Fim de semana passada foi mais um de reuniões entre líderes políticos europeus, com outra resolução de apoio àGrécia, agora com a participação do FMI. Como os documentos anteriores, o que resumiu as decisões desse encontro é bastante vago. Assim, mantém-se o enigma: a Grécia insiste que aprecia o apoio, mas não necessita de recursos; os demais países europeus dizem que vão ajudá-la, mas não falam em quanto nem como.
A despeito da indefinição, a reunião animou os investidores, e a Grécia conseguiu esta semana captar 5 bilhões de euros, o suficiente para rolar as dívidas que vencem em abril. A despeito desse sucesso, há dois problemas com a forma com que se está lidando com as dificuldades do país.
Primeiro, subestima-se o impacto sobre a economia de uma redução de 4% do PIB no déficit público. Ainda que necessário, a curto prazo esse ajuste vai provocar uma contração do emprego, do consumo e do investimento. A saída natural seria ampliar as exportações e reduzir as importações, mas, com a economia mundial retraída e sem se poder desvalorizar o câmbio devido à inserção na Área do Euro, o espaço para crescer para fora é limitado. Isso significa que o ajuste fiscal grego,que deve ter outros capítulos, tende a gerar protestos e dilemas políticos não triviais.
É a percepção de que isso pode amolecer o ímpeto do governo grego além do receio de que outros países da Área do Euro em situação difícil também prefiram recorrer à ajuda externa a promover as duras transformações que a situação exige que tem levado a Alemanha a exigir um aparato institucional que garanta as promessas feitas agora e ao mesmo tempo sirva de modelo para futuros socorros. É nesse contexto que se deve entender a participação do FMI na operação. Caberá ao Fundo fiscalizar o cumprimento das condicionalidades fiscais que acompanharão um eventual socorro.
O outro problema é que a solução adotada refinanciar a dívida no mercado a taxas elevadas vai por si só dificultar o processo de ajuste fiscal. A Grécia tem uma dívida pública que supera os 120% do PIB. Se sobre ela incidem juros de 4% ao ano, isso equivale a uma despesa de 4,8% do PIB. Com juros de 6% ao ano, a conta sobe para 7,2% do PIB, 2,4% do PIB a mais, ou mais da metade do ajuste que está se propondo realizar este ano.
Vale dizer, será feito grande esforço pelo lado primário das contas públicas, a um custo elevado em termos de nível de atividade, que será em grande parte consumido por pagamentos mais elevados de juros.Considerando o nível original do deficit público (12,7% do PIB) e as taxas a que as novas dívidas vêm sendo contraídas, é difícil acreditarque se possa chegar a uma solução duradoura para a Grécia sem algum tipo de auxílio que passe pelo refinanciamento a taxas subsidiadas.
A experiência da Grécia traz lições importantes para o Brasil. É verdade que os dois países estão hoje em extremos opostos em termos depreparo para lidar com o mundo pós-crise. Há, porém, semelhanças entre o Brasil atual e a Grécia de duas décadas atrás, quando essa se preparava para participar da Área do Euro. Para poder dividir com as maiores economias europeias a mesma moeda, a Grécia teve de realizar uma série de ajustes, que, após a adoção da moeda comum, lhe renderam substantiva queda na taxa de juros, com o mercado passando a comprar títulos públicos gregos a taxas pouco superiores às pagas pela Alemanha. O que se vê hoje é que o país não soube aproveitar a oportunidade para construir as bases do crescimento futuro. Ao contrário, utilizou o financiamento barato para bancar um padrão devida superior ao que permitiam os fundamentos da sua economia e hoje sofre para pagar a dívida.
O Brasil também vem perdendo oportunidades importantes. Em especial, não aproveitou o bom momento econômico e político resultante da não ruptura na política econômica em 2003 e o forte crescimento da economia mundial em 2003-07, e a consequente alta das commodities, para ampliar a infraestrutura e promover as reformas de que precisa para acelerar o crescimento.
Ao contrário, há um aumento contínuo dos gastos e subsídios públicos, muito além dos de caráter social, que têm contrapartida modesta em termos das bases que sustentam o desenvolvimento do país. A experiência grega mostra que essa postura pode ser mantida por algum tempo, mas que um dia, sem motivo aparente, o mercado pode se desinteressar de investir no país com a mesma determinação com que hoje lhe tece louros.
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