Hoje, se paga no Brasil uma indenização por acidente de trânsito a cada um minuto e meio. É mais do que o dobro dos roubos de automóveis no Estado de São Paulo
Entre janeiro e abril deste ano, a Seguradora Líder do Consórcio do DPVAT pagou 116.085 indenizações decorrentes de acidentes de trânsito. Neste número estão incluídos todos os tipos de indenizações pagas pelo seguro obrigatório de veículos, a saber, morte, invalidez e assistência médico-hospitalar.
É um número apavorante, que fica pior quando se constata que é paga uma indenização a cada um minuto e meio. É mais do que o dobro dos roubos e furtos de automóveis no Estado de São Paulo, que, em seu pior momento, chegou a um sinistro a cada dois minutos e meio.
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Uma regulamentação importante
Infelizmente, este é o retrato do trânsito brasileiro. E há muito pouco que possa ser feito para mudá-lo no curto prazo. Basta prestar atenção no que acontece em volta, pelas ruas e estradas do país, para não se ter dúvida que o caos tomou conta das ruas brasileiras.
Tanto faz se tem ou não tem um Código de Trânsito. Tanto faz se ele regulamenta a forma de conduzir os diferentes tipos de veículos. Tanto faz qualquer tanto faz. O grau de boçalidade fica claro quando se assiste a uma cena inusitada como esta, na Praça Panamericana.
Um cidadão vinha com seu carro pela pista da esquerda quando deu seta e, sem olhar para o lado, virou para a direita, na tentativa de entrar na Avenida Pedroso de Moraes. Como vinha outro carro ao seu lado, a manobra resultou num acidente leve, cujo culpado, de acordo com as regras do Código de Trânsito, foi o motorista que tentou ingressar à direita para entrar na Avenida Pedroso de Moraes, cortando inopinadamente três outras faixas de rolamento na Praça Panamericana.
Culpa clara, até o motorista que causou o acidente agressivamente descer do seu automóvel, acompanhado por três outras pessoas, todos com grandes ferramentas nas mãos, querendo saber por que o outro motorista não tinha parado e como ele faria para receber a indenização pelos prejuízos do seu carro.
Esta é a realidade nacional. Grande parte dos motoristas não tem a menor noção das leis de trânsito. As razões para isso são as mais diversas, mas começam na facilidade com que alguém “compra” uma carteira de motorista, pagando propina para um agente público, que providencia o documento sem se importar se o cidadão está capacitado a dirigir um automóvel.
Não tem como acabar bem. E o resultado dramático são mais de 40 mil mortos por ano, a maior parte assassinada em acidentes de trânsito causados por gente sem condições mínimas de dirigir um veículo motorizado.
Mas não são apenas os motoristas que abusam do direito de ser irresponsável. Grande número de pedestres, depois que disseram que os carros devem parar para eles atravessarem as ruas, faz coisa que até Deus duvida, como atravessar a Avenida Euzébio Mattoso pulando a mureta que separa as pistas, bem debaixo da passarela construída exatamente para evitar essa situação. E quantos atravessam as ruas com o semáforo de pedestres fechado para eles, como se o fato de serem pedestres lhes desse o direito de fazer o que quiserem, na hora que quiserem, tanto faz qualquer outro tanto faz?
Para quem acha que acabou, os motoqueiros estão aí e não precisam grandes explicações. É ver como pilotam para não se ter dúvida do porquê de mais de 70% das indenizações pagas pelo DPVAT serem para vítimas de acidentes com motocicletas.
Ainda temos os ciclistas que, por sua postura invariavelmente ecológicanaturalista, deveriam dar o bom exemplo, mas nem sempre seguem essa trilha. É comum vê-los pedalando em locais absolutamente impróprios para bicicletas, como as Marginais, ou disputando lugar com os carros, como se eles não fossem feitos de carne e osso e os veículos, de metal.
Finalmente, para fechar o quadro, as autoridades fazem sua parte para aumentar o caos e o número de acidentes com rara competência. Além da corrupção, que permite a emissão de carteiras de motorista para quem não sabe dirigir, a falta de sinalização, a manutenção deficiente das ruas e estradas, a omissão dos agentes de trânsito e o descaso com o tema é suficiente para o quadro se agravar a cada ano.
Neste cenário, não tem como seguro custar barato.
Fonte: “Estadão”, 25/06/2018