Até pouco tempo atrás o futuro de Lucineia de Jesus de Souza parecia brilhante, dirigindo um pequeno café que atende trabalhadores de uma fábrica e outros clientes em São Bernardo do Campo, cidade industrial da região metropolitana de São Paulo.
Mas o pequeno negócio aberto há 10 anos, que floresceu com o rápido crescimento da economia do Brasil, agora vê menos clientes parando para um café ou lanche.
A renda de Lucineia caiu pela metade desde 2012, forçando a empresária de 43 anos a cortar gastos que anunciavam uma nova classe de consumidores emergentes no maior país da América Latina.
Com a economia em recessão e as incertezas sobre o trabalho de seu marido em uma fábrica de autopeças devido aos crescentes cortes de fabricantes de automóveis locais, as idas ao shopping para compra de roupas de marcas famosas estão suspensas assim como os planos de comprar eletrodomésticos.
“Foi um crescimento falso”, disse ela, resumindo as perspectivas de muitos que estão desiludidos por uma promessa perdida. “As pessoas aqui estão perdendo seus empregos, elas estão fartas.” Depois de um avanço das commodities que permitiu ao Brasil programas ambiciosos de redução da pobreza e culminou em um crescimento econômico de 7,5 por cento em 2010, o Brasil está em sua pior recessão em três décadas. Durante os anos de crescimento acelerado, dezenas de milhões de brasileiros escaparam da pobreza e tornaram-se conhecidos como “a nova classe média”.
Agora, eles estão lutando para segurar os ganhos duramente conquistados e estão repensando tudo, desde hábitos de consumo a lealdade política.
“Quão brilhante será o futuro?”, pergunta Carlos Melo, cientista político do Insper. “Todo mundo está esperando por algum tipo de mudança, mas ninguém sabe como ela se parece ou como ela vai acontecer”. Dez anos atrás, todo mundo parecia saber. Na época, o Partido dos Trabalhadores (PT) alavancou o aumento das exportações e das receitas fiscais, ampliou generosos programas sociais e abriu as torneiras do crédito, ajudando o lançamento de milhões no que parecia ser um futuro ascendente.
Comparado com momentos de crescimento anteriores, a expansão foi notável porque alcançou todo o país, que tem dimensões continentais, desde São Paulo e outras cidades principais a novas cidades emergentes na Amazônia e vilas historicamente pobres no Nordeste.
O Brasil tornou-se um modelo de desenvolvimento para o resto da América Latina e além. Mas hoje em dia os brasileiros estão questionando tudo. O desemprego está aumentando e a inflação chegou a uma taxa anual de 9,5 por cento, o que está corroendo o poder de compra.
Em São Bernardo do Campo, berço da indústria automotiva brasileira, as fábricas estão se reduzindo. Mais de 12.000 postos de trabalho, equivalente a quase 5 por cento da força de trabalho local, desapareceram entre janeiro e agosto, de acordo com dados do Ministério do Trabalho.
Combinado com um escândalo de corrupção maciça da Petrobras e outras estatais, a crise tem martelado a popularidade da presidente Dilma Rousseff. Seu um único dígito de índice de aprovação é o mais baixo de qualquer líder brasileiro em décadas.
Até mesmo o legado de Luiz Inácio Lula da Silva, mentor e antecessor de Dilma, está manchado. Como presidente durante o “boom”, Lula introduziu crédito fácil que muitos consumidores brasileiros utilizaram sem moderação até a economia entrar em colapso.
“Lula nos ensinou a gastar, mas onde isso nos levou?” pergunta a proprietária do café.
Fonte: Exame.
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