Dentro em breve os estudos sobre a viabilidade econômica de um país talvez não repousem apenas na fórmula clássica: recursos materiais abundantes, recursos humanos qualificados, extensão territorial, etc. Poderão incluir – e há quem já diga, deverão incluir – uma medição da propensão do país a sofrer desastres naturais e da proporção que esses desastres podem assumir na economia estudada.
Mesmo antes do terremoto/maremoto que varreu o Japão, isso já vinha ocupando algum tempo de trabalho entre economistas e planejadores de instituições internacionais.
Atrai a atenção, portanto, no momento em que o mundo acompanha, bastante perplexo, a espantosa tragédia que envolve uma das suas mais desenvolvidas economias, o alerta surgido na publicação Economic Premise, dedicada a estudos sobre a redução da pobreza e à promoção de uma rede mundial de gestão econômica – vinculada ao Banco Mundial, embora “não necessariamente reflita” os pontos de vista do Bird, como ela mesma esclarece.
Na sua edição número 52 a publicação traz um artigo, assinado por Vinod Thomas, cujo título sugere: É tempo de o Fator Desastre Natural ser incluído nos Cenários Macroeconômicos. Thomas é diretor-geral do IEG-Independent Evaluation Group, do Banco Mundial, e sua premissa de trabalho é de que os cenários com que os economistas e gestores trabalham hoje “raramente levam em consideração os resultados da crescente incidência, danos, e custos” dos desastres naturais. Em consequência disso, os governos e as organizações internacionais de ajuda não estabelecem planos, em caráter sistemático, para prevenir, mitigar e reparar os efeitos das violências da natureza.
No entanto, pelos fatos apontados no artigo, mais do que se justifica a exortação nele contida. Recentemente, terremotos de séria magnitude abalaram não só o Japão, mas o Haiti e o Chile, e inundações catastróficas afetaram o Paquistão, a África Ocidental, o Sri Lanka, Brasil e Austrália, tudo num curto período de um ano e meio a dois anos.
A questão central é que, por razões não desvendadas cientificamente, parece estar havendo um incremento da incidência dessas calamidades: “Cerca de 2,6 bilhões de pessoas foram atingidas por catástrofes naturais nos últimos 10 anos, contra 1,6 bilhão na década precedente” – informa o articulista com base em estatísticas do Banco Mundial. Já de acordo com o Fundo Monetário Internacional, os custos dos danos causados por desastres naturais são hoje 15 vezes maiores do que nos anos 50. E, segundo estimativas recentes divulgadas na imprensa, as perdas provocadas pelo terremoto no Japão ascendem a mais de US$ 300 bilhões, algo entre 5% e 6% do PIB do país.
Mas há mais informações, em certa medida já consolidadas. A frequência de inundações e secas – desastres hidrometeorológicos – “aumentou dramaticamente nas últimas duas décadas”, diz Thomas, acrescentando que a média de 150 desastres por ano, da década de 80, subiu para 370, no final dos 2000. E a isso se podem acrescentar as recentes perdas de colheitas e gado na Rússia de 2010 para 2011.
A pergunta, diante dessas tragédias repetidas, que levam as ruas a pensarem se “o mundo está acabando”, é se isso tudo não seria já resultado da ação predatória do homem sobre a natureza. Não há resposta conclusiva, mas o fato de que a natureza foi até mais violenta nos períodos em que o homem ainda não tinha aparecido sugere que a condenação à nossa atividade não precisa ser radical. Afinal, só mesmo o homem tem meios de preservar a natureza e de restaurar o que ela destrói, ou só ele destrói e constrói coisas belas, segundo Caetano Veloso.
Mas não carece especular, diria o caipira. E, sim, pensar numa organização para prevenção dessas adversidades, para lidar com elas eficazmente e para reconstrução do que for destruído. É, pois, possível implementar políticas públicas voltadas especificamente para a finalidade de administrar catástrofes, planejar os meios de se advertir delas, proteger as populações, mitigar os danos e remediar os estragos e providenciar fundos financeiros para o trabalho de pós-desastre.
No Brasil, as comissões ou comitês de defesa civil, principalmente os que se têm mostrado mais eficazes nos piores desastres, podem ser fonte importante de informações sobre o que deve ser feito em situações emergenciais. Seria necessário montar um esquema de reunir as experiências desses grupos para delas tirar linhas de ações o mais padronizadas possível, assim como montar um inventário dos recursos mínimos que se devem ter à disposição nessas ocasiões.
Como diz o autor do artigo, é importante focar não apenas nos esforços de assistência no pós-desastre imediato, mas também em como tornar essas primeiras respostas mais efetivas no sentido de reduzir a vulnerabilidade a que ficam expostos os sobreviventes por longo tempo.
Tudo isso, ou seja, o conjunto de medidas preventivas, mitigadoras e restauradoras, tem de ser inserido como parte integrante de políticas nacionais antidesastre. O desastre natural não deve mais ser tratado como fato aleatório, e sim como ameaça constante. A cidade de São Paulo que o diga.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 28/03/2011
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