Em meio à frágil recuperaçào da economia arnericana, ao agravamento da crise europeia e à ameaça de desaceleração econômica da China, aumentam as incertezas quanto ao futuro desempenho da economia brasileira. É cada vez mais preocupante a perspectiva de que sejamos arrastados por esse vendaval causado, de um lado, pelo mergulho de 3,5 bilhões de eurasianos nos mercados globais de trabalho e, de outro, pelos excessos de financistas anglosaxões e de sociais-democratas europeus.
O macroambiente externo é, sem dúvida, um dos condicionantes de nosso desempenho. Mas a economia brasileira não é uma folha ao vento da globalização.
Temos um mercado interno de dimensões continentais, que sempre nos permitiu uma dinâmica própria de crescimento.
Tanto para o bem quanto para o mal. Estivemos perdidos no caos inflacionário dos anos 1980 e da primeira metade dos anos 1990, enquanto crescia a economia mundial e se expandiam aceleradamente os fluxos de comércio internacional.
Participamos do forte ritmo de crescimento global sincronizado no período 2003-2007.
Após o estouro das bolhas de crédito e dos imóveis, o mergulho das Bolsas e o colapso da produção em 2008-2009, o Brasil e outros gigantes emergentes ensaiaram na reflação de 2010-2011 um descolamento da crise que se aprofundava nos países avançados. Teríamos fôlego para sustentar esse descolamento ou seriamos brevemente tragados pelo buraco negro da grande crise contemporânea?
Uma coisa foi a reflação de demanda por políticas anticíclicas, ampliando o grau de utilização da capacidade instalada a curto prazo e empurrando a expansão do produto interno bruto no Brasil acima de 7% em 2010. Outro coisa inteiramente diferente é o desafio de manter uma dinâmica de crescimento sustentável em meio à crise mundial.
A primeira questão critica é nossa vulnerabilidade ao macroambiente externo. Diz respeito a nossa capacidade de absorver os impactos diretos de um choque causado pelo aprofundamento da crise global. Na dimensão financeira, em que medida a persisténcia da crise bancária europeia em torno da dívida soberana poderá atingir os canais de crédito para o Brasil, como ocorreu em 2008-2009? E, na dimensão comercial, a desaceleração da China derrubando os preços das commodities poderia causar um deficit nas contas externas, uma forte desvalorização cambial e um recrudescimento da inflaçao brasileira?
A segunda questão crítica para o crescimento sustentável, ainda mais importante do que as condições externas, é o macroambiente interno: a existência de um ambiente favorável aos negócios, de modo a facilitar os investimentos na ampliação da capacidade produtiva do país. Isso inclui a estabilidade dos preços, a simplicidade dos impostos, mercados de trabalhos flexíveis, investimentos em educação e regime previdenciário que garanta a acumulação de capital. A qualidade das políticas públicas em todas essas dimensões é fundamental para viabilizar uma elevada taxa de investimentos internos, bem como um alto grau de competitividade externa.
Apesar de nossos receios quanto à influência negativa do macroambiente externo, nossas mais importantes limitações são de caráter interno. Por que não são tão temíveis os fatores externos? A rápida desalavancagem de bancos americanos e europeus e a grande redução de dívida soberana ameaçãm de implosão as finanças ocidentais. Mas o Brasil já desalavancou seu sistema financeiro quando saiu do turbilhão inflacionário. E tivemos também de controlar os níveis de endividamento do setor público. Por isso têm resistido ao contágio aos canais de crédito internacional ao Brasil.
Mais ainda, ante o esfriamento das economias avançadas e o aumento no risco de sua dívidas soberanas, melhoraram as condições do financiamento de longo prazo para o país. Enquanto o governo da Ítalia para juros de mais de 7,5% ao ano em seis títulos de 30 anos. o Brasil paga pouco mais de 4,5% ao ano em sua dívida de longo prazo. Como alertava Antonio Conselheiro, o sertão vai virar mar, e o mar virar sertão.
E quanto aos receios de queda dos preços de commdities? A verdade é que o afundamento do preço do dólar, sintonia clássico da doença holandesa – quem achou petróleo entrou em crise pela queda do câmbio, tornou-se um fator de desindustrialização. Uma queda moderada dos preços de matérias primas e o consequente aumento da taxa de câmbio desagradaria a ondas de turistas brasileiros , esfriando nossas compras de imóveis em Miami. Mas devolveria alguma competitividade às industrias brasileiras de móveis, calçados,têxteis, manufaturas etc. E desobrigaria o Banco Central de cada vez mais desconfortável compra de dólares. Apesar da desaceleração econômica global, persistem pressões de alta nos preços de matérias-primas, graças às políticas de juros reais negativos nos Estados Unidos e na China.
Os grandes riscos, mas também as maiores oportunidades, estão no macroambiente interno. Com algumas poucas, mas profundas, reformas poderíamos nos transformar na nova fronteira do crescimento global. Em meio à guerra mundial por empregos, faltam ao Brasil as reformas de modernização: a correção da hipertrofia da União ( reforma do Estado), a descentralização de recursos e atribuições para Estados e municípios ( reforma fiscal), a simplificação de impostos e redução de alíquotas ( reforma tributária). a revisão de obsoleta legislação salarial ( reforma trabalhista com eliminação de encargos sobre custo do trabalho) e a universalisalização da poupança ( reforma previdenciária). Esse é o capital institucional necessário à dinâmica de crescimento interno que desejamos.
Temos recursos naturais abundantes, do minério ao pré-sal; muita terra e água sobrando, que nos dão comida barata e energia limpa; uma demografia extraordinariamente favorável para as próximas três décadas; e o mundo nos oferece dinheiro barato e novas tecnologias acessíveis enquanto parou para conserto. Falta-nos o essencial: investimentos maciços em educação, pois o capital humano é o principal fator de criação de riqueza para indivíduos, empresas e nações na sociedade do conhecimento. Estará nossa classe política à altura de tão grandes desafios?
Fonte: revista “Época”
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