 ambientalistas para o Conselho da Exxon e um tribunal holandês em Haia, Holanda, decidiu que a Royal Dutch Shell deve reduzir suas emissões de carbono em 45% até 2030, em relação aos níveis de 2019.
O presidente norte-americano, Joe Biden, também propôs eliminar incentivos que beneficiam a indústria dos fósseis no valor de U$ 35 bilhões. Diante de todo esse cenário, o Brasil possui uma vantagem pouco explorada, os biocombustíveis. Ou seja, energia limpa disputando espaço com as sujas.
O Brasil é líder no cultivo de uma das plantas mais sustentáveis do mundo, a cana-de-açúcar. Tudo nela é utilizado, nada é perdido. Em um momento delicado de pós-pandemia o debate sobre a economia circular, como ferramenta para esse retorno, volta a ter protagonismo.
O modelo circular assume que os produtos e serviços têm origem em fatores da natureza, e que, no final de vida útil, retornam à natureza por meio de resíduos ou de outras formas com menor impacto ambiental. A cana-de-açúcar cultivada no Brasil, além de ser exemplo como economia circular, é importantíssima para a construção de uma matriz energética limpa.
O etanol produzido pela cana-de-açúcar pode ser usado como combustível em veículos como motocicletas, carros e até caminhões, sendo está uma alternativa mais barata, se comparado aos veículos elétricos, e de origem totalmente brasileira. De março de 2003 a abril de 2021, o Brasil evitou, com o uso de etanol, a emissão de 556 milhões/ toneladas de CO2 na atmosfera. Segundo a UNICA (União da Indústria de Cana-de-Açúcar), o volume equivale a som das emissões anuais da Argentina, da Venezuela, do Chile, da Colômbia e do Uruguai.
No Brasil temos uma madura indústria de combustíveis renováveis que vem e pode vir a contribuir cada vez mais na redução da emissão de gases do efeito estufa. Quando avaliado o ciclo de vida completo do combustível, o etanol reduz as emissões de CO2 em até 90% em relação a gasolina. Muito se fala em carro elétrico, mas o processo de fabricação das baterias ainda é muito complexo, além de depender da geração de energia, que não necessariamente é oriunda de fontes renováveis.
A EPA (Agência de Proteção Ambiental dos EUA) classificou o etanol de cana-de-açúcar como “biocombustível avançado”, com 61% de redução comprovada na emissão dos gases causadores do efeito estufa em relação à gasolina. Esse valor é 3 vezes superior ao obtido pelo etanol de milho, resultando em apenas 21% de redução.
A empresa norte-americana Poet adquiriu, recentemente, todos os negócios de etanol da Flint Hills Resources. O movimento representa a aposta da maior produtora de biocombustíveis dos Estados Unidos de que o etanol é uma das melhores soluções de curto prazo para as mudanças climáticas.
O governo da Índia antecipou para 2023 a data prevista para a elevação da mistura de etanol na gasolina para 20%. Deve-se destacar que o etanol combustível extraído da cana-de-açúcar lança menos CO2 à atmosfera em todo o seu ciclo. Durante a fotossíntese, as plantas absorvem o gás carbônico da atmosfera, acarretando que quase todo o gás seja absorvido pela própria cana.
No Brasil, o setor de etanol precisa cada vez mais se consolidar como o combustível que vai ser o nosso grande aliado para atingir as metas do Acordo de Paris. Avanços têm sido feitos, sendo o principal o RenovaBio, que dá previsibilidade e serve como exemplo para o mundo de um programa que, por meio da emissão de certificados, ajuda o produtor ao obrigar as distribuidoras a comprarem esses certificados que reduzem as emissões provocadas pelos combustíveis fosseis.
Mas ainda a muito o que fazer se queremos ser protagonistas por meio da produção e comercialização do etanol. Hoje o principal calcanhar de aquiles está na questão tributária. Pasmem, pelo menos 35 % do etanol comercializado no Brasil não paga todos os impostos, ou seja, é sonegado.
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E como combater esse problema? Pegando uma carona na atual discussão da reforma tributária, implantando uma sistemática simples e passível de fiscalização efetiva a nível federal e para todos os estados brasileiros. É hora de atacarmos esse problema.
Não da e nem é possível sermos protagonistas na produção de energia limpa e renovável a nível mundial com esse grau absurdo de sonegação. Mudanças na cobrança de impostos sempre incomoda determinados elos da cadeia do etanol, mas o que deveria incomodar mesmo é esse nível de sonegação e só iremos debelar esse câncer com o envolvimento e um certo sacrifício de todos.
Fonte: “Poder 360”, 15/06/2021
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